Estudo diz que uso de antidepressivos pode reduzir benefícios da psicoterapia

Segundo estudo americano, o tratamento combinado de antidepressivos e apoio psicológico para combater as fobias de ansiedade pode não surtir o resultado esperado devido aos efeitos antagônicos provocados pelas intervenções

por Isabela de Oliveira 08/08/2013 14:30

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Arte: CB/D.A.Press
(foto: Arte: CB/D.A.Press)
Nos períodos mais hostis da história, o medo ajudou o homem a sobreviver. O sentimento sempre teve função protetiva, mas, em algumas pessoas, ultrapassa os limites, transformando-se em fobia. Quem sofre desse distúrbio é, normalmente, submetido ao tratamento combinado de psicoterapia e medicação. No entanto, uma pesquisa publicada recentemente na revista Biological Psychiatry sugere que a junção das intervenções não é eficiente para tratar os transtornos de ansiedade, e que os antidepressivos podem reduzir os benefícios da psicoterapia.

A equipe da Universidade de Nova York liderada por Nesha Burghardt testou, em ratos, os efeitos do uso crônico e subcrônico dos inibidores seletivos de receptação da serotonina — medicamentos utilizados no tratamento de depressão e ansiedade. Eles concluíram que a ingestão contínua dessas substâncias poderia prejudicar o processo de extinção de fobias. “As cobaias perderam a resiliência, ou seja, continuaram respondendo de forma exagerada a um estímulo que já não era mais perigoso”, resume a farmacêutica Luciana Vismari, professora de farmacologia da Universidade Nove de Julho (SP).

O estudo tentou reproduzir, em um modelo animal, condições que podem gerar o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), situação de estresse extremo. Os ratos foram expostos a um som seguido por choques nas patas. A estratégia era perceber, no teste seguinte, como os animais se comportariam ao escutar o som que os remetia à lembrança do choque. Para isso, foram investigados dois processos, a resposta ao medo condicionado e o processo de extinção.

“O medo condicionado ou aprendido é observado quando um indivíduo passa por uma situação de estresse, como uma agressão. Cada vez que ele se defronta com o contexto desse fato, mesmo na ausência do perigo, sente medo. No entanto, a exposição continuada a esse evento, que já não deve oferecer perigo, deve fazê-lo responder ao contexto de forma diminuída. Esse processo é chamado de extinção”, esclarece Vismari. No estudo, ratos sob efeito de medicação crônica continuaram a reagir exageradamente ao som que não era seguido por choques. O mesmo não foi notado em animais que receberam doses subcrônicas de medicamento.

“A ingestão desses antidepressivos parece reduzir os benefícios da terapia de exposição, normalmente usada para tratar fobias. Outros estudos mostram que o tratamento combinado em pacientes com síndrome do pânico e fobia social obteve poucos resultados se comparado com os de pacientes que se trataram apenas com a psicoterapia. Além disso, o medo que desaparece durante o uso de antidepressivos pode ser recuperado quando o paciente não está sob efeito desse tratamento”, concluiu Burghardt, no estudo.

Medo bloqueado

Segundo Burghardt, os antidepressivos alteram o funcionamento de algumas áreas da amígdala, estrutura do cérebro responsável por lançar rapidamente o alerta de perigo. As substâncias adulteram neurotransmissores excitatórios, em especial o glutamato, e, assim, uma reação ansiolítica é disparada no organismo do paciente. O estudo verificou que, quando isso acontece, os níveis da proteína NR2B de um desses receptores, o NMDA, são reduzidos. Essa alteração no NMDA — dispositivo que desencadeia os processos de formação da memória e aprendizagem do medo — poderia, portanto, convergir com os efeitos da psicoterapia. “As mudanças geradas pelos remédios bloqueiam algumas reações do NMDA no processo de extinção”, explica a pesquisadora.

O psicanalista e psiquiatra Durval Mazzei Nogueira Filho, autor dos livros Psicanálise e medicina e Toxicomanias, surpreendeu-se com os resultados obtidos. “O que a gente vê na literatura psiquiátrica é a superioridade do tratamento combinado. Como acontece em qualquer estudo, esses resultados precisam ser verificados por outros pesquisadores. Apesar disso, digo que todos os medicamentos são úteis, mas não são um pedacinho do céu”, pondera.

Durval destaca que, embora a medicação seja mais um recurso clínico poderoso, nem sempre é eficiente e não deve ser prescrita para todos. No caso das indicações para tratar fobias diagnosticadas por médicos, o remédio é usado porque o transtorno pode culminar em um quadro psicótico. “A maioria das condições clínicas precisa ser observada com cautela. Existe o medo efetivo, que é normal, e aquele relatado por um paciente que diz, por exemplo, que não quer sair de casa porque está sendo perseguido por alienígenas”, diferencia.