Saiba como conferir sabor extra ao cardápio

Na busca por pratos que surpreendem e deixam marcas, cozinheira dedicada ao ensino da gastronomia investe em molhos e caldas que incrementam receitas, da entrada à sobremesa

por Celina Aquino 09/10/2017 14:49

Andre Resende/divulgação
Chef aposta em molhos (foto: Andre Resende/divulgação)
 

Da comida molecular à canjiquinha. Do sushi ao hambúrguer. Sheilla Furman não se prende a um único estilo de cozinha. Ela gosta de comida com sabor, e ponto. Em meio a tanta variedade, existe um ponto em comum: os molhos. É raro encontrar um prato dela que não tenha um tempero a mais (as sobremesas também não ficam sem calda). “Até feijão-tropeiro ganha mais vida com um molho campanha, que nós chamamos de vinagrete. Os molhos ajudam a dar sentido ao prato, porque fazem a ligação dos ingredientes, e ainda dão sabor e umidade”, opina a professora universitária e sócia da escola Basílico Gastronomia ao Ponto, em Belo Horizonte.

Barbecue é um dos mais pedidos. A cozinheira aposta em uma base primorosa com pele e casca de bacon, alho, cebola, tomate, molho inglês, um pouco de molho shoyo, açúcar mascavo, farinha de trigo torrada e caldo de carne. “Todos precisam de um toque defumado, em níveis variados, seja com pedaço de bacon, defumador a frio ou fumaça líquida, para fazer valer o nome de churrasco”, acrescenta. Entre as suas receitas estão barbecue de refrigerante de maçã (associado a um rótulo de uísque com notas de madeira e caramelo), de bananada (derretida com um pouco de cachaça, no lugar do conhaque) e o de goiabada (que ganha mais sabor com pasta de pimenta coreana).

Como fã de maionese, Sheilla fica satisfeita de observar que o molho voltou a agradar ao público. A surpresa fica por conta do acréscimo de novos sabores. “Utilizo uma boa base de maionese e vou colocando diferentes essências, que podem ser de cebola caramelizada, alho assado, coentro ou mesmo bacon. Até dá para misturar os pedaços, mas prefiro tirar o caldo que fica na panela depois que ele é dourado”, detalha. Longe de ficar restrita ao hambúrguer, a maionese pode acompanhar, por exemplo, tempura de legumes, prato tradicional do Japão.

Andre Resende/divulgação
Até o hambúrguer ganha acompanhamento (foto: Andre Resende/divulgação)

As salsas cruas também aparecem com frequência no cardápio. Sheilla ensina a braquear a folha de sua preferência (pode ser salsa, rúcula, coentro) e depois batê-la no liquidificador com cebola, alho dourado e limão. “São molhos crus, mas muito frescos e temperados. Eles combinam com carne de frango, peixe empanado e até com uma bisteca”, avalia. O azeite ajuda a temperar.

Outra receita curinga na cozinha é o bom e velho molho de tomate. Na opinião de Sheilla, é o mais simples e o mais difícil de se encontrar com qualidade fora de casa. O que ele sugere, para começar, é fazer uma boa compra. “Muitos tomates não ficam maduros no pé, porque são colhidos verdes. Mesmo quando estão aparentemente maduros no supermercado, eles podem estar firmes ainda e você terá que corrigir a acidez com açúcar ou cenoura. Aí vai virar um molho adoçado”, alerta. A cozinheira costuma utilizar o tomate uva (que em inglês é chamado de sweet grape), associado ao tomate pelado. Ela também sugere o mabelle, que tem sido cultivado na Serra da Mantiqueira, e o holandês.

AZEITE 
Por acreditar que os doces sempre precisam de caldas, Sheilla não economiza nas invenções. Uma delas é o caramelo de azeite, que entra para substituir a manteiga ao fim do processo, já com o fogo desligado, para dar liga e brilho. A base continua a mesma (com açúcar queimado, creme de leite fresco e baunilha). A cozinheira gosta de acrescentar gotas de azeite quando o caramelo já está no prato, para reforçar o sabor, no mínimo, curioso. “Ele combina com sobremesas cremosas, creme patissiere e até chocolate, desde que seja mais amargo. Não pode ser nada muito doce nem com sabor exuberante para não matar o caramelo, que deve ser o principal”, orienta.
Andre Resende/divulgação
Para os doces, cozinheira aposta nas caldas (foto: Andre Resende/divulgação)

Mesmo que seja uma calda de frutas, Sheilla tenta sempre deixar os sabores mais complexos. Por isso, acrescenta vinho tinto à calda de frutas vermelhas, mistura canela com a de maracujá e vai construindo combinações que se destacam na boca. “Até temperos de comida salgada, como pimenta- do-reino e flor de sal, deixam o sabor de receitas doces mais interessante”, destaca.

