Simplicidade e comida farta vão parar na mesa do banquete de casamento

Sai o escargot, entra a porqueta. Nada de ingredientes importados na comemoração dos noivos. Do bolo ao bufê, festas de casamento privilegiam retorno às origens. Aprenda fazer um ragu de pato

por Laura Valente 08/05/2017 11:22

Gladyston Rodrigues/EM
Cada vez mais os noivos montam a lista de convidados com pessoas com quem realmente querem comemorar (foto: Gladyston Rodrigues/EM)

Houve um tempo em que era comum destacar a importância de um casamento por meio do bufê. Nessa época, ingredientes importados e nobres, como caviar e lagosta, coroavam as bodas de noivos abastados, muitas vezes para desconforto de convidados menos acostumados a banquetes imponentes. Hoje, segundo especialistas, a tendência aponta para uma mudança de comportamento, e chique mesmo é promover uma festa que ofereça aos presentes um menu apoiado em conceitos como memória afetiva e raízes. “Não tenho nada contra servir camarão, mas frente à rotina corrida que todos estamos vivendo, em que se come fora diariamente, na hora de celebrar temos percebido a preferência pelo descomplicado, por sabores facilmente reconhecíveis, que carregam a memória afetiva e lembram a comida regional e caseira feita pela mãe, pela avó”, registra Cantídio Lanna, chef responsável pelo Pichita Lanna, bufê que já conta com 37 anos de mercado.


Sem pestanejar, Cantídio diz que a nova cena gastronômica em casamentos, obviamente afinada com estilo, local e horário da celebração, inclui até mesmo ingredientes tidos como corriqueiros, a exemplo de pernil e costela de porco. Ou “de segunda”, caso das triviais carne de sol e do músculo bovino. No entanto, tudo trabalhado com criatividade, técnicas e apresentação cuidadosas. Em casamento realizado ontem, por exemplo, o chef serviu carne moída com ora-pro-nóbis e ovo frito.


Segundo ele, além de o cenário econômico favorecer a opção por um investimento mais pé no chão (em que as festas ganham tom mais intimista, com decoração menos pomposa e menor número de convidados), o que se vê é mesmo uma mudança de comportamento. “A tendência tem levado ao bufê a tradução da realidade de cada um, o que não tem nada a ver com classe social e disponibilidade de dinheiro, mas, sim, com estilo de vida, raízes, terroir”, traduz. Assim, no lugar dos tradicionais linguado e salmão, por exemplo, ele vem apostando em peixes dos rios brasileiros, como os amazônicos pirarucu e tambaqui.


Cantídio revela que ainda há muito a explorar neste novo cenário, em que o céu é o limite. “Antes, noivos e famílias buscavam servir receitas clássicas e sofisticadas, com origem em outros países até, como lagosta à thermidor, filé rossini, mas hoje as pessoas estão procurando um retorno às origens, à identidade, ao que chamamos de confort food. Ou seja, receitas já saboreadas em algum período da vida, no ambiente doméstico. Falo do pastelzinho, da coxinha, da porcheta e do torresmo, do mexido ou da macarronada (principalmente no encerramento da festa). Comida com gosto de comida, que bate no estômago e cai bem, muitas vezes até para fazer o convidado sarar do consumo mais caprichado de bebida alcoólica”, comenta.
E vai além. “O cara já está enjoado do excesso de parma, de não reconhecer o que leva à boca. Em meio à descontração de uma festa, ele quer entender rápido a linguagem do que é oferecido no bufê. Por isso, receitas como minihambúrguer fazem sucesso imediato”, garante.

 

Cardápio intimista

 

Também tem sido comum a opção por uma comemoração intimista após o casamento civil, como destaca a banqueteira Liliane Menezes. “De uns anos pra cá, tenho feito bufês para pequenas comemorações que envolvem apenas as famílias e os amigos mais íntimos. Ou seja, um menu especial, sim, mas bastante prático, geralmente servido na hora do almoço”, aponta ela.


O serviço, conta, inclui receitas como canapés, crostines, entradinhas mais leves, a exemplo de ragu de pato sobre polentinha (veja receita na página) ou casquinha de siri, além de salada, prato principal (dois, um de carne e um de massa, peixe ou frutos do mar) e sobremesa. “Geralmente, a conta que se faz são 10 unidades de petiscos por pessoa, além de mais uma unidade dos quentinhos e do almoço em si. No caso de um filé, o cálculo é, em média, um medalhão por pessoa, e uma ou duas porções da opção de receita servida em pirex (massa ou peixe). E sempre é bom calcular 10% de comida a mais”, sugere.


Liliane revela ainda que a tendência aponta mesmo para casamentos low profile. “Cada vez mais os noivos montam a lista de convidados com pessoas com quem realmente querem comemorar. O menu acompanha o estilo do casal, varia de acordo com o gosto pessoal, o que gera conforto. No lugar de salamaleques, estão privilegiando uma comida gostosa e farta, nada de importados como escargot e trufas, e até procurando facilitar o serviço e o jeito de comer”.

Bolo de verdade Seja qual for o tom da festa, o bolo é um item sempre badalado. Especialista na confecção de receitas com finalização artística que envia para todo o país, Nelson Pantano, chef pâtisserie que assina a marca The King Cake (em São Paulo), avisa que neste quesito a procura pelos clássicos voltou com muita força. “ As pessoas querem poder deixar a sua assinatura em cada detalhe da festa, inclusive no bolo, item que mais chama a atenção depois do vestido da noiva”, cita.


Com formação em Londres, berço da confeitaria artística, ele diz que as receitas executadas são “de verdade”, incluindo as flores de açúcar e massa especial que imitam espécies naturais, técnica desenvolvida por ele a partir de pesquisas também na área da botânica. “Desenvolvemos uma estrutura interna que possibilita fazer todos os andares comestíveis, mesmo de bolos muito altos. Faço mais de 20 receitas diferentes, mas o carro-chefe é a massa de limão siciliano com sementes de papoula e recheios intercalados de ganache cítrico e creme de pistache”, avisa. Os bolos da marca custam a partir de R$ 1 mil.

 
Ragu de pato


Ingredientes


2 kg de pato (cortar nas juntas com os ossos, tirar o excesso de gordura); ½ colher de sopa de páprica doce, ½ colher de chá de páprica picante (ou pimenta calabresa), ½ colher de chá (cheia) de pimenta-do-reino; duas colheres de sopa de óleo e 30g de alho triturao, 200g de cebola, 350g de cenoura, 100g de aipo (todos picados miudinhos ou processados); 1 ramo de tomilho, 3 folhas de sálvia, 2 folhas de louro (depois do cozimento retirar); 1 xícara de tomate italiano pelado, 200ml de vinho tinto seco, sal e caldo de carne (2 litros de água + 2 tabletes), ½ xícara de salsinha triturada, q.b de raspas de limão siciliano.

Modo de fazer

Tempere o pato já cortado e limpo com as pápricas e a pimenta e refogue no óleo com alho. Deixe ficar bem dourado e acrescente os legumes (cebola, cenora e aipo), as folhas (tomilho, sálvia e louro), o tomate e o vinho. Acrescente sal e o caldo de carne, cubra com papel laminado e tampe a panela. Deixe cozinhar em fogo baixo até a carne ficar muito macia, a ponto de desfiar. Se necessário, acrescente mais caldo. Depois de cozido, escorra o caldo (e o excesso de gordura), desfie a carne (retirando ossos e gordura), acrescente a salsinha e as raspas de limão. Sirva sobre polenta mole.

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