Registro de lesões ósseas em idosos subiu 30% em cinco anos

Incidência deve ficar seis vezes maior em duas décadas. Especialistas alertam que esse tipo de contusão abala a qualidade de vida e leva à morte

por Bruna Sensêve 16/05/2014 13:00

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Belém e Brasília — Em torno de 30% dos idosos devem cair pelo menos uma vez neste ano, sendo que 5% desses casos envolverão uma fratura de fragilidade. Esse tipo de contusão atinge principalmente a coluna vertebral, o quadril, os punhos e o fêmur. Eles são prejudicados por forças mecânicas que não causariam lesões tão graves se não houve uma baixa densidade mineral óssea. A situação mais delicada envolve o maior osso do corpo humano: calcula-se que um a cada quatro idosos que fraturam o fêmur morre em um ano em decorrência das complicações do acidente.

Os dados divulgados no Congresso Brasileiro de Geriatria e Gerontologia (CBGG-2014) no início deste mês somam-se aos números do Ministério da Saúde (MS) — que estima um aumento das fraturas por fragilidade de quase 30% nos últimos cinco anos — para imprimir uma realidade arriscada aos brasileiros com 60 anos ou mais. Em 2008 foram 67.664 fraturas por fragilidade registradas. Em 2013, o número subiu para 85.939, um aumento de 27%. O crescimento vai de encontro à estimativa do presidente da Fracture Fragility Network (FFN), David Marsh, presente no encontro de especialistas em Belém. Ele acredita que as fraturas por fragilidade deverão ter uma ocorrência seis vezes maior na América Latina, nos próximos 20 anos.

As barreiras para o atendimento de saúde imediato são os principais agravantes dessa condição. Os especialistas garantem que as chances de recuperação dependem de assistência cirúrgica nas 24 horas seguintes à fratura ou, em no máximo, 48 horas. Essa agilidade, porém, não é uma realidade no sistema de saúde brasileiro. “Um dos maiores preditores de uma fratura é ter uma fratura anterior. Então, se você não tratou do problema após ter a lesão, está perdendo uma grande oportunidade de evitar que ele se repita”, garante Marsh, ressaltado, em seguida, que o termo fratura por fragilidade surgiu para reforçar a necessidade de ligar o tratamento da osteoporose com o tratamento da fratura.

Antonio Cunha/CB/D.A Press
Eunice sofreu uma leve queda e fraturou o quadril: a cirurgia imediata ajudou no prcesso de recuperação (foto: Antonio Cunha/CB/D.A Press)
 Falhas na renovação
Os ossos são compostos por células chamadas osteoclastos, que reabsorvem as áreas envelhecidas do osso e as substituem por outro tipo de célula, os osteoblastos, produtores de uma nova matriz óssea. É esse processo que permite a reconstituição do osso quando acontecem as fraturas. O esqueleto humano chega a se renovar por completo em cerca de 10 anos devido a esse processo.

Como em outras partes do corpo, esse processo passa por um desequilíbrio, quando a absorção de células envelhecidas é maior que a formação de novas células. “No caso da fratura de fêmur, 50% dos indivíduos sobreviventes a ela jamais voltarão a caminhar normalmente”, ilustra o geriatra Salo Buksman, especializado em fratura por fragilidade e um dos palestrantes do CBGG 2014. Ele considera que o prejuízo da mobilidade é a consequência mais grave, pois expõe o idoso a outras condições de risco que podem levar à pneumonia, à trombose venosa, entre outras doenças.

Antes da osteoporose, os ossos iniciam um processo de porosidade e perda de resistência, caracterizando a osteopenia. Eunice de Almeida Miranda teve o diagnóstico do problema alguns anos antes de uma fratura por fragilidade no quadril, em julho de 2012. Uma leve queda foi o suficiente para a lesão. Na hora, não houve dor aguda, mas a senhora, hoje com 69 anos, passou por uma cirurgia para colocar uma prótese no local em menos de 24 horas.

Nos primeiros dias de recuperação, Eunice passou por momentos de profunda insegurança. “Hoje, não sinto mais, moro sozinha, faço caminhadas e danço. Por um tempo, manquei, mas tive uma boa recuperação”, comemora. Depois da queda, os cuidados aumentaram. Ela não tem tapetes soltos em casa, não utiliza escadas e deixa tudo sempre ao alcance das mãos. “Passei a ter mais cuidado mesmo, não deixei de fazer nada, a gente cai e depois fica com muito medo de voltar a cair. Durante a recuperação, fiz bastante fisioterapia para voltar a ter confiança em andar. Eu me cuidava muito menos antes da fratura”, reconhece.

Esse tipo de prevenção tem que fazer parte da rotina de um número cada vez maior de brasileiros. De acordo com o último Censo Demográfico, houve um grande aumento da população com 65 anos ou mais nas últimas décadas. Em 1991, eles representavam 4,8% da população, passando para 5,9% em 2000 e chegando a 7,4% em 2010. Os números refletem diretamente na expectativa de vida do brasileiro. No ranking divulgado ano passado pela Organização das Nações Unidas, o país ocupava o 91º lugar, após um aumento de 11,24 anos de 1980 (62,52 anos) a 2010 (73,76 anos).

Junto desses índices cresce o número de indivíduos diagnosticados com a osteoporose. A estimativa é de que 10 milhões de brasileiros tenham o problema, que pode se manifestar em ambos os sexos, mas atinge especialmente as mulheres depois da menopausa devido à queda na produção do estrógeno. De acordo com o MS, uma em cada três mulheres após os 50 anos apresenta sinais da osteoporose, sendo que, na população masculina, essa proporção é de um para cinco (veja Para saber mais).


Reincidênciae menopausa

Uma tese de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e da Mulher do Instituto Fernandes Figueira, ligado à Fiocruz, buscou determinar a prevalência e a incidência de fraturas por fragilidade em mulheres na pós-menopausa. O trabalho, publicado na Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, em março de 2010, investigou moradoras de Chapecó (SC) com mais de 60 anos e sem doenças que afetassem o metabolismo ósseo. Cerca de 200 voluntárias foram submetidas a exames de radiografia de coluna, responderam a questionários e compareceram a entrevistas semestrais. Os dados recolhidos por Patrícia Pereira de Oliveira revelaram uma prevalência de fraturas vertebrais de 48,9%, sendo 2,3 vezes maior entre as mulheres com mais de 80 anos e 1,4 vezes maior entre as sedentárias. Das 203 participantes que seguiram o acompanhamento de dois anos proposto, 7,4% se referiram a uma nova fratura não axial — fora do crânio, nos ossículos do ouvido, na garganta, na caixa torácica e na coluna vertebral — durante o período, sendo antebraço (46,1%) e fêmur (23,1%) os locais mais frequentes. Fraturas causadas por alto impacto foram excluídas do trabalho. A média da incidência geral de lesões foi 47,3 pessoas por ano, sendo 9,8/ano e 38,8/ano para fraturas não axiais e axiais, respectivamente.

* Colaborou Roberta Pinheiro
A repórter viajou a convite da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia