Chef aposta na simplicidade do molho caseiro para conquistar público mineiro

Nada de receitas mirabolantes, o chef Sinval Espírito Santo cria receita que agrada o paladar e resgata a memória de um almoço em família

por Celina Aquino 24/01/2016 13:36

Daniel Chico/divulgação
A receita do chutney de manga é da mãe do chef, que tradicionalmente preparava o molho no Natal para presentear os amigos (foto: Daniel Chico/divulgação)
 

Pense em uma comida que dá aconchego. Que resgata a memória de um almoço em família. Que reúne ingredientes frescos, cuidadosamente colhidos no quintal de casa. Isso descreve bem a sensação de comer um dos molhos caseiros da Tibo Cucina Piú Fresca. “O que mais me agrada é proporcionar um afago na alma através do sabor, diferentemente da surpresa da cozinha de vanguarda”, defende o chef Sinval Espírito Santo, que trabalha para incluir nos potes sabores e aromas de infância. Alinhado com a filosofia do comfort food, ele preza mais pela simplicidade que pela complexidade das receitas.

Os testes começaram com o catchup artesanal. Os mais entendidos dizem que é coulis de tomates (quando se reduz uma fruta até virar purê), o que não deixa de ser verdade. “Faço uma base de salsão e cenoura para engrossar, depois entram os tomates sem semente nem pele e o açúcar mascavo orgânico. A ideia é virar uma geleia”, detalha. Ao contrário dos industrializados, o catchup da Tibo Cucina, que leva 36 horas para ficar pronto, não contém vinagre em excesso nem corantes. O molho pode acompanhar hambúrguer ou uma rodada de petiscos com cerveja.

Depois do catchup artesanal, foram lançados outros molhos, sendo que uns seguem a tradição e outros chamam a atenção pelo inusitado. O pesto basílico é um clássico da região de Gênova, na Itália, país onde o chef estudou e trabalhou. A produção dele é limitada, já que o manjericão que aparece na receita se desenvolve melhor em época de sol fraco e chuva. “Não vamos ter pesto basílico o ano todo, mas no resto dos meses vamos fazer o de rúcula. É o jeito que se come em casa”, comenta Sinval, deixando clara a proposta de privilegiar produtos da época.

Na Itália, ele aprendeu a respeitar a sazonalidade das matérias-primas. Os restaurantes de lá sempre trabalham com a pizza do dia, que aproveita o ingrediente no auge do sabor e com preço mais baixo. Por isso, a produção do molho de jabuticaba com cebola se restringiu ao fim do ano.

O chef da Tibo Cucina também se preocupa em utilizar ingredientes locais. “Adapto as técnicas ao que melhor encontrar na região. É claro que ia amar cozinhar com tomate vesuviano, que é da região do Vesúvio e tem gosto mineral. Aqui não tem vulcão, mas tem outro ingrediente incrível, que é a couve.” A folha verde-escura é usada no preparo de uma invenção de Sinval para valorizar as riquezas de seu estado, o pesto mineiro, que também leva queijo canastra. Além disso, em vez de pinoli, semente extraída de uma árvore nativa da região do Mediterrâneo, entra a castanha do Brasil.

Em dezembro, foi lançado o mais novo molho da Tibo Cucina. Sinval recuperou a receita antiga de chutney de manga da mãe, que, devido a um tratamento de saúde, não havia conseguido seguir a tradição de prepará-lo no Natal dos dois anos anteriores. “A minha mãe sempre acrescentou os ingredientes ‘no olho’. Desta vez, anotei tudo até chegar ao sabor que ela aprovasse”, conta. O chef planeja desenvolver este ano um molho com azedinha, hortaliça de Minas com sabor semelhante ao do limão, ainda pouco explorada na gastronomia, e outras opções de agridoce, aproveitando mais frutas.

O que cada molho tem?

