Qual a hora certa de sair da casa dos pais?

A decisão pode partir de várias situações: casamento, independência, trabalho. Especialista defende que é preciso maturidade tanto de pais quanto de filhos

por Gláucia Chaves 16/09/2013 09:34

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A decisão de não morar mais com os pais pode partir de várias situações. Há pessoas que saem para se casar, outras querem ter independência e há casos em que a saída é marcada por brigas. Tânia Zagury, filósofa e mestre em educação, defende que é preciso maturidade tanto de pais quanto de filhos. Se existem os “eternos adolescentes”, ou seja, adultos que se recusam a sair da casa da família, mas não assumem nenhum tipo de responsabilidade, existem pais que desencorajam a saída. Nesse caso, é a vez de o filho assumir as rédeas e acalmá-los. “Às vezes, os filhos estão tão acostumados a deixar os pais resolverem tudo que esquecem que eles também podem tomar a iniciativa de ajudá-los a superarem esse medo.”

No caso da escritora Bárbara Ribeiro, o que a motivou a morar fora foi uma bolsa de estudos no exterior. Quando voltou ao Brasil — e para a casa dos pais —, ela já sabia que era a hora de procurar um rumo. A partir daí, morou em todas as “configurações” possíveis: dividiu a casa com amigas, viveu sozinha e, agora, mora com o marido. Suas experiências a inspiraram a escrever o livro Saindo de casa — Independência ou morte! (Editora Lumi, 2010).

Zuleika de Souza/CB/D.A Press
Logo que se mudou para o seu apartamento, a arquiteta Monica Nassar, 24 anos, costumava ouvir da mãe: "Quando você vai cansar de brincar de casinha?" (foto: Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
O livro, que mistura ficção e histórias vividas por Bárbara e por amigos dela, foi escrito como forma de matar a saudade que a autora sentia da casa dos pais pouco depois de ir morar sozinha. “No meu caso, eu só queria experimentar para ver como era a vida de adulto.” Da primeira vez que saiu de casa, para fazer seu mestrado, Bárbara ganhava um salário para estudar. A segunda vez precisou de mais planejamento. Assim que decidiu, colocou todos os gastos em planilhas. Contas com o futuro aluguel, condomínio, água e luz foram os primeiros itens da lista.

Mesmo com tudo na ponta do lápis, ela dá a dica: é melhor deixar sempre uma folga no orçamento para emergências. “Sempre tem uma surpresa. É máquina de lavar que quebra, chuveiro que queima…”, reforça. Bárbara tinha 26 anos quando saiu do “ninho” familiar. Uma das grandes preocupações deles era de que ela não tivesse condições financeiras para comprar um imóvel se fosse morar sozinha. “Aqui no Brasil, há muito esta cultura de continuar na casa dos pais para juntar dinheiro”, explica. “O mais importante é avaliar o que importa para você: passar anos sem viver essas experiências ou pagar por elas em forma de aluguel.”

Aventureira, Bárbara não queria criar raízes em lugar nenhum: queria mesmo viajar. Aos 34 anos, ela diz que a veia exploradora está mais calma. “Viajei bastante, realizei esse sonho por 10 anos. Hoje, moro de aluguel não por filosofia, mas porque o mercado imobiliário está maluco”, brinca.

A arquiteta Monica Nassar, 24 anos, resolveu fazer as duas coisas: comprar um imóvel para sair da casa da mãe. “Queria andar com as minhas próprias pernas.” Aos 22 anos, ela comprou o apartamento. “Achei que era só um investimento, mas consegui comprar exatamente no lugar em que eu queria morar.” Primeiro, a mãe não deu muito crédito aos seus planos. “Passei dois meses reformando e avisei que ia me mudar no fim de semana seguinte.”

Divulgação
Bárbara Ribeiro escreveu um livro sobre a experiência de sair de casa e dá a dica: "Deixe sempre uma folga no orçamento para as surpresas" (foto: Divulgação)
A notícia, como de praxe, foi recebida com preocupações. “Ela ficou preocupada caso eu ficasse doente, por exemplo.” Depois da mudança, Monica visitava sempre a mãe — e sempre ouvia a mesma pergunta: “Quando você vai cansar de brincar de casinha?”. A carência foi amenizada com conversa, mas a adaptação demorou. “Minha maior dificuldade foi o tempo, porque eu trabalhava o dia inteiro e fazia pós-graduação à noite.” Era difícil encaixar as tarefas domésticas. Agora, Monica quer fazer mestrado em São Paulo. Voltou, então, para a casa da mãe e vai vender o imóvel. “Quando pedi para voltar, ela deu graças a Deus.”

Mudança participativa
Tudo bem que o desejo de ter mais liberdade é um dos grandes motes para colocar os planos de sair da casa dos pais em prática, mas, como disse Che Guevara, “há que endurecer-se, mas sem jamais perder a ternura”. Angélica Capelari, professora do curso de psicologia da Universidade Metodista de São Paulo, explica que não há motivos para fazer com que todo o processo seja um sofrimento para os pais. Uma boa maneira de introduzir o assunto, ela ensina, é ir “preparando o terreno” aos poucos. “É importante fazer com que os pais participem, não simplesmente comunicá-los disso.”

A ajuda de pessoas mais experientes como os pais pode ser bem-vinda nesse momento tão cheio de novidades, defende Capelari. “É interessante para o próprio jovem essa participação dos pais, até para situações em que os próprios filhos não podem estar presentes, como a pintura da casa, por exemplo. Isso os ajuda a se sentirem parte do processo.”

Porém, mesmo quando requisitam a ajuda dos mais velhos, alguns filhos enfrentam fortes doses de chantagem emocional. Essas “estratégias” para mudar a opinião dos filhos podem acontecer por diversos motivos, explica Fernanda Machado, presidente da Associação de Terapia Familiar de Goiás (Atfago), mestre em psicologia, terapeuta de casais e de famílias. Assim como o nascimento dos filhos, a saída deles de casa é mais um dos muitos processos naturais de uma família. “Ao longo de todo o ciclo vital da família, o sucesso na resolução de cada etapa vai influenciar a resolução das etapas seguintes”, analisa. “Portanto, a saída dos filhos é mais uma etapa importante e difícil na vida da família, e o preparo dos pais para essa transição vai depender de como foram realizadas as mudanças anteriores.”

Pais que abdicaram de projetos e interesses pessoais para se dedicar exclusivamente aos filhos, por exemplo, tendem a sofrer mais. Para superar esse sofrimento emocional (ou a tão famosa síndrome do ninho vazio), a receita é pegar o caminho contrário: buscar novos interesses e redefinir a relação conjugal. O problema é que, muitas vezes, essa resistência paterna pode ocasionar um sentimento de culpa nos filhos. “Os filhos devem entender que a vida recebida dos pais foi-lhes dada para ser vivida da melhor forma possível”, aconselha Fernanda Machado. “Se a independência resultar em felicidade, automaticamente será convertida em felicidade para os pais também.”