Elisa Freixo tem sido responsável pela divulgação da música para órgão em MG

Com formação no Brasil e na Alemanha, instrumentista apresenta séries de concertos em Mariana e Tiradentes

por Ailton Magioli 18/10/2014 07:00

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Rafael Motta / Divulgação
O trabalho de Elisa como Arp Schnitger, da Catedral da Sé de Mariana, ganhou reconhecimento em todo o país (foto: Rafael Motta / Divulgação )
Depois de assistir recentemente a um concerto de Elisa Freixo no órgão Arp Schnitger, da Catedral da Sé de Mariana, um jornalista alemão escreveu nas redes sociais que o Brasil vive um boom de público do instrumento, diante da plateia jovem que acompanhava a organista, visivelmente interessada.

“Se houvesse interesse ainda maior, podíamos criar um circuito turístico-musical dos órgãos históricos de Minas Gerais. A começar de São João del-Rei, no Campo das Vertentes, passando por Tiradentes, na mesma região, Mariana, na Região Central, e encerrando em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha”, diz Elisa, já de olho no instrumento histórico (1820) de Barbacena, cujo projeto de restauro acaba se ser aprovado pela lei estadual de incentivo à cultura.

Por incrível que pareça, os concertos regulares do órgão da Sé de Mariana que ela e a discípula Josineia Godinho comandam, semanalmente, às sextas (11h30) e domingos (12h15), mantêm-se, há 28 anos, sem apoio ou patrocínio. “Já era para ter uma empresa interessada em associar o seu nome ao evento”, reivindica Elisa. “Até agora, conseguimos só apoios e patrocínios pontuais”, lamenta a organista.

Elisa, entretanto, comemora o fato de a Josineia Godinho já estar contratada como organista oficial da Sé de Mariana, onde além de atividades educativo-culturais (concertos regulares e de formação de plateia), desenvolve também ações litúrgicas, tocando e regendo coro durante as missas.

A música como missão A trajetória de Elisa, além da interpretação elogiada internacionalmente como organista, engloba ainda o acompanhamento técnico do restauro de órgãos – que coloca Minas Gerais como referência – e a divulgação da cultura musical barroca, na formação de público e de novos instrumentistas.

A complexidade e a diversidade sonora do instrumento fizeram com que, aos 15 anos, quando fez a passagem do piano para o órgão, Elisa Freixo tomasse consciência de sua importância para a trajetória artística e pessoal. Paranaense de Maringá, aos nove meses a futura organista se estabeleceria em São Paulo, onde, aos 5 anos, já cantava em coro de uma igreja presbiteriana.

“Era coisa boa e de qualidade. Cantávamos Mozart e Beethoven”, recorda da infância, na qual começou a estudar piano aos 7 anos e, aos 15, faria a transição para o órgão. “Foi uma coisa muito natural”, acredita Elisa, admitindo que já naquela época tinha consciência de que aquele seria seu instrumento, com o qual começou a tocar em igrejas. O vestibular de música seria na Faculdade Santa Marcelina, de São Paulo, onde graduou-se.

A segunda graduação, já em órgão, foi feita na Alemanha. “O instrumento me encantou pela riqueza de sonoridade e pelo desafio da sua complexidade”, avalia a organista. “Faço outras coisas na vida, mas nunca deixei o órgão”, acrescenta Elisa Freixo, cuja primeira visita a Mariana ocorreu em 1964. “Para meu pai, tínhamos de conhecer a verdadeira história do Brasil”, lembra do objetivo da viagem em família, quando tinha apenas 10 anos.

Daquele período, Elisa diz guardar a lembrança de uma Ouro Preto “cinza e escorada”, quando a cidade, hoje patrimônio cultural da humanidade, sequer havia sido restaurada. Uma década depois, Elisa Freixo voltaria ao estado com a família, para conhecer o órgão da Sé de Mariana. Já na Alemanha, ela ficou sabendo, em setembro de 1977, do restauro do instrumento em Hamburgo, coincidentemente onde estudava. Em 1982, Elisa retornava ao Brasil, enquanto o órgão só voltaria dois anos depois.

