Fundação Clóvis Salgado dispensa Marcelo Ramos do posto de titular de sua orquestra

Substituto, cujo nome não foi anunciado, assumirá em outubro, em implementação de nova 'proposta artística'

por Eduardo Tristão Girão 31/07/2015 09:25

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LEANDRO COURI/EM/D.A.PRESS
O maestro Marcelo Ramos, que foi titular da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais entre 2002 e 2008 e desde 2013 até o último dia 10 (foto: LEANDRO COURI/EM/D.A.PRESS)
Até o próximo mês de outubro, cada apresentação da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais (OSMG) será com um maestro convidado diferente – a de amanhã é com Nelson Ayres. Não é uma aposta em pluralidade: Marcelo Ramos não é mais o regente do grupo. Depois de duas temporadas à frente da OSMG – de 2002 a 2008 e a partir de 2013 até o último dia 10 –, ele não teve seu contrato renovado pela Fundação Clóvis Salgado (FCS).

A Fundação afirma que a mudança se deve à nova proposta artística que está sendo formulada para a orquestra. “As pessoas não mudam de perfil. É uma questão de alinhamento, de arejamento. Quisemos trazer uma pessoa nova, com gás novo. Dar aos músicos uma outra personalidade à frente deles. Não é dizer que o Marcelo é ruim. Ele é um bom regente e tem várias qualidades, mas chegou o momento de mudar. Mudamos de prefeito, de governador, não é? É um novo ciclo que se abre”, afirma Cláudia Malta, diretora de Produção Artística da FCS.

Os músicos foram informados da saída de Ramos ao final do último ensaio para o concerto com o pianista André Mehmari, no Grande Teatro do Palácio das Artes, ocorrido no último dia 10, quando terminou o contrato de Ramos. Terminado o ensaio, o maestro recebeu flores da direção da FCS. O Estado de Minas apurou que o clima foi de surpresa entre os instrumentistas. De acordo com a Fundação, Ramos foi avisado de que seu desligamento ocorreria neste mês numa reunião ocorrida em março com Cláudia Malta e o presidente da FCS, Augusto Nunes-Filho.

A Fundação, no entanto, não revela o nome do próximo titular nem tampouco o novo direcionamento artístico que ocasionou a saída de Ramos. Nos bastidores da Sinfônica fala-se no nome de Silvio Viegas (que já foi diretor artístico da FCS) como o substituto. Sérgio Gomes, que atuava como regente assistente da orquestra, está interinamente no posto.

Cláudia Malta afirma que a nova proposta para a orquestra será divulgada na mesma ocasião em que o nome do próximo regente for anunciado, antes de outubro. “Um grande sonho é termos agenda, que a programação seja conhecida com bastante antecedência. Podemos aceitar convites e ter dinamismo, mas pretendo entregar aos músicos um calendário básico com as linhas de atuação”, afirma.

Segundo a diretora de Produção Artística, será aberto concurso público para preencher vagas na orquestra – atualmente, ela conta com aproximadamente 60 músicos, mas pode chegar a 80. O principal desfalque é no naipe de cordas, o que requer frequentes contratações avulsas de instrumentistas.

Marcelo Ramos não pretende deixar a batuta de lado. Aceitou convites para se apresentar na Argentina, em Campinas, Goiás e no Rio de Janeiro, num concerto no fim do ano, que é parte da série camerística da Orquestra Sinfônica Brasileira, na Sala Cecília Meireles. Além disso, está empenhado em realizar óperas em São João del-Rei, onde nasceu. Confira a seguir a entrevista que ele concedeu, por e-mail, ao Estado de Minas sobre sua saída da Sinfônica.

CONCERTO AMANHÃ
Sob a regência do maestro convidado Nelson Ayres e tendo a cantora Mônica Salmaso como convidada, a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais faz amanhã uma apresentação da série Sinfônica Pop. O concerto está marcado para as 20h30, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1.537), com ingressos a R$ 40 e R$ 20 (meia).

Quatro perguntas para...
Marcelo Ramos, maestro


Qual foi o motivo de sua saída da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais?

Quem escolhe a profissão de maestro no Brasil deve ter em mente que os principais cargos de regente são vinculados às administrações públicas – estados e municípios. Com as mudanças de governo nessas esferas, é natural que os maestros também mudem, assim como os secretários de estado e diretorias de estatais. Entretanto, essa prática pode não ser artisticamente saudável, pois muitas vezes uma orquestra está no ápice de sua produção artística e tem seu trabalho interrompido por conta de trocas políticas na regência. O motivo apresentado a mim foi esse – uma substituição para atender a uma nova proposta artística.

Como avalia sua contribuição à frente da orquestra? Qual foi a sua marca?


Em uma frase, minha marca foi a diversificação e a versatilidade nas diferentes séries. Em dois anos e meio, fizemos muito, artística e quantitativamente. Foram seis edições do Sinfônica Pop, que na minha gestão assumiu seu lado estritamente pop, deixando de misturar peças eruditas com populares. Fizemos três óperas, duas de Verdi (Un ballo in maschera e Rigoletto) e a Carmen, de Bizet. Fizemos seleções abertas e trouxemos sempre o que havia de melhor no mercado em termos de elenco vocal.

A performance da OSMG teve um salto inequívoco em qualidade. Em outra frente, organizamos os concertos educativos da orquestra, até então sem uma personalidade definida. Tivemos também uma parceria histórica com o Departamento de Cinema da FCS, que exibiu filmes com trilha sonora ao vivo executada pela orquestra. E priorizamos o repertório brasileiro que também utiliza o coral lírico: estreamos a Sinfonia Brasília, de Guerra-Peixe, em BH, abrimos a temporada 2015 com o Maracatu de Chico Rei, de Mignone, e Choros 10, de Villa-Lobos, além de outras obras com maestros convidados.

Nos últimos anos, o governo do estado priorizou a filarmônica, deixando a sinfônica em segundo plano. Qual é a sua opinião sobre essa decisão do governo?

Priorizar a filarmônica foi uma decisão do governo anterior, e eu a respeito. Eles trabalham muito e alcançaram uma qualidade que deve ser mantida. A construção da Sala Minas Gerais também foi um divisor de águas no cenário erudito brasileiro. O que não se aceita é ter a orquestra oficial do estado – a OSMG – em situação de falta de investimentos. Há muitos anos não se compram instrumentos, cordas, uniforme, partituras, sem falar em ter um salário na média nacional, website próprio, venda de assinaturas e turnês. Que fique claro que esta situação não é de responsabilidade deste governo. Este panorama ocorre há quase 20 anos. Contudo, no pouco tempo em que convivi com a atual gestão, percebi um empenho real em resolver os baixos salários e melhorar as condições gerais de trabalho.

Como avalia a situação atual da OSMG?

O principal problema são os baixos salários dos músicos que entram agora. Antes de realizar mais concursos é preciso ajustar o salário e elevar o crivo de exigência para entrar no grupo, já que se trata de um emprego estável. Para comparar, a orquestra de Brasília, também pública, paga salário inicial quase quatro vezes maior que o da OSMG. O salário baixo força os músicos a ter outros empregos e, como consequência, menos dedicação ao trabalho da orquestra.

Depois do salário, tem que haver investimento em estrutura – instrumentos, cordas, partituras, acessórios, uniforme, sapatos e, finalmente, o investimento em programação, que hoje se sustenta com leis de incentivo. É preciso sair desse ciclo vicioso. Há também coisas boas: a sala de ensaios da OSMG, por exemplo, é uma das melhores no país para este fim e atualmente está totalmente disponível para a orquestra.

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