Psicanalista indica que é hora de resgatar o abraço por ser terapêutico, aliviar tensões e consolar

Empresa africana já produz jaqueta que transmite o sentimento de ser abraçado

09/03/2014 11:11

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Maria Tereza Correia/EM/D.A Press
Geraldo Caldeira: 'Abraçar é muito mais do que um beijinho no rosto' (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press )


O abraço oferece conforto e atua no equilíbrio físico de três sistemas interligados, alerta o médico e psicanalista Geraldo Caldeira. “O sistema nervoso central, que faz parte do límbico, o sistema imunitário (defesa do organismo) e o endócrino (produção de hormônios) são articulados o tempo inteiro. O bem-estar traduzido no abraço mobiliza esse triângulo. Abraçar faz bem e é muito mais que um beijinho no rosto, porque ele significa entrega. Entrega como ato de proteção. Não se abraça só o corpo, mas a pessoa. É um ato que ‘diz’: ‘eu estou unido a você’”.

Geraldo explica que pessoas saudáveis e carentes são as que mais gostam do abraço. E a maioria se sente protegida ao estar entrelaçada. “Como é entrega, quem é mais fechado tem dificuldade de dar e receber um abraço. Não consegue essa aproximação. Mesmo comportamento de quem tem o caráter reservado.” O psicanalista traduz o gesto como uma conexão. “É uma circunferência. De forma simbólica, é um elo. Um momento em que os corações estão mais próximos e se comunicam. Entrega até anatomicamente.”

Para Geraldo Caldeira, o abraço é “mais revelador e íntimo”. No entanto, muitos têm dificuldade de se entregar a esse carinho. “São pessoas que carregam o arco de proteção. Não passam desse limite (do abraço).” Há casos, inclusive, estudados dentro de patologias. Pessoas que demonstram, simplesmente, medo do abraço. “Estão no grupo dos esquizotímicos, que têm medo do contato (indivíduos introvertidos, reservados e que criam uma barreira de frieza). Há ainda aqueles que têm transtorno obsessivo compulsivo (TOC) ou mesmo que apresentam características obsessivas de repulsa ao toque.”

O psicanalista faz uma citação importante que ilustra bem o valor de um abraço. Ele conta que um cliente foi ser atendido por seu psicanalista em uma sessão de emergência. Ao prescrever a medicação, o médico colocou sua mão esquerda em seu ombro direito e, com a mão direita livre, escreveu a receita. Ao retornar ao consultório, o paciente revelou que aquele gesto foi como se tivesse recebido um abraço do terapeuta e que teria sido o mais importante daquele encontro. Um ato involuntário e inconsciente do psicanalista transmitiu ao paciente proteção, segurança, apoio, carinho e, naquele momento, por que não, uma cura. Ainda que momentânea. Ou não.

SEXO Uma orientação que Geraldo Caldeira sempre dá, a clientes ou aos seus alunos, é “ao sair para um encontro amoroso, programe sempre dar um abraço. É o abraço que vai dar a linha. Se rolar um clima e o abraço for bom, o encontro sexual também será. É no abraço que começa a entrega afetiva. Se não foi, eu iria embora”. Recomendação médica é para ser seguida. Não é verdade? O psicanalista ainda deixa uma outra pergunta para pensarmos. O carnaval acabou, mas a festa de Momo é sempre recheada de beijos (nos trios elétricos há até competição de quem beija mais numa só noite) e muito sexo. “Mas será que teve abraço? Precisamos resgatá-lo”, prescreve.




Terapia do abraço

A proposta do psiquiatra italiano Michele Zappella é um tratamento que se propõe reduzir o isolamento social, aumentar a comunicação e desenvolver laços de união. Zapella aplicou a terapia em 50 crianças autistas, com idades de 3 a 15 anos, envolvendo a família e tendo como base essa terapia. Ela registra que 12% se normalizaram depois de dois anos, 18% perderam o comportamento autístico, 44% apresentaram progressos moderados e 26% não demonstraram resultados.

