Mesa Tendências chega ao fim com palestras de chefs brasileiros e do francês Michel Bras

Evento lotado celebrou conexão entre produtores familiares e a alta grastronomia

por Eduardo Tristão Girão 06/11/2014 20:33
Adriano Bellagente/Divulgação
O chef Onildo Rocha (restaurante Roccia) e os produtores Sebastião Simões Filho (legumes) e Joaquim Pereira Dantas (queijos de cabra) (foto: Adriano Bellagente/Divulgação)
São Paulo — O último dia do congresso de gastronomia Mesa Tendências, nesta quarta-feira, 5, em São Paulo, foi marcado por palestras interessantes de chefs brasileiros e pela fala do chef francês Michel Bras, do estrelado restaurante Bras, que esteve pela primeira vez no Brasil. Ele atraiu público suficiente para lotar o teatro do Centro Universitário Senac, espaço que comportou essa e outras dicussões em torno do tema “Conexão essencial: o produtor familiar e a cozinha” desde segunda-feira.

“Minha região, Aveyron, é muito pouco habitada e, para dar certo na vida, era preciso ir à Paris. Quem ficava para trás eram pessoas não muito valorizadas. Eu tinha outra leitura dessa região, era um lugar para me expressar de corpo e alma. Ser cozinheiro é um ato de fé, cozinhar é amar o produtor, respeitar o consumidor. É um ato de amor. Não concebo minha função sem o produtor”, declarou Bras.

O chef revelou detalhes de seu processo criativo utilizando como exemplo um de seus pratos mais conhecidos, o gargouillou, no qual reúne vários legumes, frutas e folhas da estação (sempre colhidos novos) numa montagem que impressiona pela beleza. “Esse prato é o resultado da visão que tive de um planalto da minha região durante as corridas que faço. Traduzi pela receita aquele momento de vitalidade. Um gargouillou nunca é igual ao outro. Isso é o corpo a corpo diário com o ingrediente”, explica.

Bras acrescenta que, para seguir inventando na cozinha, tem o hábito de manter caderno para desenhar e registrar palavras. “Há receitas que nascem do diálogo de com paisagens. É o trabalho mais lindo do mundo”, diz. O francês chegou a São Paulo no fim de semana passado e visitou vários restaurantes da cidade, cuja cena gastronômica lhe deixou boa impressão: “Vocês têm possibilidades inimagináveis aqui. Faz poucos dias que estou aqui e descobri sabores incríveis. Fiquem orgulhosos dos seus cozinheiros”.

Ainda entre os estrangeiros que marcaram presença no encerramento do congresso, destaque para Michelangelo Cestari e Kamila Seidler, respectivamente diretor e chef do restaurante Gustu, em La Paz, que trabalha exclusivamente com produtos bolivianos em pratos modernos - tem até vinho local no cardápio. A casa integra projeto maior, que engloba formação profissional e capacitação de quem trabalha com comida de rua, chamando a atenção para um país ainda pouco notado do ponto de vista gastronômico.

“Quando cheguei à Bolívia, conheci ingredientes como óleo de palmeira e mel fermentado e pensei: ‘O que está acontecendo? Por que ninguém nunca me falou disso?’. Lá existem 3,6 mil tipos de batatas, por que usar apenas dois? É preciso dar valor já ao que esses produtores podem nos dar e não ficar exigindo cenouras padronizadas”, defende Kamila, que é dinamarquesa. No palco, ela preparou receita com batatas de aparência improvável para o brasileiro - uma rosa, outra roxa e uma variedade desidratada.

Queijo
O chef paraibano Onildo Rocha, do restaurante Roccia, em João Pessoa, protagonizou um dos momentos mais emocionantes do evento ao trazer para o palco dois de seus fornecedores, Sebastião Simões (legumes orgânicos) e Joaquim Vilar (queijos de cabra). Do primeiro, Rocha compra itens como batata doce e cenoura, o que aumentou a renda do produtor em cerca de 25%. “Voltei para a roça, de onde nunca deveria ter saído. Me acho o máximo. Sou agricultor, tenho quatro filhos formados e o mais novo vai fazer agronomia, pois quer seguir meus passos”, declarou Simões.

O repórter viajou a convite da organização do evento.

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