Quando Débora Falabella recebeu a sinopse de 'Dupla identidade', série de Glória Perez que vai ao ar às sextas-feiras na TV Globo, tinha uma visão, digamos, “pouco aprofundada” sobre sua personagem, a produtora de moda Ray. Mas, à medida em que foi gravando e, sobretudo, assistido aos episódios, sua perspectiva mudou. “Tenho ficado cada dia mais impressionada com a série. Quando você lê o texto pela primeira vez, não tem muita noção da história e dos personagens. Mas, depois que a trama vai se desenrolando, a gente vê como as coisas são bem desenvolvidas e planejadas”, avalia.
A atriz mineira, de 35 anos, conta que Ray começou como uma figura meio à parte e que o foco ficou todo no namorado, o psicopata e serial-killer Edu, interpretado por Bruno Gagliasso, e nos policiais vividos por Marcelo Novaes e Luana Piovani. Ao longo da trama, a produtora de moda vai se tornando uma figura importante no enredo. “Aí se percebe como foi uma personagem bem escrita e desenhada”, pontua. Débora acrescenta que Ray é um dos papéis mais ingênuos e frágeis que ela já fez e algo completamente diferente de tudo que já interpretou ao longo da carreira.
“Ela experimenta muitas sensações e cada hora está de um jeito. Isso para um ator é ótimo e um grande desafio. Tinha horas que pegava as cenas e ficava me debruçando, imaginando como seria. Quando ela fica ameaçada e sozinha, surge um ódio dentro dela. Ela tem uma vontade de viver esse amor, custe o que custar.” Débora destaca como a personagem, ao viver extremos de sua emoção, se torna ainda mais interessante para o espectador. “Quando está alegre, fica muito alegre. Quando está apaixonada, também. E tinha cenas sofridas que eram bem fortes. Ray vai de um lugar para o outro com facilidade. É tudo muito intenso”, observa
Esse tipo de comportamento da personagem é explicado porque Ray sofre do Transtorno de Personalidade Borderline (TPB). A autora Glória Perez se inspirou numa história da vida real, da jovem Nathalia Musa Monteiro, para criar o papel de Débora. Medo do abandono, raiva incontrolável, automutilação, impulsividade, ausência de autoidentidade, mudanças repentinas de humor, paranoia, histórico de relacionamentos instáveis e sentimento de vazio. Todas essas características podem ser consideradas bem humanas, mas, quando juntas e intensas, podem caracterizar um transtorno. Alguém que sofre de uma desregulação emocional grave, com sentimentos vividos de forma intensa.
A artista revela que nunca tinha ouvido falar de borderline antes de Dupla identidade e que pesquisou bastante sobre o tema, participando de palestras com especialistas e, inclusive, chegando a ter contato por e-mail com Nathalia, que tem um blog (borderline-girl.blogspot.com.br), no qual relata suas experiências. “Li várias histórias semelhantes às da minha personagem, mas não quis ficar totalmente ligada e preocupada com isso. A gente sabe que ela vive no limite da emoção, que é insegura, mas não segui à risca. O próprio texto da Glória tinha tudo ali. Ele foi o meu principal guia”, diz.
Surpresa Débora Falabella deve terminar ainda esta semana de gravar suas últimas cenas da produção, que está prevista para terminar em 19 de dezembro. A segunda temporada já está garantida, mas a atriz não sabe se Ray fará parte da nova série, assim como os demais personagens. Mas ela é só elogios para o resultado do trabalho. “Depois de dois anos afastada da TV e com um sucesso como foi Avenida Brasil, voltar com um produto dessa qualidade me enche de orgulho. Acho a série muito benfeita, é aquela coisa de entretenimento mesmo, e estou muito feliz e satisfeita com o resultado”, celebra.
Com relação ao desfecho da primeira temporada, a atriz belo-horizontina não pode adiantar nada, mas espera que ela surpreenda. “A gente fica querendo defender o personagem, mas não pode esquecer que essa trama é bem diferente de uma novela, que tem início, meio e fim. Não é que eu não espere um final feliz, mas o grande barato é que ela tenha um desfecho surpreendente, para dar vontade de assistir à segunda temporada”, defende.
A GRANDE FAMÍLIA
Se na televisão Débora Falabella está numa trama densa e pesada, no teatro a realidade é totalmente oposta. Ela não está em cena, mas, pela primeira vez, nos bastidores e ao lado da irmã Cynthia, à frente da direção de uma peça infantil. O espetáculo O rei e a coroa enfeitiçada, que estreou em setembro em São Paulo e ainda está em cartaz até o fim do mês na capital paulista, conta a história de Nicolau, rei da Felizlândia, que vive com simplicidade e pensa no bem-estar do seu povo.
Sua filha Irene, sucessora do trono, vai se casar com Augusto Valente, jovem inteligente e trabalhador. Tudo estaria tranquilo se não fosse pelo duque de Urticária, irmão do rei, que deseja tomar o trono e presenteia a majestade com uma coroa enfeitiçada. O texto foi escrito há quase 10 anos pelo patriarca dos Falabellas, o ator e diretor Rogério, quando nasceu sua primeira neta, Irene, filha de sua primogênita, Júnia.
“Só fui dirigir o espetáculo porque tinha uma história bem significativa por trás e aí fiquei muito encorajada. Uma vez, fizemos uma leitura com amigas e ficou bem legal, mas essa coisa de dirigir só foi surgir anos depois. E tudo conspirou. Já tinha uma filha, a Cynthia também, e coincidiu com um período em que não estava gravando muito”, conta Débora.
A atriz e agora diretora brinca que a história é um conto de fadas familiar que poderia se passar dentro da sala de sua casa. Além dela, da irmã Cynthia e do pai, seu ex-marido e pai de sua filha, Nina, o músico Chuck Hipolitho, é o responsável pela trilha sonora. Trabalhar em família não é novidade para Débora, que atuou com Cynthia na peça A serpente, de Nelson Rodrigues, em 2010. “Já meu pai só me dirigiu em um comercial, quando eu era criança, e de vez em quando a gente passa texto juntos. Essa experiência está sendo muito bacana e surgiu de uma maneira muito despretensiosa, sem planejar”, frisa.
No elenco da produção – que está indicada ao prêmio Arte Qualidade Brasil –, estão os atores Gustavo Haddad e Erica Montanheiro e uma turma de mineiros talentosos que inclui Fafá Rennó, Ivan Capua, Henrique Carsalade e Alexandre Vasconcelos.
“A gente quer rodar o país, mas ainda estamos buscando patrocínio. Se tudo der certo, vamos apresentar o espetáculo em BH”, planeja a atriz, que está em cartaz com Contrações, ao lado de Yara de Novaes. “Vamos voltar com ele no fim de fevereiro, mas a nossa companhia, Grupo 3 de Teatro, já está pensando no próximo espetáculo para 2015.”