Nascimento prematuro pode estar relacionada a doenças maternas; saiba as causas mais comuns

Prematuridade na gestação, com nascimento de bebês antes do tempo mínimo de 37 semanas, pode ter origem na hipertensão, infecção urinária e diabetes, ou ainda em patologias congênitas do feto

por Paula Takahashi 15/07/2014 14:30

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Jair Amaral / EM / DA Press
Mariana Rosa aconchega a filha, Alice, hoje com 10 meses: gratidão pela maternidade (foto: Jair Amaral / EM / DA Press)
“Na contramão do mundo, aprendi a contar o sucesso em pequenas medidas: centímetros, gramas, mililitros.” O relato comovente da jornalista Mariana Rosa, de 37 anos, mãe da pequena Alice, hoje com 10 meses, descreve as conquistas diárias de um bebê que nasceu com 29 semanas – o equivalente a sete meses de gestação – 31 centímetros e 900 gramas. Assim como Alice, milhares de crianças vêm ao mundo antes de completar o período gestacional mínimo de 37 semanas e hoje já representam 11,3% de todos os partos realizados no Brasil, índice 60% maior que o registrado na Inglaterra e no País de Gales, por exemplo. Segundo dados mais recentes do Ministério da Saúde, em 2012, 245 mil crianças nasceram antes do esperado no país, número que já foi de 109 mil, em 2000.

As causas do parto pré-termo ou prematuro estão relacionadas principalmente a doenças maternas como hipertensão, diabetes, infecção uterina e urinária, descolamento prematuro de placenta, entre outras. Mas também podem ser motivadas por patologias congênitas do bebê, como as respiratórias e cardíacas, e até por gestação múltipla, quando a mulher gera mais de um bebê. “Por isso, é de suma importância fazer um pré-natal adequado, com consultas de rotina, já que existem vários métodos para diagnosticar, tratar e prevenir complicações. Desde que o bebê não corra risco intrauterino, o que se faz é tentar postergar ao máximo o nascimento”, explica a coordenadora da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e Pediátrica (UTIP) do Hospital Mater Dei, Wania Calil Nicoliello. O Ministério da Saúde indica que sejam realizadas, no mínimo, sete consultas ao longo de toda a gestação.

Divulgação
O livro 'Quinhentos gramas de vida: A luta dos bebês prematuros pela sobrevivência', de autoria da jornalista Thais Lazerri, conta a história de nove bebês considerados prematuros extremos, nascidos com 20 semanas de gestação e peso de cerca de 500 gramas. (foto: Divulgação)
As cesarianas agendadas também estariam entre as causas da prematuridade. “Isso porque o ultrassom que indica a idade gestacional tem uma margem de erro de 15 dias, para mais ou para menos. Com isso, 38 semanas podem ser, na verdade, 36”, observa a pediatra Fabíola Coelho, do Hospital Sofia Felman. Levantamento inédito realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) indicou que 35% dos partos ocorrem com 37 a 38 semanas gestacionais. “Embora não sejam considerados prematuros, são bebês que poderiam ganhar mais peso e maturidade se tivessem a chance de chegar a 39 semanas. A epidemia de nascidos com 37 ou 38 semanas no Brasil é, em parte, explicada pelo número elevado de cesarianas agendadas antes do início do trabalho de parto, especialmente no setor privado”, alerta o estudo.

Ao nascer pré-termo, mesmo que próximo ao período mínimo de 37 semanas, o bebê pode apresentar desconforto respiratório e até intestinal, como intolerância a uma dieta, por exemplo. “Assim como o pulmão, que não tem surfactantes suficientes para funcionar adequadamente, o coração, o cérebro e o intestino também não estão preparados para funcionar antes da hora”, observa Fabíola. Por isso, há um empenho do Ministério da Saúde, em parceria com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), para valorização do parto normal e até proposta de revisão dos currículos acadêmicos e dos programas de residência junto ao Ministério da Educação.

EXTREMO
Bebês nascidos entre a 32ª e a 36ª semana de gestação se enquadram na prematuridade moderada. De 28 a 31 semanas é classificada como acentuada e abaixo de 28, extrema. “Os recém-nascidos extremos e com peso inferior a um quilo, considerado extremo baixo peso, são os que têm maiores chances de complicações”, reconhece Wania Calil. As patologias pulmonares são as primeiras a se manifestar nos recém-nascidos pré-termo. “Isso porque o desenvolvimento pulmonar não está completo entre 34 e 37 semanas de gestação, ocorrendo nessa época um aumento da produção de surfactante, que contribui para o amadurecimento pulmonar”, explica a médica.

