Higiene íntima feminina: o que você precisa saber

Especialista alerta para riscos do uso recorrente de desodorantes íntimos e lubrificantes com odor e sabor. Produtos podem desencadear processos alérgicos graves

Valéria Mendes 01/04/2015 10:00
Arte: Soraia Piva
Cheiro e coloração da secreção diferentes, dor na relação sexual e prurido são sinais de processos infecciosos (foto: Arte: Soraia Piva)
A disseminação do uso de desodorantes íntimos tem levado muitas mulheres ao ginecologista com processos alérgicos graves. “A recomendação é não usar”, afirma a médica responsável pelo setor de Ginecologia Endócrina InfantoPuberal e Climatério do Hospital Municipal Maternidade Escola de Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo, Maria Elisa Noriler. A especialista reconhece, entretanto, que muitas mulheres fazem uso do produto para se sentirem mais seguras em uma relação sexual. “Se for esse o caso, o produto deve ser usado na parte externa (virilha) e nunca na mucosa (vulva)”, alerta.

Culturalmente, o cheiro da vagina não é associado a odores agradáveis e isso pode ajudar a entender a busca por soluções artificiais para camuflar o que é natural, o que explicaria também o aumento da procura por lubrificantes internos com odor e sabor e que também podem desencadear alergias. Maria Elisa Noriler lembra, entretanto, que o cheiro natural da mulher tem um papel importante na excitação do parceiro [em caso de relacionamento heterossexual]. “Cada pessoa tem seu cheiro que é responsável por ativar áreas do cérebro relacionadas à excitação e ao orgasmo. Na ânsia de testar as novidades, a extrapolação do uso desses produtos é tão grande que as mulheres sequer se perguntam se o companheiro prefere sentir o cheiro de um perfume no pescoço ou lá embaixo. É preciso cuidado ao mascarar o próprio cheiro que está diretamente relacionado com a sexualidade”, pondera.

A adesão ao desodorante íntimo ou ao lubrificante com odor é apenas um dos exemplos de como a higiene íntima ainda é motivo de dúvida para muitas mulheres: a começar pelo entendimento equivocado da palavra vagina, tantas vezes usada para se referir aos órgãos sexuais femininos como um todo, mas que, na verdade, é apenas um dos órgãos internos do aparelho genital da mulher que inclui também os ovários, as trompas de Falópio e o útero. Os órgãos externos do sistema genital da mulher são o monte de Vênus e a vulva (que engloba, além do clitóris, os grandes e pequenos lábios).

A dificuldade da mulher brasileira em se tocar também pode levar a uma higiene íntima inadequada e, consequentemente, a doenças infecciosas. “A anatomia feminina é mais propícia a contaminações. Por isso, desde pequenas, as mulheres devem ser orientadas a limpar de frente para trás, o que impede que bactérias do ânus passem para a vagina”, explica Maria Elisa Noriler.


Segundo a ginecologista, alguns sinais devem ser motivos de atenção para possíveis processos infecciosos da região pélvica: cheiro e coloração da secreção diferentes, dor na relação sexual e prurido. “Uma simples coceirinha pode ser sintoma de clamídia que, em casos mais graves, pode levar à infertilidade. A clamídia, que também é uma DST, é uma das principais causadoras de doenças inflamatórias pélvicas”, salienta.


Lembre-se que a secreção inodora, incolor (ou até mesmo branquinha) e sem coceira é fisiológica. “Nas mulheres mais jovens, essa secreção é mais abundante. As mulheres que usam DIU também têm uma lubrificação maior do que as optam pelos anticoncepcionais. Quanto mais próxima do climatério (menopausa) mais escassa é essa secreção”, observa.


A candidíase é a infecção mais comum entre as mulheres, mas Maria Elisa Noriler cita também a vaginose pela bactéria gardnerella. “Essa infecção se manifesta por secreção amarelada chegando até ao acinzentado e por odor fétido”, explica a ginecologista. Causada por um protozoário, a Trichomonas vaginalis se caracteriza por coceira intensa e também pode ser decorrente de uma higiene íntima inadequada.

