Transexuais são obrigados a viver escondidos na China

Estimativa é de que existam 4 milhões de transexuais no país

por AFP - Agence France-Presse 11/11/2015 16:19
https://www.thebeijinger.com / Reprodução Internet
Li Yinhe (foto), a sexóloga mais famosa do país, revelou em 2014 que seu companheiro, com quem vive há 17 anos, é transgênero (foto: https://www.thebeijinger.com / Reprodução Internet )
Apesar de vestir calças e no trabalho se apresentar como um homem, Pipi tem um "segredo": nasceu como homem na China mas decidiu fazer a cirurgia para ser mulher, em uma sociedade em que os transexuais são discriminados. Desde muito jovem, Pipi (nome alterado a seu pedido) se considerava uma menina, apesar de ter o corpo de menino. Esta identificação resultou em uma forte depressão após o nascimento de seu filho, que ainda o chama de "pai". "Queria morrer. Finalmente decidi que se tinha que morrer, preferia fazer isso em uma mesa de cirurgia" tentando mudar de sexo, contou.

Desde essa operação, ele esconde minuciosamente sua nova identidade sexual em público, continua vestindo roupas masculinas e usa rabo de cavalo. Pipi pede para não divulgarem informações muito precisas sobre seu local de trabalho. "Seria muito fácil me encontrar, perderia meu trabalho", diz com preocupação.

A ONG americana Asia Catalyst estima que há cerca de 4 milhões de pessoas transexuais ou transgênero na China, onde são vítimas de discriminações alimentadas pela ignorância. Mas as cirurgias de mudança de sexo são legais.

Na China, a pressão social contra os transexuais é intensa e há o risco de que sua família o repudie ou obrigue a se casar, apesar de tanto na literatura chinesa quanto nas óperas são muitos os personagens sexualmente ambíguos. "Me casei com minha mulher quando ainda tinha um corpo de homem. Pensava que podia viver com ela sem ter que mudar fisicamente", explica Pipi.

A pressão social para que se casar era tão grande que ela e sua esposa decidiram se unir "mesmo se nossas personalidades não eram compatíveis". "Minha esposa vem de um povoado. Se acostumou ao fato de que eu me identifique como mulher". Pipi não queria ter filhos, mas no final cedeu à vontade de seus pais e então o casal não se separou "para o bem" de seu filho. "A meu filho de nove anos digo 'Papai tem um pequeno segredo, de fato papai não é um homem!'", explica Pipi. "Ainda não é grande o bastante para que isso o magoe".

Pipi tenta ajudar outros chineses com as mesmas dificuldades. De sua casa em Jinzhou (nordeste da China), ela organiza um grupo na internet para colocar em contato pessoas transgênero com médicos, psiquiatras e advogados que possam ajudar em seus divórcios.

Tabu
A questão dos transexuais, durante muito tempo um tabu na China, ganhou as redes sociais no final de 2014 após um desabafo de Li Yinhe, a sexóloga mais famosa do país. Em uma longa mensagem em seu blog, Li revelou que seu companheiro, com quem vive há 17 anos e a quem considera seu "marido", é uma pessoa trangênero, que nasceu mulher mas se identifica como um homem. Para evitar mal entendidos, Li Yinhe insistiu que ela se sentia totalmente "heterossexual".

Uma revista de circulação nacional se interessou pelo casal e até o jornal Diário do Povo, órgão do Partido Comunista Chinês, falou sobre "respeitar as eleições de gente como Li Yinhe".

Apesar disso, muitas pessoas transgênero enfrentam médicos e psiquiatras que não sabem como tratá-los, diz Xin Ying, diretora do LGBT Center de Pequim.

Os que decidem mudar seu aspecto físico têm mais dificuldades para encontrar trabalho, receber cuidados médicos ou até entra em um trem, explica Xin Ying. Além disso, na China é quase impossível mudar oficialmente de sexo, porque não existe um procedimento legal.

Fang Yuran, que nasceu mulher mas se considera um homem, preferiu sair do armário para a família, mas como lésbica. "Se conto a verdade a meus pais eles pensarão que estou doente", diz.