Pessoas com a síndrome de Williams-Beuren destacam-se pelo comportamento amigável e carinhoso

O distúrbio genético, no entanto, compromete o desenvolvimento cognitivo e físico, e não é diagnosticado com facilidade pelos médicos

por Estado de Minas 12/06/2013 12:43

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Arte/EM
O comportamento social é descrito como hipersociabilidade e é uma preocupação para as famílias porque quem tem a síndrome tem dificuldade recorrente em diferenciar expressões faciais positivas e negativas (foto: Arte/EM)
Uma rara desordem genética, a síndrome de Williams-Beuren (SWB) não é frequentemente diagnosticada. Estima-se que no Brasil existam cerca de 25 mil pessoas com o distúrbio que não tem predomínio de etnia, gênero ou classe social. Contudo, a falta de conhecimento e o alto custo de exames específicos dificultam a identificação do problema. Descrita pela primeira vez na década de 1960 pelos médicos J. C. P. Williams e A. J. Beuren, a SWB é causada pela perda de material genético (microdelação) em uma região específica do cromossomo 7 durante o desenvolvimento das células do embrião. Além da face característica, a pessoa com a síndrome apresenta malformações múltiplas e alterações cognitivas e comportamentais.

De acordo com o doutor em psicologia médica e coordenador do Laboratório de Neuropsicologia do Desenvolvimento da Universidade Federal de Minas Gerais, Vitor Haase, os principais aspectos clínicos da síndrome são variáveis, podendo ser somáticos ou psicológicos. No primeiro caso, as características mais comuns são baixa estatura, discreto inchaço em volta das pálpebras, nariz com ponta arrebitada, bochechas salientes, boca larga, lábios grossos, sorrisos frequentes, dentes pequenos, voz rouca e outras malformações associadas em diversos órgãos internos que podem causar, entre outros, problemas cardíacos, renais, oftalmológicos e ortopédicos.

Do ponto de vista psicológico, a síndrome caracteriza-se por manifestações cognitivas e comportamentais. Embora bastante característico, o perfil cognitivo é variável. “A maioria dos casos diagnosticados apresenta deficiência intelectual. Os que não são identificados provavelmente são aqueles em que não existe deficiência mental, mas o desempenho cognitivo é discrepante, com algumas funções bem desenvolvidas e outras mais comprometidas”, afirma o especialista.

O comportamento social é descrito como hipersociabilidade. As pessoas com a síndrome de Williams-Beuren têm personalidade amigável, são afáveis, amistosas, sorridentes e tendem a focalizar as emoções positivas em detrimento das negativas. “Eles são fofos, carinhosos e se apegam com facilidade. Podem ser descritos como boas-praças. A convivência é muito agradável”, salienta o psicólogo. Mas a personalidade expansiva pode vir a ser uma preocupação a mais para a família, já que, muitas vezes, eles não conseguem perceber indícios de que alguém queira prejudicá-los. O problema se agrava com a dificuldade recorrente em diferenciar expressões faciais positivas e negativas.

Falantes
Embora sociáveis, as crianças com SWB tendem a ser solitárias e se relacionar mais com adultos, que apresentam maior condescendência em relação a elas. Por serem muito falantes e, frequentemente, se fixarem em assuntos específicos, essas crianças podem aborrecer os colegas de turma, o que as leva a serem discriminadas. O vocabulário é relativamente bom, em contrapartida, eles têm dificuldades de leitura e em compreender aspectos mais complexos de comunicação e de integração social, como o reconhecimento e a interpretação da linguagem figurativa. “Não compreendem ironia e metáforas e não têm facilidade de identificar emoções negativas e intenções hostis”, ressalta Vitor Haase.

Ainda de acordo com o psicólogo, do ponto de vista psiquiátrico, são frequentes os sintomas de hiperatividade e de ansiedade, e, muitas vezes, restrição do foco de interesse. Outra característica relevante está relacionada às limitações em matemática, mesmo para realizar operações simples, o que dificulta tarefas cotidianas como calcular troco em pequenas negociações comerciais. Também comum é o baixo desempenho em atividades relacionadas à cognição viso-espacial, como desenho e tarefas que exijam coordenação motora. Simultaneamente, as pessoas com SWB costumam ter inteligência verbal bem desenvolvida, o que lhes confere facilidade no aprendizado de idiomas, além de ótima memória e um talento musical impressionante devido a uma sensibilidade auditiva.