Em 1985, finalmente, ela recebeu convite de Francisco Afonso Noronha para tocar no concerto de um ano de restauro do instrumento, já devidamente instalado na Catedral da Sé. “Como havia demanda por alguém que ajudasse, acabei ficando, voluntariamente”, recorda ela, que acabaria se tornando a organista oficial da Sé de Mariana, diante do interesse pelo instrumento. Para tal, chegou a participar de uma imersão de dois meses no Arp Schnitger, no Norte da Alemanha.

Lewgoy
Em uma das temporadas de concertos do órgão da Sé de Mariana, Elisa foi informada que havia apenas uma pessoa na plateia. “A senhora não vai tocar só para mim?”, quis saber, para a surpresa da organista, o ator José Lewgoy (1920-2003). “Tocarei sim, com muito prazer”, disse Elisa.

Mas as apresentações costumam atrair muitos interessados, de vários países. Houve dia em que ela detectou na plateia pessoas que falavam 13 línguas diferentes. “Tinha sueco, japonês, inglês, francês, alemão...”, lista a organista que, durante a apresentação, só fala em português, mas depois do concerto costuma fazer uso do inglês e do francês para atender aos estrangeiros.

Geralmente às sextas-feiras, de acordo com ela, o público é formado por participantes de excursões. Já aos domingos predominam as famílias. No ano passado, a média foi de mais de 60 pessoas por apresentação, mas em dias que antecedem grandes feriados a assistência costuma cair. “Não há um fluxo regular de pessoas. No Corpus Christi, por exemplo, tivemos 220 pessoas”, contabiliza Elisa Freixo, que jpa lançou 14 CDs, alguns deles gravados na Europa.

Liturgia, concertos e viagens

Para a organista, no decorrer dos anos, Minas Gerais acabou se tornando pioneira no restauro de órgãos históricos, além de se tornar modelo também de uso do instrumento. “O estado também passou a ocupar destaque na formação de plateia e de músicos, além de instigar as igrejas a usarem não só órgãos, mas harmônios, cravos e coros, divulgando-os como instrumentos litúrgicos e de concerto.

Segundo Elisa, um dos maiores desafios do setor é a formação de músicos e a ausência de apoios e patrocínios. A boa notícia, de acordo com ela, vem de Juiz de Fora, na Zona da Mata, onde a Escola de Música de UFJF vai criar curso de órgão sob orientação da professora e cravista Maíra Pereira. A cidade sedia um dos maiores festivais de música colonial e antiga do país.

“Creio que Elisa tem uma posição única neste cenário, no qual ela tem sido uma pessoas pioneira, corajosa”, elogia a discípula paulistana Josineia Godinho, que, depois de estudar com a Elisa na faculdade, foi trazida por ela para Minas Gerais. “Elisa tem ardor pela música de órgão. É uma missionária, vai até o fim, paga o preço, abre as portas”, acredita Josineia, para quem ninguém vai conseguir tirar a marca que Elisa Freixo imprimiu ao seu trabalho que, depois de Mariana, se estendeu a Tiradentes, onde ela toca toda sexta-feira, na Igreja Matriz de Santo Antônio.

Bach

A mais recente atividade da organista é a de guia de viagens culturais. A próxima está agendada para maio de 2015, entre os dias 4 a 15 e 17 a 24, quando, ao lado do colega de trabalho Jean Ferrard, de Bruxelas, Elisa estará guiando dois grupos pela Saxônia, Turíngia e Hamburgo. De acordo com a organista, os interessados estarão visitando órgãos, igrejas, museus e cidades onde J. S. Bach atuou.

Com descrição bilíngue (português-francês), cada grupo será formado por no máximo 40 pessoas. A vida de Bach será o fio condutor das duas viagens (uma de 12 dias de duração e outra de oito). Eisenbach, Arnstadt, Weimar, Freiberg, Dresden e Leipzig, além de Hamburgo, Lüneburg, Celle e Lübeck e os órgãos Schnitger da região Norte da Alemanha estão na agenda. Os interessados devem acessar o blog https:/peloscaminhosdebach.blogspot.com.br/ .

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