Cantor e saxofonista Seun Kuti chega ao Brasil para lançar seu terceiro disco

Filho do lendário músico africano Fela Kuti herdou as ideias e o afrobeat do pai

por Mariana Peixoto 26/09/2014 11:24

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Kelechi Amadiobi
Em 4 de outubro, Seun Kuti vai se apresentar em BH (foto: Kelechi Amadiobi)
Seun Kuti tinha 8 anos quando subiu pra valer no palco do Africa Shrine, o clube que seu pai tinha em Lagos, Nigéria. Ele já havia participado de ensaios e sempre se impressionava com o combo de mais de 12 músicos que formava a Egypt 80, banda que acompanhava Fela Kuti. No dia do show, sem despregar os olhos dos instrumentistas, ouviu do pai: “Você não pode olhar para a banda, garoto! Tem que olhar direto para o público”. Essa lição, nunca esquecida, Seun tenta aplicar até hoje, duas décadas depois.

Filho caçula do mais importante músico que a África viu nascer, Seun Kuti, de 31, inicia a sua maior turnê brasileira. De domingo a 11 de outubro, ele faz cinco shows no país: São Paulo, Porto Alegre, Rio, Belo Horizonte e Paraty estão na agenda. Ele vai passar também por Buenos Aires, na Argentina, e Medellin, na Colômbia. Em BH, a apresentação será no dia 4, no Sesc Palladium.

Ao contrário do irmão 20 anos mais velho, Femi Kuti – que, ainda com o pai em vida, montou sua própria banda, a Positive Force, e buscou se estabelecer como músico independente –, Seun nunca fugiu do astro da família. Com a morte de Fela, em 1997, ele, já não mais um garoto, tornou-se o herdeiro natural de sua música. Nove integrantes da Egypt 80 que vêm ao Brasil acompanharam Fela.

Criador do afrobeat – genial mistura das tradições africanas com funk, jazz e rock psicodélico, que permite longas improvisações em músicas hipnóticas que facilmente atingem os 20 minutos –, o saxofonista, pianista e vocalista Fela Kuti (1938-1997) não entrou para a história apenas pela arte. Sua trajetória beira o extraordinário. Ativista político e de direitos humanos, lutou contra a opressão militarista em seu país e criou, nos anos 1970, a República Kalakuta, comuna nos arredores de Lagos que chegou a declarar independência da Nigéria. O artista tentou se candidatar a presidente, mas não conseguiu. Tornou-se o Black President, nome de um de seus álbuns.

Líder


Fela teve ainda 27 mulheres (ao mesmo tempo!) e morreu em decorrência da Aids. Ironicamente, o anúncio da morte foi feito por seu irmão, Olikoye Ransome-Kuti, importante ativista contra a doença. Seu funeral reuniu 1 milhão de pessoas em Lagos. “Hoje em dia, um número muito maior de pessoas conhece o meu pai. Muito mais gente do que quando ele estava vivo. Acredito que agora as pessoas conseguem entender melhor sua mensagem”, afirma Seun.

Para ele, a igualdade entre os homens é a base da mensagem de Fela Kuti. “A Nigéria tem que ser mais igualitária e plural. O país deve dar oportunidades iguais para que todos consigam realizar seus sonhos. Quando se fala em ebola, o problema maior não está na doença. Ela nem existiria na Nigéria se o país tivesse investido em assistência médica. Se o governo tivesse criado programas de saúde, as pessoas não teriam ebola, ou não precisaríamos dos Estados Unidos para conseguir a cura. A questão no meu país é maior, de infraestrutura e, principalmente, corrupção”, afirma Seun.

Cantor e saxofonista como o pai, Seun traz ao Brasil seu terceiro álbum, A long way to the beginning, lançado em março. Assim como os anteriores, o afrobeat de Fela está na base da sonoridade. Mesmo mantendo o cunho político da obra do pai, Seun procura ir além. Adicionou o hip-hop, com a presença dos rappers norte-americanos M-1 e Blitz The Ambassador. Convidou também a cantora de soul music Nneka, nigeriana como ele e radicada na Alemanha.

Nos shows, além de seu próprio repertório, Seun interpreta músicas do pai. Sempre abre as apresentações com um petardo de Fela. Para a turnê brasileira, escolheu V.I.P., canção de 20 minutos que marcou antológica apresentação dele com sua primeira banda, Afrika 70, em 1979, na Alemanha – naquela época, ele estava proibido de fazer shows na Nigéria. V.I.P., para Fela, é a sigla para Vagabonds in power (Vagabundos no poder). Não custa nada lembrar: o show em BH será na noite anterior às eleições no Brasil.

“Goodfellas”

Reprodução
Fela Kuti: música e política para libertar a Nigéria (foto: Reprodução)
» Documentário – Atração do Festival do Rio, Finding Fela, de Alex Gibney (vencedor do Oscar em 2007 pelo documentário Um táxi para a escuridão, sobre a tortura praticada pelos EUA), busca retratar o músico a partir de entrevistas com artistas e parentes, além de imagens de arquivo. O filme começa com uma afirmação de Fela Kuti que deu o que falar: “Noventa e nove por cento da informação que se tem sobre a África é incorreta”, disse ele num show na Alemanha, nos anos 1970.

» Biografia – Em 2011, foi publicada no Brasil, pela Editora Nandyala, Fela: esta vida puta, biografia autorizada escrita pelo cientista político e escritor cubano Carlos Moore. Radicado em Salvador, o autor conheceu Kuti nos anos 1970 e se tornou muito próximo dele. Originalmente, o livro foi editado em 1982 e inspirou o musical Fela!, produzido por Jay-Z e Will Smith, encenado na Broadway e vencedor de prêmios Tony. Como não foi comunicado da produção do espetáculo, Moore entrou com um processo contra a produção. Na edição brasileira, o prefácio é de Gilberto Gil, que se dirigiu a Kuti como “o mais recente gênio africano”.

» Seguidores – Fela Day é o nome da celebração mundial que ocorre em 15 de outubro, dia do nascimento de Fela Kuti. Desde 2010, são realizadas em BH edições da festa com bandas, DJs e artistas. Em novembro, haverá mais afrobeat na capital: o grupo paulista Bixiga 70 tem show previsto para o dia 30, em local a ser definido. Outra banda brasileira do gênero é a carioca Abayomy Afrobeat Orquestra.

SEUN KUTI E EGYPT 80
Em 4 de outubro, às 21h. Sesc Palladium, Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro, (31) 3270-8100. Plateias 1 e 2: R$ 80 e R$ 40 (meia-entrada). Plateia 3: R$ 60 e R$ 30.

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