Embora não exista cura para a síndrome, são muitos os tratamentos que podem contribuir para o desenvolvimento da criança. A variedade e a complexidade das alterações médicas exigem que os cuidados sejam feitos por uma equipe multidisciplinar composta por especialistas familiarizados com a doença. Além dos médicos, em geral, é necessário o acompanhamento de psicólogos e terapeutas ocupacionais.

Malformação cardíaca sinaliza problema
Na maioria das vezes, a síndrome Williams-Beuren (SWB) acomete apenas os filhos. Em casos raros, o pai ou a mãe podem ter uma forma leve do distúrbio, que pode não ter sido diagnosticada antes, ou alterações cromossômicas específicas sem sintomas, que predispõem o aparecimento da doença na prole. O risco para os filhos de um indivíduo com SWB é de 50%. Em geral, o diagnóstico é formulado a partir do quadro clínico, sendo posteriormente confirmado por exames laboratoriais.

De acordo com a geneticista e professora universitária Maria Raquel Carvalho, antes de o bebê nascer, é possível suspeitar do problema, caso se verifique que há uma malformação cardíaca na ultrassonografia. “Entretanto, essa alteração também acontece isoladamente, o que permite que a síndrome passe por despercebida.” Se a criança não apresentar a malformação cardíaca e se as características físicas não forem identificadas, o diagnóstico poderá ser feito posteriormente, quando ficar evidente o atraso do desenvolvimento psicomotor ou a deficiência intelectual. “A verdade é que a maioria dos diagnósticos é feita tardiamente, porque a SWB ainda é pouco conhecida entre os profissionais da saúde”, diz Maria Raquel.

Ainda segundo a médica, o diagnóstico ainda não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), estamos realizando o exame como parte de um projeto de pesquisa em que estudamos as dificuldades de aprendizado dos pacientes com SWB”, ressalta. A soma alto custo dos exames, baixa taxa de incidência da doença e a falta de conhecimento e de informação é o principal dificultador do reconhecimento da síndrome.

Foi o que ocorreu com a funcionária pública Regina Manini, mãe de Polyana, que só soube do problema da filha quando ela completou 20 anos. “Fomos a vários médicos e era sempre o mesmo problema. Eles sabiam que algo estava errado, mas não conseguiam descobrir o que era”, conta Regina. Aos 26 anos, Polyana está alfabetizada e tem facilidade de comunicação e ótima memória, apesar das dificuldades com a matemática ainda serem perceptíveis. De acordo com Regina, o maior problema é a questão da inclusão. “Não há espaços na sociedade onde as pessoas com a síndrome possam se encaixar. Faltam atividade de lazer e oportunidades de emprego”, lamenta.

Principais complicações

» Alterações estruturais do coração e aumento da pressão arterial (hipertensão) às vezes já na infância

» Hipercalcemia (aumento de cálcio na sangue), mais frequentemente no primeiro ano de vida. O problema manifesta-se por irritabilidade, vômitos, constipação e tremores. O cálcio em excesso pode
levar à alteração no metabolismo da vitamina D e ao acúmulo
de cálcio no rim (nefrocalcinose)

» Meninos podem nascer com o orifício da uretra fora do lugar (hipospadia) ou os testículos não descidos para a bolsa escrotal (criptorquidia). Meninas podem ter acolamento dos lábios vaginais e puberdade precoce. Em ambos ao sexos, podem acontecer malformações congênitas dos rins e da bexiga, infecções, incontinência urinária (com dificuldade de deixar as fraldas) e enurese noturna (urinar na cama)

» Infecções de ouvido frequentes

» Alterações de comportamento, ansiedade, deficit de atenção e hiperatividade

» Atraso de desenvolvimento motor e de fala, dificuldade escolar, diminuição de visão espacial, que acarreta problemas para o aprendizado e coordenação

» Estrabismo e erros de refração (miopia e outros)

» Problemas de postura (cifose e lordose) e limitação da movimentação de algumas articulações do corpo

» Alterações nos intestinos e outros órgãos abdominais (diverticulite, diverticulose, pedras na vesícula, constipação crônica) e hérnias

» Problemas com anestesia