Pesquisadores identificam o que irrita a pele após exposição ao sol

Cientistas dos Estados Unidos descobriram uma molécula que causa ardência e coceira após exposição aos raios solares. Quando bloqueada, ela aumenta a resistência da pele à radiação UVB

por Correio Braziliense 18/09/2013 10:00

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Pele vermelha e irritada, uma coceira chata e dor constante. O cenário pós-praia pode ser bastante aflitivo. Cremes, compressas e loções até aliviam o desconforto, mas uma descoberta feita por pesquisadores dos Estados Unidos tem chance de acabar de vez com o problema. A chave para a noite tranquila depois de um dia de praia está em uma molécula presente justamente na epiderme.

Para entender os mecanismos que desencadeiam a dor depois da exposição excessiva ao sol, cientistas da Universidade de Duke, na Carolina do Norte; da Universidade da Califórnia, em São Francisco; e do Instituto Médico Howard Hughes, da Universidade Rockfeller, em Nova York, trabalharam em um experimento com ratos e células epiteliais humanas. Os resultados indicam que a inibição da molécula TRPV4 pode evitar a sensação dolorosa. Presente em grande quantidade na epiderme, a molécula, segundo os cientistas, funciona como um canal de íons, uma passagem na membrana das células que permite que os íons sejam carregados positivamente, como os de cálcio e sódio.

Valdo Virgo/CB/D.A Press
Clique na imagem para ampliá-la e saiba mais (foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)
“Ela funciona em resposta direta à radiação UVB, o que causa a entrada de cálcio nas células epiteliais”, explica Martin Steinhoff, coautor da pesquisa, publicada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (Pnas). Ao ser estimulada pela luz solar, a TRPV4 dá início a uma reação em cadeia, permitindo a entrada de íons de cálcio na célula. Isso faz com que aumente o nível de endotelina no organismo, um peptídeo conhecido por causar dor e coceira, sintomas comuns às queimaduras solares. “A endotelina sinaliza a percepção da dor e também provoca a sensação de coceira sentida por pessoas que pegaram muito sol”, explica Steinhof.

O estudo foi realizado a partir de testes com ratos comuns e geneticamente modificados. No segundo grupo, foram suprimidas as moléculas de TRPV4. No primeiro, conservaram-se as características originais. Todos os animais tiveram as patas traseiras — que têm a pele mais parecida com a humana — expostas aos raios UVB. “Nós observamos que os ratos mutantes eram muito menos sensíveis aos raios UVB, enquanto os normais ficaram empolados e vermelhos”, relata Wolfgang Liedtke, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Duke e integrante do estudo.

Por meio da análise do epitélio das cobaias geneticamente modificadas, os pesquisadores comprovaram que existe fluxo de cálcio para dentro da célula. “A análise molecular mostra que os raios UVB ativam a TRPV4 e aumentam a ação da endotelina, que, por sua vez, estimula a TRPV4 a enviar mais cálcio para a célula em um círculo vicioso”, explica.

Mais aplicações
Para saber se a descoberta feita com ratos poderia ser aplicada em seres humanos, os pesquisadores fizeram o mesmo teste de exposição aos raios UVB com amostras de pele humana. Os resultados obtidos foram iguais aos do primeiro experimento. “Nós descobrimos uma nova explicação para o fato de as queimaduras de sol causarem dor”, diz Liedtke.

A fim de testar se a dor poderia ser bloqueada, os pesquisadores desenvolveram um composto químico, o GSK205, capaz de inibir seletivamente a TRPV4. Os ratos tratados com o “creme” misturado a glicerol e álcool passaram a apresentar maior resistência a dores causadas por queimadura pós-sol.

“Nós precisamos ser cuidadosos para saber o que a inibição da TRPV4 pode causar a outros processos que acontecem na pele”, pondera Liedtke. “Feito isso, precisaremos adaptar o bloqueador de TRPV4 para o uso humano. Eu posso imaginar o composto sendo adicionado aos protetores tradicionais no futuro, o que ofereceria maior proteção”, acrescenta o pesquisador.
Roberto Rocha, médico especialista no tratamento da dor, considera o estudo promissor. “A pesquisa é muito nova e bem embasada. Não existem estudos tão bem documentados como esse”, avalia. De acordo com o especialista, o estudo norte-americano provou que a TRPV4 participa dos mecanismos que desencadeiam a dor, mas é preciso ter cautela ao inibir o canal de íons. “Em uma fase posterior, o canal também desempenha a função de proteger a pele por meio da pigmentação”, acrescenta o médico.

Apesar de a dor causada pela exposição ao sol ser temporária e, na maioria dos casos, inofensiva, entender como ela funciona também pode ajudar na solução de distúrbios similares. “Esse conhecimento vai nos ajudar a tratar dores nervosas ou inflamatórias a partir de um modelo baseado no desconforto causado pelas queimaduras do sol”, aposta Liedtke.
No texto divulgado na Pnas, o grupo de cientista cogita, inclusive, que a molécula pode se transformar em um novo alvo em busca da prevenção e do tratamento de câncer de pele e de fotoenvelhecimento. “Entendemos que mais estudos devem ser realizados antes que inibidores de TRPV4 possam se tornar parte do arsenal de defesa contra o sol, talvez em novos tipos de cremes para a pele ou para tratamento de danos crônicos”, ponderam os pesquisadores.

Reação imediata
As radiações ultravioletas A e B, UVA e UVB, respectivamente, são as relacionadas aos cuidados em torno da proteção solar. Os raios UVA são os de efeito cumulativo, que levam ao envelhecimento da pele, sinalizado pelo aparecimento de rugas e manchas, por exemplo. Já os raios UVB, muito mais fortes que os UVA, são os responsáveis pela sensação instantânea de queimação provocada pela exposição ao sol.