Catchup artesanal: tomate, cenoura, salsão, 
cebola, açúcar mascavo, azeite, sal, alho, canela, 
cravo da índia e vinagre
Pesto basílico: basílico italiano orgânico, castanha do pará, azeite e parmegiano reggiano
Pesto mineiro: couve, pepino, salsinha, castanha, queijo canastra, azeite, sal e vinagre
Pesto rosso: tomate, nozes, manjericão, 
alho, azeite, pimenta dedo-de-moça, 
óleo de girassol, sal e vinagre
Pesto de rúcula: azeite extravirgem, queijo canastra, amêndoa, castanha-de-caju, 
castanha-do- pará, pepino, vinagre, alho e sal
Chutney della nonna: manga, vinagre, gengibre, sal, açúcar, pimenta-dedo-de-moça e especiarias
Salsa de morango: morango orgânico, cebola, limão tahiti e especiarias
Mostarda: grãos de mostarda fermentados 
em vinho branco seco


Magret de pato na goiabada frita e chutney de manga com risoto de pesto mineiro

Ingredientes

2 peitos de pato; 3 colheres de sopa de manteiga clarificada; sal e pimenta-do-reino a gosto; 1 colher de sopa de azeite; 200g de goiabada mole; 400g de arroz vialone nano; 100g de queijo parmesão italiano ralado; 100g de manteiga sem sal; 1 cebola média; 1 litro de caldo de legumes; ½ copo de vinho branco; sal a gosto; 2 colheres de pesto mineiro

Modo de fazer

Faça cortes na pele do pato e tempere-o com sal e pimenta-do-reino. Leve a uma frigideira com uma colher de azeite e a manteiga clarificada, deixando tostar bem o lado da pele, e vire. Atenção ao ponto da carne, pois o meio do magret, deve permanecer bem rosado. Retire o magret e coloque-o em um tabuleiro junto com um pouco da gordura do cozimento e deixe descansar até a hora de servir. Na mesma frigideira, coloque a goiabada para fritar na gordura do pato. Em seguida, corte a cebola em pedaços miúdos. Numa panela, coloque 50g de manteiga e refogue a cebola até que fique transparente. Acrescente o arroz e cozinhe por 5 minutos em fogo baixo. Adicione o vinho branco e refogue até que ele evapore. Acrescente o caldo vegetal pouco a pouco, mexendo constantemente. Continue o processo até que o risoto esteja ao dente, o que leva cerca de 14 minutos após a evaporação do vinho. Adicione sal, o restante da manteiga, azeite, o queijo parmesão ralado e as duas colheres de pesto mineiro, após retirar do fogo para “mantecar”. Mexa bem, misturando os ingredientes. Finalize e sirva imediatamente.

Rigor na seleção dos ingredientes

 A ideia de fazer molhos caseiros surgiu em um momento difícil da vida de Sinval Espírito Santo. A mãe dele foi diagnosticada com câncer de medula e precisava mudar a alimentação. “Não tinha nada especial no cardápio, só era preciso saber a procedência dos alimentos. Na hora, pensei: isso é o que a minha avó comia”, relembra.

Do quintal de uma casa em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, saem algumas das ervas usadas nos molhos caseiros da Tibo Cucina Piú Fresca. Os outros ingredientes são fornecidos por produtores orgânicos. O chef faz questão de que os clientes entendam o que está escrito no rótulo, por isso nada de incluir conservantes e outras substâncias químicas com nomes estranhos.

O chutney de manga e o catchup, por exemplo, passam por um processo de cozimento que permite que eles durem seis meses. Já os quatro tipos de molho pesto podem ser consumidos em até 45 dias graças à adição de vinagre e azeite. “Se não usar todo o pesto, sugiro cobrir a superfície com azeite e levar para a geladeira”, diz Sinval, que estuda conservantes naturais, como casca de abacaxi.

Os molhos são encontrados em dois pontos de vendas em Belo Horizonte, em feiras e ainda podem ser encomendados pelas redes sociais. Todos os potes custam R$ 30, menos o de pesto basílico. “Além de o plantio ser mais difícil, as plantas oxidam muito rápido durante o preparo e a perda pode ser grande. Com 1kg, faço apenas quatro potes”, justifica o chef.

Sinval planeja lançar uma campanha para incentivar a devolução dos potes de vidro, considerando que eles podem ser reaproveitados quantas vezes forem necessárias, pois são simples de esterilizar. Uma das possibilidades é oferecer desconto para os clientes que entregarem a embalagem ao fazer uma nova compra. A intenção do chef é reduzir a quantidade de lixo, diminuindo o impacto ambiental.

  

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