Marmelo é considerado fruto exótico e desconhecido pela grande maioria da população

por Patrícia Crespo 03/03/2013 09:32
Leandro Curi/EM/DA Press
(foto: Leandro Curi/EM/DA Press)
Fui criada com marmelada na mesa. Quando era criança pequena, lá em Barbacena, não faltavam na despensa da minha casa a cobiçada dupla das latinhas, uma de goiabada e outra de marmelada, geralmente das marcas Peixe ou Cica, abertas, para nossa alegria, ao final das refeições. Sabores de outros tempos, que nem a memória nem o paladar esquecem. Minha mãe recorda que gostava de degustar pedacinhos de marmelada com algumas gotas de limão na companhia de um queijo de minas bem fresco, quase sem sal. Mas eu gostava do doce de cor dourada, puro mesmo, sem acompanhamentos.

Doces industrializados eram caros e raros de ser encontrados, mas a dupla amarelinha e vermelhinha sempre teve preços acessíveis, agradando do mais simples aos mais exigentes paladares, que na falta de um original marrom glacê (feito de castanhas portuguesas) se contentavam com a marmelada. E foi assim que surgiu a expressão: é marmelada, normalmente utilizada para designar algo que sugere treta, trapaça ou enganação. Apesar de apreciar o doce de origem francesa, nunca comi marmelada achando que era outro coisa. O gosto azedinho dos marmelos o seu perfume muito semelhante ao das peras é muito diferente do sabor amanteigado da iguaria francesa.

Registros históricos confirmam o consumo de marmelos pelos gregos da Antiguidade. Na cidade de Kydonia, hoje em dia denominada Chania, situada na Ilha de Creta, na Grécia, ainda se colhem os mais saborosos e os maiores frutos da espécie. Deve ser de lá a origem de seu nome científico: Cydonia oblonga, mas por toda Europa e alguns países árabes os pomos são cercados de lendas e receitas saborosas.

O fruto do marmeleiro é muito rico em pectina e por isso mesmo é um ótimo ingrediente para se fazerem geleias e compotas e marmeladas preparadas mundo a fora. Na Espanha, o doce é conhecido como membrillo e apreciado na companhia do tradicinal queijo manchego. Na França a pasta de marmelos leva o nome de cotignac. Mas nem só de marmelada vivem os marmelos no Velho Mundo. Por lá, receitas variadas utilizam a fruta perfumada. Assados, fritos ou grelhados, combinam seu sabor suave e adstringente com aves, carneiros ou vitelas. Na cozinha marroquina, é ingrediente indispensável no preparo dos tradicionais tagines.

Trazidos para o Brasil pelos colonizadores portugueses, os marmeleiros se adaptaram ao clima da antiga Capitania de São Vicente, onde hoje se localiza a Serra da Mantiqueira. Em 1930, a marmelada chegou a ser o doce industrializado mais consumido no país. Naquela época, o doce fabricado pela confeitaria Colombo, no Rio de Janeiro, circulava pelas mesas mais nobres da capital carioca. Atualmente, existe uma pequena produção de marmelo nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Goiás, Bahia, São Paulo e Espírito Santo. Mas apesar dessa relativa difusão geográfica, apenas a produção mineira é comercialmente importante e a cidade de São Sebastião do Paraíso, no Sul de Minas, é considerada a capital do marmelo.

Com certo saudosismo culinário, preparei para esta edição uma crostata de marmelos. Com muita dificuldade encontrei uma marmelada feita com a fruta, pois a grande maioria do doce que se encontra nos mercados é feita, pasmem, com chuchu. A receita é simples se feita com pasta já pronta. Mas fazer uma conserva de marmelos é um ótimo programa para este final de verão. Basta cortá-los em quartos e cozê-los com o mesmo peso de açúcar e água somente para cobri-los. Leva um tempinho para ficar pronto, mas a tarefa de mexer o doce será lazer quando o maravilhoso aroma dos marmelos invadir sua cozinha e a do vizinho.

Crostata de marmelada

Ingredientes:


380g de farinha de trigo, 160g de manteiga, 3 ovos, 200g de pasta de marmelada

Modo de preparo

Misture levemente a farinha, a manteiga e os ovos até a completa homogeneização da massa. Divida em duas partes iguais. Faça duas bolas. Embale com papel filme e leve à geladeira por 30 minutos. Forre o fundo e
3cm das laterais de uma assadeira de fundo removível com uma das bolas de massa. Cubra com a pasta de marmelos. Abra a outra parte da massa entre plásticos, até obter um retângulo de 0,5cm de espessura. Corte tiras e cubra a crostata. Leve ao forno pré aquecido por aproximadamente 30 minutos.

*Patrícia Crespo é formada em Jornalismo pela Puc-Minas e em gastronomia Pela Estácio de Sá

MAIS SOBRE GASTRONOMIA