Rafael Righi é dentista especialista em prótese dentária

Desde o início deste ano, não há um dia no consultório em que eu não tenha de conversar com algum paciente sobre as "lentes de contato dentais" e seu uso pelas celebridades. O tema foi capa de uma importante revista de circulação nacional no início do ano e por isso repercutiu em sites sobre beleza, blogs odontológicos, redes sociais e programas de TV.

O nosso cartão de visitas é o sorriso, motivo pelo qual várias pessoas sonham com dentes bonitos e saudáveis. O imaginário da perfeição são dentes brancos e grandes. E para levar tal perfeição a seus pacientes, alguns dentistas valem-se de técnicas de facetas em porcelana e lentes de contato dentais. Estes procedimentos buscam a mudança da forma, tamanho e cor dos dentes. Para realizá-los, são necessários pequenos desgastes ou quase nenhuma intervenção na estrutura dental. São como se fossem pequenas peças de um quebra-cabeça que, quando montado, revela uma beleza quase natural. Quase.

Poucos pacientes sabem que a cor natural dos dentes não é branca. O que faz os dentes parecerem naturais é a diferença de cor, translucidez e as texturas não uniformes na sua superfície. Quando levamos em conta a posição dos dentes na arcada dentária, conseguimos perceber que até aqueles sorrisos ditos perfeitos possuem algum tipo de “defeitinho”: um dente um pouco girado, um pouco menor que outro, ou seja, apresenta alguma assimetria.

Em meus 15 anos de odontologia, tenho notado certa padronização do sorriso. Impulsionadas pelos tratamentos estéticos submetidos pelas celebridades, as pessoas vêm ao consultório a procura de procedimentos que as deixem com os dentes maiores e mais brancos, esquecendo que tal desejo pode ter como consequência a descaracterização das formas e cores os dentes originais.

Se o problema fosse apenas o aumento das pessoas que procuram por esse tipo de tratamento, era fácil de se contornar. O que causa preocupação maior é o comportamento de alguns dentistas que, na ânsia de faturar, esquecem regras básicas de anatomia e harmonia dental. Eles acabam modificando os dentes do paciente, deixando-os com sorrisos de aparência, no mínimo, duvidosa. Como não existe nada ruim que não possa piorar, esses dentistas ainda divulgam nas redes sociais seus casos de “sucesso”, na esperança de atrair mais pacientes.

Sou sempre a favor de tudo que estimula as pessoas a procurarem o tratamento odontológico. Um bom exame clínico e uma conversa sincera com o paciente acerca de suas características individuais e biológicas seriam suficientes para direcionar o paciente a um tratamento que melhorasse a aparência do sorriso sem trazer artificialidade no resultado final.

Casos recentes de celebridades, que tiveram fotos de seus sorrisos transformados exibidas na internet revelam o quanto pode ser desastrosa a busca por um sorriso irretocável. Alguns ficaram com os dentes tão brancos que evidenciaram o artificial. E em outros o que chama a atenção é o tamanho dos dentes que chegam a alterar até a pronúncia das palavras pelo formato aumentado dos incisivos centrais.

Sabemos como é importante ter uma boa saúde bucal e o sorriso bonito é a consequência direta disso. Os tratamentos estéticos odontológicos são ferramentas que devem ser usadas, mas o resultado deve estar em harmonia com as características faciais de cada pessoa. Os pacientes, como leigos, estão na posição de nos questionar sobre o que é bom ou ruim, certo ou errado. Nós, como profissionais, temos de ser éticos e utilizarmos do bom senso no trato com os pacientes. Um tratamento mal conduzido impacta diretamente na autoestima das pessoas. Aos pacientes, saibam que um sorriso bonito vai muito além dos dentes de comercial de creme dental. Afinal, o sorriso ainda continua sendo a curva mais bonita do nosso corpo.