 

LÍNGUA, BETERRABA E ANGU Formada em publicidade, Sheilla entrou para o curso de gastronomia imaginando que seria um hobby, mas já na primeira semana teve a certeza de que queria trabalhar com comida. “Sempre gostei muito de comer e os sabores e aromas me surpreendem a cada dia. Acho incrível preparar algo que pode mudar o seu humor”, explica a cozinheira, que acharia entendiante abrir um restaurante para fazer sempre o mesmo cardápio. O que ela gosta é de desafios, por isso escolheu dar aulas (“é estimulante, porque todo dia aprendo uma receita nova”), consultorias e cozinhar para eventos, desde jantares até casamentos. No currículo, ainda consta participação no programa de TV The Taste Brasil.


Nessa busca pela construção de sabores, Sheilla tem se dedicado a realçar a acidez dos pratos. Para ela, o limão e os vinagres (atualmente, está trabalhando muito com o balsâmico branco) conseguem levantar qualquer receita. “Tenho usado também sucos de frutas. Faço uma versão bem ácida do creme brulee com cupuaçu, em vez de baunilha, mas não incluo só em sobremesas. Preparo molhos para acompanhar carnes com tangerina e carambola quando está bem verde, por exemplo”, conta.
Andre Resende/divulgação
Barriga de porco com molho de tomate assado (foto: Andre Resende/divulgação)

Se tem um prato que representa bem o trabalho de Sheilla é a língua de boi com angu de milho verde. “O que mais gosto na língua é a textura cremosa, parece que é a manteiga do boi”, destaca. Antes de cozinhar, a professora tempera a carne com alho, louro em pó, pimenta-do-reino moída na hora, sal e limão (sim, ela aprendeu com a mãe que limão transforma o sabor das carnes). Para acrescentar mais sabor, no caso defumado, a carne é dourada com gordura de bacon. Bebidas como cerveja preta, uísque e vinho (os franceses amam com o madeira) ajudam a deixar a receita mais complexa.

A sugestão da cozinheira é servir a língua com um molho agridoce de beterraba (receita que ela usou para entrar no reality show). Caldo de carne, tomate para dar cor, beterraba tostada com casca e depois coada, açúcar e vinagre de arroz vão para a panela até reduzir. De acompanhamento, além do angu de milho verde, ela dá a opção de purê de batata com brócolis, batatas ao murro ou mesmo um simples pão fresco. Se o molho não for doce, existe a possibilidade de servir com nhoque de abóbora ou batata-doce.  

 

Costela ao molho de cachaça envelhecida, angu de milho e bertalha
Ingredientes

1kg de costela bovina em pedaços; 
4 dentes de alho picados; 1 cebola picada; 100g de bacon em cubos; 
1 colher de chá de extrato de tomate; 1 colher de chá de açúcar mascavo; 
1 colher de sopa rasa de farinha de trigo torrada; 70ml de cachaça envelhecida em carvalho; sal, pimenta e suco de limão a gosto; manteiga que baste; 1l de caldo de carne caseiro (feito com aparas e ossos de costela); 6 espigas de milho debulhadas; ½ cebola picada; 
2 dentes de alho picados; 1 colher de café de cúrcuma; 1 colher de sopa de manteiga; 200ml de leite; 300ml de creme de leite fresco; sal e noz-moscada a gosto; 200g de bertalha; 3 dentes de alho inteiros; azeite 
que baste; sal a gosto

Modo de fazer


Doure bem na manteiga o bacon e os pedaços de costela já temperados com sal, pimenta, alho e limão. Junte as cebolas, o extrato de tomate e molhe com a cachaça. Cubra com caldo de carne e cozinhe na pressão por 50 minutos. Abra a panela, já sem pressão, e desfie a carne. Tempere a carne com sal e pimenta e molhe com um pouco do caldo. Modele em aros e leve para gelar por 4 horas. Coe o caldo do cozimento da costela, junte o açúcar mascavo e engrosse com a farinha torrada diluída em um pouco de água. Se o caldo estiver muito gorduroso, deixe no congelador até que gordura se solidifique a ponto de poder ser retirada com uma colher. Deixe ferver bem até que perca o sabor de farinha e confira o tempero. Doure a carne da costela em manteiga bastante quente, ainda com o aro. Retire o aro e leve para terminar de aquecer em forno pré-aquecido a 2000C por 20 minutos. Sirva com o molho ao redor. Para o angu de milho verde, doure em manteiga o alho, a cebola e a cúrcuma. Bata-os em liquidificador junto ao milho, leite e creme de leite. Coe e leve ao fogo. Cozinhe em fogo baixo, mexendo sempre até que fique consistente e perca o sabor de amido de milho cru. Tempere com sal e noz-moscada. Para a bertalha, doure os dentes de alho inteiros em azeite, em fogo baixo. Retire-os e esprema-os de volta nesse azeite. Junte as folhas e refogue rapidamente. Tempere com sal. 

 

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