Pelo fato de esses bebês ficarem muito tempo submetidos à ventilação mecânica e em uso prolongado de oxigênio, há risco de desenvolverem a retinopatia da prematuridade, o que pode levar a sequelas visuais de graus variáveis. “As situações mais temidas são as hemorragias intracranianas, que, de acordo com o grau de intensidade, podem levar a alterações neurológicas. Quanto mais prematuro o bebê, maior a fragilidade vascular cerebral, o que eleva as chances de hemorragia intraventricular e parenquimatosa” , acrescenta Wânia.

Muitas das complicações podem ser reversíveis, o que vai depender da gravidade com que acometem o bebê. Em casos extremos, o recém-nascido pode ficar até seis meses internado na UTI neonatal, período necessário para que o quadro se estabilize, a dependência de oxigênio seja superada, eles estejam em ganho progressivo de peso e aprendam a sugar.

Reabilitação conta com equipe multidisciplinar
Ser liberado para ir para casa parece selar o fim de um longo período de recuperação e luta pela vida. Mas especialistas e os próprios pais de prematuros reconhecem que se trata apenas do início de um processo incessante para garantir a qualidade de vida dessas crianças. Mãe de uma menina prematura de 29 semanas, a fisioterapeuta especializada em reabilitação de bebês nascidos pré-termo Roberta Sasdelli alerta sobre a importância do acompanhamento de uma equipe multidisciplinar nos primeiros meses de vida do bebê. “Esse grupo de profissionais deve contar com fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, neurologista, pediatra e oftalmologista”, orienta. Isso porque, nesses primeiros dias de vida, o recém-nascido não está livre de lesões, mesmo que leves, e até de apresentar futuramente distúrbios de aprendizado, na cognição e mesmo o autismo.

“Quanto mais cedo houver a intervenção melhor, já que o cérebro ainda tem uma plasticidade que permite que ele possa ser remodelado por meio de estímulos. Quanto menor essa criança, melhor será a resposta”, observa Roberta. Portanto, mesmo que não haja nenhum diagnóstico de lesão ao final do período de internação, é preciso seguir com uma rotina de consultas frequentes. Não são raros os prematuros que precisam de terapias complementares básicas com o apoio de um fisioterapeuta, para que possam se desenvolver mais rapidamente.

“Precisam desse apoio até para recuperação da função motora e aumento do tônus da musculatura, que fica muito comprometido durante a internação”, explica a pediatra Cláudia Fonseca Moura. O fonoaudiólogo atuaria no desenvolvimento da deglutição, já que esses pequenos precisam de estímulos mais especializados. “Muitos pais já saem da CTI com a orientação de buscar esse apoio multidisciplinar. Durante o primeiro ano de vida, é possível recuperar muita coisa”, garante Cláudia. Com um acompanhamento próximo e especializado, Roberta conta que a filha, hoje com 12 anos, não apresenta nenhuma sequela da prematuridade. “Quanto mais cedo a mãe intervir, maiores as chances de reabilitação, por conta dessa plasticidade cerebral e remodelamento que é possível fazer”, reforça Roberta.

Soraia Piva / EM / DA Press
(foto: Soraia Piva / EM / DA Press)
Mariana Rosa, 37 anos, jornalista, mãe de Alice, nascida com cerca de 7 meses

“Ela nasceu em 17 de agosto de 2013, dois dias antes do meu aniversário, com 900 gramas, 31 centímetros e 29 semanas. Foram 145 dias de internação na UTI Neonatal, mais de 60 dias entubada, entre idas e vindas, cinco infecções, sendo duas delas septicemias graves, sete transfusões de sangue, uma cirurgia de retina, uma hemorragia pulmonar, hemorragia cerebral e uma parada cardiorrespiratória que durou 26 minutos. A vida dela esteve por um fio. Um fio que procurei sustentar de toda maneira que me foi possível. Pelo som da minha voz, pelo toque das minhas mãos, que, por muito tempo, foram capazes de envolver quase completamente o seu corpo. Pelo olhar atento e aflito a toda a aparelhagem que a envolvia, numa vigília sem descanso. Na contramão do mundo, aprendi a contar o sucesso em pequenas medidas: centímetros, gramas, mililitros. No universo das miudezas, destacou-se a grandiosa vontade de viver da minha filha. Aprendemos que um bebê prematuro requer um amor maduro. Passada a luta pela sobrevivência, lutamos agora pela sua qualidade de vida, uma vez que ela desenvolveu uma paralisia cerebral que afeta sua visão e sua coordenação motora. Ela também tem síndrome de Westk, uma espécie de epilepsia da infância. Mas, com tão pouco tempo de vida, já mostrou que é capaz de muito. E também me fez capaz de muito mais como sua mãe. Por tudo isso, sou profundamente grata pela experiência da maternidade exatamente da maneira que se apresentou a mim: um testemunho da capacidade de transformação da vida pela força do amor.”