Nesta sexta-feira à noite, Emicida vai mostrar ao público de BH por que está entre os nomes mais importantes do rap nacional. O compositor e MC paulistano, de 29 anos, não é apenas (muito) bom de verso. Ele mergulha com gosto nas fontes da inesgotável musicalidade de nosso país. O samba de Wilson das Neves, o rock de Pitti, o suingue de Mart'Nália, o funk ostentação de MC Guime e a modernidade delicada de Tulipa Ruiz combinam com os versos ora contundentes, ora suaves, ora irônicos do rapaz. Não vieram à toa os prêmios que seu último disco, 'O glorioso retorno de quem nunca esteve aqui' (2013), conquistou.
O rapper conta que vai apresentar composições antigas, mas emblemáticas para sua carreira. É o caso de 'Rua Augusta' e 'Cacariacô', essa última uma espécie de canto de trabalho contemporâneo, gravado com Fabiana Cozza. 'Caxangá' (Milton Nascimento/ Fernando Brant) foi uma das fontes de inspiração para a canção, que descreve os perrengues do cidadão para chegar no serviço.
DARCY Falar em Clube da Esquina, tem mineiro ilustre no rap de Emicida. Lançada em 2013, 'Obrigado, Darcy' faz tocante e alegre homenagem ao montes-clarense Darcy Ribeiro, o antropólogo que dedicou sua vida à defesa da educação, aos índios e a compreender o Brasil. “Somos reis underground/ matéria-prima/ Macunaíma/ No peito da América Latina/ Hi-tech de terreiro/ O sonho de Darcy Ribeiro”, diz a letra.
A canção rememora o pensador apaixonado e alegre que soube valorizar a diversidade de seu povo. Apresentada nos EUA e em shows no exterior, Obrigado, Darcy chega ao Brasil em momento oportuno, quando se assiste à campanha antinordestinos deflagrada por insatisfeitos com o resultado da eleição presidencial. De acordo com Emicida, o rap é também oportunidade de atrair o interesse da garotada para as ideias e livros do pensador mineiro.
Nome de ponta na renovação do hip-hop, Emicida reverencia os pioneiros como Racionais MCs e Rappin Hood, “que trouxe os olhos da MPB para o rap”. O jovem paulistano explica que a marca de sua geração está em “abrir a comunicação com os meios de comunicação”. Se veteranos resistiram à mídia tradicional, acusada de tratar o hip-hop, o negro e o pobre com preconceito, o mundo mudou.
O rapper rompe paradigmas, ao conquistar o próprio território dentro da cultura de entretenimento, criar a própria produtora (Laboratório Fantasma) e aparacer na TV Globo. Aliás, ele cantou 'País do futebol', tema da novela Geração Brasil, com o MC Guime, astro do funk ostentação. Também gravou com a banda pop NX Zero.
Emicida desagradou a muitos manos, mas sabe derrubar fronteiras sem sacrificar o conteúdo de seus versos. Afinal de contas, abrir espaço é uma questão de sobrevivência para a cultura da periferia neste século 21, acredita ele.
Rei do improviso
Criado na periferia de São Paulo, Emicida aprendeu a improvisar ouvindo pastores evangélicos, escutou sertanejo das antigas, é fã de coco, repente, samba jazz, chorinho, Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga. Tudo isso está em sua música.
Emicida pode ser contundente ao falar da favela e das mazelas do Brasil, lírico ao se derreter pela filhota na delicada 'Sol de giz de cera' e até um pouco malandrão no divertido 'Trepadeira', ao lado do mestre Wilson das Neves. Esse samba-rap, aliás, já lhe rendeu muitas broncas das feministas.
De acordo com ele, o mercado pode até valorizar o dinheiro vindo de artistas do hip-hop, mas isso não significa o seu reconhecimento enquanto arte e cultura. “Não interessa para o mercado fortalecer o hip-hop de raiz”, constata. Mesmo assim, Emicida segue a rima. Afinal de contas, rap é compromisso, como bem cantou o saudoso Sabotage.
Rael na área
Emicida não chega sozinho a BH. O rapper Rael, de 32 anos, também vai cantar no Espaço Even. Autoestima, amor e as coisas da vida são temas de seus versos, além dos problemas sociais. “A gente fala de tudo, das quebradas às paradas mais íntimas", diz ele. Reggae, dub, afrobeat e samba temperam o hip-hop do paulistano.
Rael lançou os discos solo MP3 – 'Música popular do Terceiro Mundo' e 'Ainda bem que eu segui as batidas do meu coração'. Já fez vários shows no exterior e trabalhou com a dupla americana Beatnick e Salaam, que assina faixas de 50 Cent e Lauryn Hill.
Estreia nacional
Foi-se o tempo em que rap era território masculino. Nesta sexta-feira à noite, a norte-americana Akua Naru vai mostrar ao Brasil o que é que seu hip-hop tem. Radicada na Alemanha, ela já foi chamada de “guardiã do cool flow” por Tony Allen, o respeitado baterista de Fela Kuti.
BH vai marcar a estreia de Akua no Brasil. Em entrevista ao blog O esquema, a americana se diz ansiosa para conhecer o país. Fã do jazz de Miles Daves, John Coltrane e de Nicolas Payton, ela traz influências também de Bob Marley. Vale a pena procurar os vídeos da americana no YouTube. A mina é show.
EMICIDA, RAEL E AKUA NARU
Com Dope Crew, Coyote Beats e Xeréu. Hoje, às 22h. Espaço Even, Rua Vereador Antônio Zandona, 245/275, Jardinópolis. Ingressos: R$ 40 (2º lote). Pontos de venda: lojas Boundless, Reggae Nation e Central dos Eventos (Rua Fernandes Tourinho, 470, Loja 12, Savassi) e Direto ao Ponto (Avenida Olinto Meireles, 1.608, sala 106, Barreiro). Informações: (31) 8618-6414 e www.centraldoseventos.com.br.