 

Refúgio do ninho

“Abraço tem que ter pegada, jeito, curva. Aperto suave que pode virar colo. Alento tenso, que pode virar despedida. Abraço é confissão. Abraço não pode ser rápido, senão é empurrão. Requer cruzamento dos braços e uma demora do rosto no linho. Abraço é para atravessar o nosso corpo”, versos do escritor Fabrício Carpinejar escolhidos pela psicanalista e psicóloga Maria Goretti Ferreira para pensar sobre esse gesto. “O abraço é uma das mais calorosas demonstrações de afeto, constituindo-se mesmo como uma necessidade humana e presente nas diversas modalidades de relacionamento. Assim, temos o abraço entre pai/filho, entre amigos, irmãos e entre os enamorados. O abraço, em seus múltiplos significados, pode expressar amor, carinho, acolhimento, compaixão, saudade, congratulação e envolvimento.”

Maria Tereza Correia/EM/D.A Press - 23/9/13
A psicanalista e psicóloga Maria Goretti Ferreira diz que abraço é uma das mais calorosas demonstrações de afeto (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press - 23/9/13)


Goretti conta que abraçamos o outro para celebrar data expressiva ou um feito, da mesma forma que para consolar diante da dor de uma perda ou de um estado de sofrimento. “O abraço, em sua manifestação corporal, nos remete ao ‘refúgio no ninho’, onde nos sentimos agasalhados, protegidos, abrigados, resultando no seu efeito reparador, portanto terapêutico. Tal qual a criança ao machucar-se, que tem no beijo da mãe o alívio da sua dor, um recurso curativo. Quando enlaçados, aninhados nos braços um do outro, temos a celeste sensação de que não somos tão sós e nos tornamos mais corajosos para enfrentar as asperezas do mundo.” Por isso, o abraço é refúgio, morada, aconchego e entrega.

Intimidade

Goretti lembra que abraço não é tão corriqueiro e espontâneo quanto parece. “Basta olhar para nossos hábitos culturais, em que as pessoas se cumprimentam com até três beijinhos no rosto, muito mais frequente que o abraço genuíno. Por quê? Porque para abraçar é preciso dar conta e lidar muito bem com a intimidade. Usando uma expressão do sociólogo Nuccio Ordine, a intimidade seria ‘o líquido amniótico’ para que o abraço ocorra.” No entanto, Goretti diferencia os abraços. Ela enfatiza que o verdadeiro e íntimo “não é o abraço gaiato, meramente contato físico, mas aquele em que os corpos se tocam, celebrando o encontro de almas e corações. Nesse sentido, um abraço pode ser mais íntimo do que o sexo (como desempenho)”. A psicanalista ensina ainda que “abraço não é algo que se peça ou implore, já que tal qual o amor e a amizade, deve surgir naturalmente, movido pela empatia, pelas afinidades e/ou pela atração física”.

Para Goretti, tal qual a intimidade na qual se emerge, o abraço há que ser desejado, compartilhado e cultivado. “Caso contrário, poderá se converter em motivo de constrangimento, desconforto e mal-estar. Afinal, não temos o mesmo grau de intimidade com todas as pessoas que nos cercam.” A psicanalista ressalta ainda um outro tipo de abraço, o “abraço de tamanduá”, no qual “não se deve confiar por ser mensageiro de deslealdade e traição”. Mas em geral o abraço é bem-vindo e “portador de sustento emocional, desde que não tenhamos a ilusão de que, para além de seus atributos, será remédio para todas as nossas dores e inquietações”.

Abraço tecnológico
Reprodução Site T-Jacket/Divulgação
Jaqueta transmite o sentimento de ser abraçado (foto: Reprodução Site T-Jacket/Divulgação )


A T-Ware, empresa de Cingapura, desenvolveu a primeira jaqueta que transmite o sentimento de ser abraçado. A T-Jacket (foto) conta com um sistema que permite enviar um abraço controlado por um aplicativo por meio do smartphone ou tablet. A tecnologia foi desenvolvida com o intuito de enviar o estímulo de um abraço a crianças autistas quando o contato com os pais não é possível. Controla-se a intensidade e o tempo da compressão por meio do aplicativo, monitorado remotamente pelos pais, visando diminuir a ansiedade da criança. O abraço utiliza-se de diversos sentidos, demonstra vários sentimentos e pode passar segurança, principalmente para uma criança autista.