Famoso disco gravado por Keith Jarrett em 1970 chega ao Brasil

Álbum foi lançado no ano passado na Europa e nos Estados Unidos. O pianista de 27 anos ousou apostar em experimentações que marcaram a história do jazz

por Kiko Ferreira 22/02/2015 00:13

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Daniela Yohannes/ECM / Divulgação
Ícone do jazz, o americano Keith Jarrett já demonstrava, no álbum Hamburg '72, a coragem de assumir riscos estéticos (foto: Daniela Yohannes/ECM / Divulgação)
Não é todo dia que surge um álbum clássico com quatro décadas de idade. Nada como a tecnologia para tornar tamanha façanha possível. O disco Keith Jarrett Charlie Haden Paul Motian/ Hamburg’72, lançado no ano passado na Europa e nos Estados Unidos e disponível a partir desta semana no mercado brasileiro, é um desses casos.

Gravado ao vivo num workshop para a rádio estatal alemã, em 14 de junho de 1972, na NDR Funkhouse, durante a primeira excursão europeia do trio de Keith Jarrett, o disco capta os três músicos em pleno exercício de sua liberdade. Com 27 anos completados em maio daquele ano, o pianista já havia recrutado o saxofonista Dewey Redman para formar seu famoso quarteto americano, mas provava, ao vivo, que os três funcionavam muito bem juntos.

Da balada em clima de valsa (Rainbow) ao free jazz selvagem e cru (Piece for Ornette), o CD de seis faixas antecipava um futuro sucesso (Life, dance, só lançada no álbum Byeblue, de 1976), dava roupa nova à recente Take me back (de Expectation, de 1972), redimensionava Everything that lives laments (do álbum Morning of a star, do ano anterior) e fechava a noite com Song for Che, de Haden, que havia provocado uma detenção pelo serviço secreto português, meses antes, quando foi tocada num festival de jazz em Cascais.

Temos aqui um encontro de jovens com alto nível técnico, exercendo um jazz feérico que destilava as influências de cada um. Haden, ex-baterista de Bill Evans, e Haden, ex-baixista da banda de Ornette Coleman, encontraram em Jarrett um chefe disposto a correr riscos em nome da liberdade – com direito a assumir o sax-soprano, a flauta e a percussão com desenvoltura. E reagiram à altura.

Messengers

Aos 20 anos, Keith já integrava o Jazz Messengers, do baterista Art Blakey. Em 1966, ele se juntou ao quarteto de Charles Lloyd, onde conheceu um grande companheiro: o baterista Jack DeJohnette. Com esse grupo, primeiro combo de jazz moderno a tocar na União Soviética em plena Guerra Fria, foi à Europa e ao Oriente.

Deixou essa banda para montar o próprio trio com Haden e Motian, no início dos anos 1970, e também tocou teclados na banda de Miles Davis.

Na CBS, gravou o álbum duplo Expectations, mas sua carreira fonográfica deslanchou para valer quando assinou contrato com o selo norueguês ECM, do produtor Manfred Eischer. O disco de piano solo Facing you, o primeiro na nova casa, deu origem à turnê europeia de onde saiu o álbum triplo que ganhou o disco do ano de 1974 conferido por publicações como Downbeat e The New York Times. Estava assim consolidada uma carreira de múltiplas faces, que incluía discos solo de piano e projetos especiais para a ECM, onde Keith sempre teve total liberdade de escolha e ação, e os selos de tradicionais de jazz, em que exercitava a vida em grupo.

TERCEIRA VIA

Keith Jarret chegou a ter um quarteto americano (com Haden, Motian e Redman) e outro europeu (com Jan Garbarek, Jon Christensen e Palle Danielson). Em 1980, o álbum Celestial hawk, com piano e orquestra, consagrou a terceira via de sua carreira: piano solo com grupos de jazz e artistas eruditos.

Influenciado por Art Tatum, Bill Evans, McCoy Tyner e outros mestres, Keith se tornou referência para jovens músicos com um estilo que mescla elementos de jazz, erudito, folk, rock, gospel  e funk, além de músicas indiana, africana e folclórica. Em 1983, ele formou com o baixista Gary Peacock e o baterista Jack DeJohnette seu mais longevo trio: o Standards, com carreira solidificada em recriações de clássicos do jazz. Dois anos depois, lançou a obra-prima The Köln concert, disco de piano-solo que muitos consideram o seu melhor trabalho.

Quem espera de Hamburg’72 a liberdade total das apresentações de piano solo, a contenção da música clássica e a elegância dos concertos e do Standards pode ter alguma decepção. O Jarrett de 1972 não havia atingido nem a maturidade nem o equilíbrio que vieram ao longo dos anos. Mas temos aqui um jovem com técnica e ousadia suficientes para deixar para a história um autêntico e definitivo disco de jazz. Com todas as nuances que esta palavra contém.

GAROTO PRODÍGIO


Nascido na Pensylvania em 8 maio de 1945, Keith Jarrett é o mais velho dos cinco filhos de uma família musical. Começou a estudar piano aos 3 anos e fez seu primeiro concerto solo aos 7 mesclando temas eruditos e músicas próprias. Estudou em Paris com Nadia Boulanger. Passou um ano na prestigiada Berklee College of Music, em Boston.

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