Produção artesanal de bacon ganha força

Usos não convencionais como panetone e sorvete são exemplos de preparos com o ingrediente

por Eduardo Tristão Girão 29/12/2015 08:00
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Agora não basta mais amar o bacon ou dizer que ele “é vida”. É preciso fazê-lo com as próprias mãos ou comprá-lo de quem faça da maneira mais artesanal possível. Em Belo Horizonte, esse movimento é capitaneado por número crescente de hamburguerias, mas chefs, donos de bares, professores de culinária e até confeiteiros também querem distância da versão industrializada do produto. Todos acreditam que, a exemplo de vários outros itens, a barriga de porco curada e defumada se beneficia muito de processo mais cuidadoso e menos artificial.


Um dos casos mais emblemáticos da cidade é o da hamburgueria Bacon Paradise. Aberta em 2013 no Anchieta, a casa trocou, no ano seguinte, o bacon industrializado por um feito em Contagem e de maneira mais natural: a barriga de porco descansa por algumas horas em sal e pimenta-do-reino e é exposta à fumaça gerada pela queima de madeira, sem adição de água (que deixa o bacon mole e mais pesado), fumaça líquida (produto químico que simula o sabor defumado) e “antes” (corantes, conservantes e aromatizantes).

A marca encerra o ano com 10 lojas e outras cinco prestes a abrir, totalizando entre cinco e sete toneladas de bacon consumidas por mês. “Sofríamos com a falta de padrão no percentual de gordura e como o bacon industrial é feito para ser conservado em temperatura ambiente, é muito salgado. Como usamos até na sobremesa, precisamos de bacon que tenha sabor defumado, mas não tão salgado”, conta o proprietário Antônio Ribeiro.

Chegar ao bacon ideal envolveu série de testes, lembra: “Alguns chegavam praticamente cozidos pela falta de controle durante a defumação e ficavam muito secos ao ser fritos. Outros vinham com muita carne, o que parece bom, mas pouca gordura também faz com que fique ressecado.” Definido o fornecedor – Bacon Saudável –, a equipe da hamburgueria concentrou-se em aprimorar a forma de preparo e concluiu que o ideal era fritá-lo na chapa e com peso por cima, o que ajuda a mantê-lo uniforme e a eliminar gordura.

Adepto da mesma marca de bacon, Daniel Gomes, proprietário do Bistrô Burger, no Padre Eustáquio, diz que o produto custa mais caro que o similar industrializado, mas que vale a pena: “Tem sabor melhor, textura melhor, fica mais crocante e vem com mais carne. Além disso, é menos salgado que os industriais. Dá para sentir mais o sabor da carne de porco, pois, nos outros, o gosto da fumaça líquida predomina”. A exemplo do Bacon Paradise, foi só depois de ampliar a capacidade de atendimento que a casa deixou de usar o bacon industrializado.



FÁCIL “Não é difícil fazer bacon”, diz Haroldo Eustáquio da Silva, fundador da Frios Delícia. Ele está no ramo há quase 40 anos e há cerca de 20 produz bacon em sua fábrica, no Carlos Prates. Um dos pontos principais do processo, explica, é a escolha e tratamento da madeira usada na defumação, que dura 48 horas. “Tem de ser serragem de madeira dura e não resinosa e ela precisa estar parcialmente úmida para que o vapor entranhe melhor na carne”, afirma ele.

Atualmente, são cerca de 500 quilos de bacon produzidos por mês, vendidos não só para hamburguerias (como Eddie, J’s e a recém-aberta The Taste), mas também para bares, pizzarias e creperias da capital mineira. Entretanto, são as casas de sanduíche as responsáveis por aumentar a demanda nos últimos anos, confirma a filha de Silva, a engenheira de alimentos Bárbara Abucater, que trabalha com o pai na fábrica. “Essas casas querem bacon mais carnudo”, conta ela.

“Fazer bacon é mais fácil que andar para a frente. Parece um grande mistério, mas qualquer um pode fazer. Há receita e é preciso ter paciência. Mais nada”, resume o pesquisador gastronômico Eduardo Maya. Ele produz para consumo próprio e, ocasionalmente, nas aulas que ministra em sua cozinha profissional, na Savassi. Maya diz que dá para fazer em casa temperando barriga de porco com sal fino, sal de cura e açúcar mascavo e guardando-a num saco plástico fechado a vácuo, virado diariamente na geladeira por cinco dias, com peso por cima.

Feito isso, diz o pesquisador, é lavar e secar a peça, pronta para ser fatiada e frita. A defumação, acrescenta, é opcional. Entre as vantagens do bacon caseiro, defende, está a textura: “Ele fica durinho e o sabor é mais suave, sem aquele defumado muito forte”.

Outras harmonias

“Bacon dá sabor em tudo”, afirma Juliano Caldeira, proprietário do bar Rima dos Sabores, no Prado. Se está animado, ele mesmo produz. Do contrário, compra de fornecedores locais. Caldeira usa bacon em petiscos, sanduíches e até em sorvete, que vai à mesa com joelho de porco. “Também sirvo puro para os que me pedem”, diz ele. Ao sorvete de creme, acrescenta bacon frito no açúcar mascavo, creme de leite, fumaça líquida e bacon em pó.

Já a confeiteira Carolina Fernandes, da Xocolatl, dedica parte da sua produção a guloseimas que combinam chocolate e bacon. O destaque fica por conta das tiras assadas parcialmente mergulhadas em chocolate belga – durante a Páscoa, ela também faz ovo com recheio cremoso à base dos dois ingredientes. “O bacon harmoniza bem com chocolate, principalmente o ao leite. O sal equilibra o doce e traz untuosidade, além de dar crocância”, diz. Ela gosta de combinar esses doces com cervejas do estilo rauchbier, de sabor defumado.

Para este Natal, o chef Zito Cavalcante, do restaurante itinerante A Panela, apostou em fornadas de panetone, mas não o comum, pois o dele é salgado e teve bacon. A produção, coincidentemente, também está associada à cerveja: a massa leva bagaço de malte de cevada (que resta da produção da bebida), além de pedaços de bacon frito e queijo canastra. “Para os que estão cansados das frutas cristalizadas, pensei em substituí-lás por ingredientes de maior aceitação, e bacon e queijo são imbatíveis”, avalia. 

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