Bebê a caminho: novos testes pré-natal permitem avanço na detecção de síndromes

Exames não invasivos, feitos com amostra de sangue da mãe, revelam com total segurança possíveis doenças genéticas do feto. Resultado é conhecido em 24 horas

por Silas Scalione 22/06/2014 08:47

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Um dos maiores sonhos (e realizações) da mulher é gerar um filho. É normal, entretanto, que o período de gravidez seja cercado de temores quanto à possibilidade de doenças cromossômicas fetais, como a síndrome de Down. A preocupação cresce ainda mais no caso de mulheres em idade um pouco mais avançada ou com histórico do problema na família. Os diagnósticos pré-natal são essenciais para indicar alguma alteração e, caso haja, no mínimo eles oferecem aos pais condições de enfrentar melhor a situação e de buscar prevenção contra problemas médicos normais a uma criança que nasce com a anomalia.

 

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No início dos anos 1980, era possível fazer o exame cariótipo pré-natal por meio da retirada do líquido amniótico com 15 semanas de gravidez. Em 1986, o cariótipo pré-natal passou a ser feito em vilo corial, reduzindo o prazo para 10 semanas de gravidez. Ambos os procedimentos, apesar de seguros, eram invasivos à medida em que demandavam a introdução de uma agulha (na placenta, no primeiro caso, e nas vilosidades coriônicas, no segundo) para o recolhimento do material necessário ao exame. E os resultados demoravam em torno de duas semanas para ser conhecidos.

A grande novidade agora é que tais exames já podem ser feitos de forma não invasiva utilizando-se o sangue materno. “Há cerca de três anos, começamos a fazer o pré-natal em vilo corial, ainda de forma invasiva, mas já apresentando os resultados dos exames no mesmo dia. Desde o ano passado, porém, estamos oferecendo essa possibilidade de determinar aspectos da saúde genética fetal sem qualquer risco, de forma bem rápida, simplesmente usando algumas gotinhas de sangue da futura mãe”, revela o médico-geneticista Sérgio Danilo Pena, professor titular do Departamento de Bioquímica e Imunologia e diretor do Laboratório de Genômica Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que desde o começo dos anos 1980 realiza em Belo Horizonte trabalhos e pesquisas na área da genética humana.

Certeza
O teste, chamado NIPT Panorama (de non-invasive prenatal testing), analisa os cromossomos 13, 18, 21, X e Y e informa, com mais de 99% de segurança, se há qualquer alteração no número deles, o que poderia causar graves doenças. Mas como a ciência nos permite examinar a saúde genética fetal usando simplesmente um exame no sangue da mãe? De acordo com Pena, tudo começou com a descoberta de que, durante a gravidez, há DNA fetal circulando livre no plasma da gestante. Esse DNA representa uma proporção pequena de todo o DNA circulante, que é predominantemente materno.

É preciso, então, separar as características do DNA fetal, e isso começa com uma pequena coleta de sangue da mulher grávida, que precisa ter mais de nove semanas completas de gestação. “A amostra de sangue é levada ao laboratório, onde é centrifugada para separar o plasma das células brancas. No plasma, está o DNA do feto misturado com o DNA da mãe. Já nas células brancas, está apenas o DNA da mãe. Então, separadamente, extraímos o DNA de ambos, o plasma e as células brancas. Em seguida, fazemos o sequenciamento do DNA extraído da mãe e do feto de forma independente”, explica o geneticista, revelando, entretanto, que isso não é feito ao acaso: o sequenciamento de DNA é dirigido especificamente paras os cromossomos 13, 18, 21, X e Y, que são os que interessam analisar.

Isso porque, segundo ele, as anomalias de número desses cromossomos são as causas mais comuns de doenças cromossômicas vistas em recém-nascidos, como a síndrome de Down, que é devida a três cópias do cromossomo 21 (chamada de trissomia 21). “Adicionalmente, o sequenciamento é mais direcionado ainda de forma a estudar apenas regiões geneticamente variáveis, chamadas SNPs. Isso permite identificar diferenças genéticas entre o genoma da mãe e o genoma do feto”, informa.

Sérgio Pena acrescenta que, usando as informação dessas diferenças, aplica-se uma metodologia bioinformática sofisticada para distinguir os SNPs do DNA fetal dos SNPs do genoma materno, que foram sequenciados a partir das células brancas. “Usando agora um processo de subtração computadorizada, podemos deduzir as características do genoma fetal. Finalmente, por meio de análise estatística avançada, utilizamos o conhecimento do genoma fetal para chegar a uma conclusão com certeza superior a 99% sobre o número normal ou anormal de cromossomos 13, 18, 21, X e Y presentes no bebê”, afirma o médico, acrescentando que os resultados do NIPT Panorama em mais de 600 gravidezes mostraram sensibilidade e especificidade de 100% para as trissomias 13, 18 e 21, ou seja, não houve nenhum caso falso-positivo ou falso-negativo.

Ainda assim, por ser um novo procedimento, resultados alterados do teste NIPT Panorama devem ser sempre confirmados por exames convencionais, como amostra de vilos coriônicos e/ou amniocentese. “O exame não invasivo pré-natal de DNA fetal nos permite, ainda, fazer um teste de paternidade antes do nascimento da criança e com risco zero para a gravidez”, completa.

Nova evolução
O NIPT Panorama começou a ser feito há pouco mais de um ano nos Estados Unidos. Praticamente na mesma época, Sérgio Pena passou a realizá-lo, em parceria com o laboratório norte-americano Natera Inc. O material colhido aqui é analisado e enviado para os Estados Unidos e os resultados são remetidos de volta pelo Natera em menos de 24 horas. O exame apresenta informações precisas das principais doenças cromossômicas: síndrome de Down (trissomia do cromossomo 21), síndrome de Patau (trissomia do cromossomo 13), síndrome de Edwards (trissomia do cromossomo 18), síndrome de Klinefelter e monossomia do cromossomo X, além de revelar o sexo do feto.

A partir deste ano, porém, o teste ganhou novos ingredientes para se tornar ainda mais completo. Ganhou, inclusive, uma letra a mais na sua sigla, de NIPT para NIPTA (o A é de ampliado). “Passamos a detectar, além das anomalias já citadas, mais cinco síndromes de microdeleção, que são raras e muito graves. A continuar essa evolução, brevemente teremos condições de traçar todo o histórico genético de um feto, como já é possível fazer hoje com o ser humano”, acredita Sérgio Pena.