Artistas octogenários surpreendem os fãs com novos projetos

Em setembro, o canadense Leonard Cohen lança disco de inéditas, depois de expor gravuras e se desdobrar em turnês

por Mariana Peixoto 30/08/2014 11:00

INFORMAÇÕES PESSOAIS:

RECOMENDAR PARA:

INFORMAÇÕES PESSOAIS:

CORREÇÃO:

Preencha todos os campos.
Fabrice Coffrini/AFP
'Almost like blues', single do CD de Leonard Cohen, chama a atenção do mundo (foto: Fabrice Coffrini/AFP)
Durante o show de gravação do CD e DVD Live in London, o cantor, compositor e poeta canadense Leonard Cohen contou para o público sobre a conversa que teve com um antigo professor. Durante o drinque que tomaram juntos, o mentor disse, sem meias palavras: “Desculpe-me por não ter morrido”. Na época do encontro, ele contava com 97 anos; no dia deste relato, ele devia ter 102. Voltando-se para a plateia, Cohen arrematou, com uma dose de ironia e nenhuma de melancolia: “Bem, é mais ou menos assim que me sinto”. Esse fato ocorreu quando o cantor tinha 74 anos. Em 21 de setembro, ele completa 80. Dois dias mais tarde, lança o álbum Popular problems, com repertório inédito.

O lançamento virtual do primeiro single, Almost like the blues, vem causando burburinho. Mestre da canção – um dos últimos grandes da língua inglesa, ao lado de Bob Dylan e do conterrâneo Neil Young –, Cohen, é sabido, foi roubado por sua antiga empresária, perdendo quase tudo o que ganhou. Voltou a gravar com regularidade, fez exposições para vender suas gravuras e, mais importante, passou a fazer turnês como um garoto – na mais recente, que rodou EUA e Europa até o ano passado, era capaz de ficar pouco mais de três horas em cena, com apresentações sempre esgotadas e impecáveis. Almost like the blues é pura desesperança – como o são algumas das letras do bardo –, falando de guerra, incêndio, estupro, assassinato e pequenas mortes que todos sofremos ao ver tanta degradação.

Para os milhares que o cultuam – mais hoje do que 30, 40 anos atrás –, a voz parece ainda mais descarnada, com graves muito acentuados. Quem o ouve agora, ao descobrir os primeiros registros de canções antológicas como Suzanne, So long, Marianne e Sisters of mercy em seu álbum de estreia, Songs of Leonard Cohen (1967), pode achá-los quase irreconhecíveis. As mudanças na voz de Cohen, no entanto, caem como uma luva para a densidade de suas letras. Melhor aos 80 do que aos 40, não é exagero dizer. E a verdade é que o canadense não está sozinho. Não é preciso ir muito longe para encontrar outros artistas de sua geração, quando não mais velhos, ainda em ação. Com prazer e vitalidade.

NO PALCO


» Bibi Ferreira completou 92 anos, em junho, com o show Bibi, histórias e canções. Já tem agenda cheia até o fim de 2015 com um novo espetáculo em que interpreta o repertório de Frank Sinatra.

» Tony Bennett, que chegou aos 88 no início deste mês, também lança álbum em 23 de setembro. Cheek to cheek, novo projeto de duetos, desta vez com... Lady Gaga. Há a promessa de uma turnê com a dupla.

Hiago Marques /Divulgação
Ângela Maria e Cauby Peixoto: casa lotada em Belo Horizonte (foto: Hiago Marques /Divulgação)

NA ESTRADA, PARA VARIAR

Há não mais do que um mês, Ângela Maria fazia show de voz e violão em São Paulo. Naquela noite, ela resolveu que não iria cantar Babalu. Decidida, chegou até o bis sem entoar a canção mais conhecida em sua voz, a despeito dos pedidos insistentes da plateia. No dia seguinte, continuou firme. Veio o primeiro bis, o segundo, mas não teve jeito. O público começou a entoar Babalu e a cantora teve que se render. Pois afora uma ou outra exceção como a citada acima, são de contar nos dedos as vezes em que ela não cantou a música mais conhecida de sua discografia de impressionantes mais de 100 álbuns. Babalu foi gravada pela primeira vez por Ângela Maria em 1955.

Ela nunca pensou que sua carreira fosse tão longe. “Na verdade, não imaginava viver tanto”, admite a cantora, que completou 85 anos – 65 de carreira – em 2013. Afora uma ou outra mudança – “a diferença é que hoje busco cantar um ou dois tons abaixo” –, Ângela mantém uma agenda de pelo menos meia dúzia de apresentações por mês. Às vezes solo, noutras ao lado do velho amigo Cauby Peixoto (dois anos mais novo do que ela), como o show que os trouxe em julho ao Teatro Bradesco, em BH, com casa lotada. A cantora exibe vitalidade e humor que chamam a atenção. “Tem que mudar um pouco o show para não ser sempre a mesma coisa. Hoje em dia, sou mais engraçada, brinco com o público, conto histórias.”

Até mesmo o cotidiano de cuidados – ou da falta deles – é o mesmo de décadas atrás. “Antes de um show, converso, morro de rir, não tem essa de não poder falar porque vai cantar amanhã. Só quando entro no camarim, quando está se aproximando a hora da apresentação, é que fico em silêncio para não cansar as cordas vocais”, revela. Planos para o futuro? Os mesmos desde sempre. “Vou cantar até morrer, porque o que sei fazer bem é isso”, resume.

Susto com os 90


Terça-feira, a cantora lírica mineira Maria Lúcia Godoy completa 90 anos. “Não canto mais peças de grande extensão, é muito pesado”, admite. Mas isso não quer dizer que ela tenha parado com tudo. Lança, até o fim do ano, pela Editora Sesi-SP, o livro Guardados de Maria Lúcia Godoy e o CD Acalantos, com sete canções infantis. Duas delas, por sinal, são poemas musicados escritos por Maria Lúcia quando não tinha mais do que 8 anos.

Cantora lírica que se tornou conhecida como importante intérprete de Heitor Villa-Lobos, graças à gravação das Bachianas brasileiras nº 5, Maria Lúcia Godoy, ainda que raramente, faz algumas apresentações ao vivo. A mais recente foi em abril, durante a reinauguração do Teatro Francisco Nunes.

“Nunca tive nenhum cuidado especial com a voz, também nunca bebi ou fumei. Minha voz era de contralto, então cantava peças mais graves. Até que comecei a cantar aquelas em que era soprano e minha voz fluía até as notas mais agudas. Minha extensão (vocal) é muito grande”, continua ela, que se consagrou no país e no exterior como cantora de câmara e solista sinfônica.

Sobre a idade, que Maria Lúcia não aparenta, ela se limita a dizer: “Nunca imaginei chegar até aqui. Ano passado, quando me falaram que iria fazer 90, levei um choque. Aí resolvi parar”, revela.

Leandro Couri/EM/D.A Press
Maria Lúcia Godoy vai lançar livro e disco até o fim do ano (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

MAIS SOBRE MÚSICA