Mas atenção: o exagero na limpeza também não é visto com bons olhos e lavar a região várias vezes ao dia não é recomendado inclusive no período menstrual. “A ducha vaginal não é recomendada porque pode alterar o ph da vagina que é levemente ácido justamente para evitar o crescimento de microorganismo. A secreção fisiológica tem que ficar na vagina para manter o equilíbrio da flora vaginal”, diz Maria Elisa Noriler.



Não importa o tipo de absorvente que a mulher use, seja ele externo ou interno, a recomendação é trocar de quatro em quatro horas. A especialista chama atenção para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e afirma que têm aumentado os casos de contaminação por HIV em pacientes jovens, na faixa etária entre 18 e 24 anos. O uso do preservativo é imprescindível. Sobre calcinhas, deixe para usar as de Lycra eventualmente e durma sem a peça para ventilar a vulva.

Reprodução Internet
Dê preferência para as calcinhas de algodão; as de Lycra devem ser usadas ocasionalmente (foto: Reprodução Internet)


HIGIENE ÍNTIMA: O QUE É MITO E O QUE É VERDADE

1- Usar lenço umedecido para se limpar é melhor do que papel higiênico.
Mito, desde que a região seja bem limpa com o papel higiênico. O uso contínuo dos lenços pode causar irritações ou reações de hipersensibilidade.

2- Se limpar de "frente para trás" é melhor para evitar infecção de urina.
Verdade, evita a passagem de fezes para a saída do canal da urina, o que pode desencadear infecções.

3- A limpeza no banho é suficiente lavando apenas a parte externa da vagina.
Verdade, não há necessidade de duchas vaginais, pois ela pode alterar a flora vaginal e também a própria vagina se encarrega de fazer a limpeza interna naturalmente.

4- Ter corrimento é normal.
Verdade, desde que seja incolor e sem cheiro. Caso contrário pode ser sinal de infecção.

5- Utilizar protetor de calcinha diariamente pode desencadear infecções.

Verdade, pois o abafamento propicia crescimento de fundos e bactérias anaeróbias.

6- O uso de sabonetes específicos regula o PH da região.
Mito, é indicado o uso de sabonetes íntimos apenas para as pacientes que têm alergias a outros sabonetes. Para o dia a dia apenas água e sabonete comum já é o suficiente.

7- É aconselhável a retirada de todos os pelos pubianos.
Mito, pois a função do pelo é proteger a região. Muitas pacientes desenvolvem processos pruriginosos com a retirada total dos pelos.

8- É recomendado lavar a região mais de uma vez ao dia quando está menstruada.
Mito, a maioria das mulheres tem o hábito de trocar o absorvente com certa frequência, logo não dá tempo para causar odores. É aconselhável ficar no máximo quatro horas com o absorvente, seja interno ou externo.

9- O uso de calças e/ou meia-calças muito apertadas comprime a região, abafando e favorecendo a proliferação de fungos e bactérias.
Verdade, dê preferência a roupas mais confortáveis e mais soltas. A região íntima precisa de ventilação.

10- É indicado o uso de calcinhas de renda ou lycra, pois facilitam a ventilação da região.
Mito, esse tipo de material abafa a região. O indicado é o uso de calcinhas de algodão para melhorar a ventilação e é aconselhável também dormir sem calcinha.

11- Lavar a calcinha durante o banho e deixar secando lá prolifera bactérias.

Verdade, o problema está em deixar a calcinha secando no banheiro, pois é um local úmido e não indicado para secar roupas devido à proliferação de fungos.

12- É preciso passar a calcinha.
Mito, se a calcinha estiver bem seca não tem crescimento de bactérias.

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Os vídeos ‘100 palavras para: VAGINA’ e ‘100 palavras para: PÊNIS’, que integram o ‘canal100palavras’ no Youtube, chama atenção para a forma que usamos para apelidar os órgãos sexuais feminino e masculino. Com cerca de dois minutos cada um, os audiovisuais produzidos dizem muito sobre os papéis da mulher e do homem na sociedade machista ao associar, em grande parte, a vagina a odores ruins e apelidos pejorativos e o pênis a palavras que remetem à força e poder. Vistos um seguida do outro ajudam a entender como a cultura interfere na experiência da sexualidade.

100 palavras para: VAGINA



100 palavras para: PÊNIS