Bienal de São Paulo em BH tem recorde de representação de mulheres

Na mostra em BH, três brasileiras exploram linguagens diversas

por Mariana Peixoto 11/03/2017 20:03

Dos 19 artistas que compõem o recorte da 32ª Bienal de Arte de São Paulo: Incerteza viva, em cartaz nas galerias do Palácio das Artes, 12 são mulheres. Três delas brasileiras, com obras em suportes bem distintos. A videoinstalação Estás vendo coisas, de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca, que ocupa a Galeria Genesco Murta e a Grande Galeria, principal espaço expositivo da instituição, traz séries de duas delas: Cotidiano, de Wilma Martins, e Espetáculo, de Ana Mazzei.
Bárbara Wagner e Benjamin de Burca/Divulgação
Bárbara Wagner e Benjamin de Burca/Divulgação (foto: Bárbara Wagner e Benjamin de Burca/Divulgação)

Radicada no Rio de Janeiro desde a década de 1960, a belo-horizontina Wilma Martins retorna à cidade três anos após uma grande retrospectiva na Galeria do Minas Tênis Clube. Infelizmente, o recorte mineiro da bienal não incluiu o único trabalho inédito da artista, Dona Marta 24 horas, que reúne 24 imagens (uma para cada hora do dia) do Morro Dona Marta, paisagem onipresente na casa da artista, em Santa Teresa. “A pedra está na minha frente há quase 30 anos, então virou obsessão”, comenta Wilma, que trabalhou diariamente, durante dois meses, até terminar a obra, criada para a exposição.

Não foi fácil, sobretudo por sua saúde debilitada, o que a fez produzir cada vez menos com o avanço da idade – completou 83 anos no mês passado. A série que está no Palácio das Artes, sete telas, reúne pinturas realizadas a partir da década de 1970.

O trabalho revela o dia a dia da artista, daí o título da série. Uma tela traz uma floresta crescendo em meio à pia do banheiro; outra, um céu criado a partir do vapor da panela de pressão. A cor vem sempre do objeto estranho àquele ambiente, que por seu lado exibe diferentes tons de cinza.

Até a bienal de 2016, Wilma só havia participado da edição de 1967 do evento paulistano. “Achei gozado quando me convidaram, pois nem pensava mais nisso. Concursos e salões estão acabando, antigamente havia muito mais”, acrescenta ela, que pensa em um novo trabalho. Novamente, a partir do olhar de seu próprio universo. “Estou pensando em fazer um inventário das plantas que estão à minha volta. É uma coisa meio inspirada naqueles viajantes botânicos, ainda estou amadurecendo na cabeça.”

PALCO Espetáculo, da paulistana Ana Mazzei, é a obra com o maior número de peças na exposição. São 77 objetos, três a menos do que na montagem original, em São Paulo. Na instalação, a artista construiu esculturas com formas que remetem à ciência e à astrologia. O título da instalação, Espetáculo, dialoga com esse conceito. “Tem relação com a frontalidade, do espectador que se coloca em frente a ele.”

“São objetos escultóricos, desenhados um a um, já pensando no conjunto maior. É uma obra relacionada com proporção e composição”, diz Ana Mazzei. Há quem faça relação da instalação com o teatro. “Isso porque o teatro vem da ideia da construção de realidade, de recriar uma situação que é muito associada à ficção. Como tenho um contexto demarcado, um espaço definido, ele é como um palco.”

BREGA Na parte inferior do Palácio das Artes está exposta a videoinstalação Estás vendo coisas, de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca. Os dois realizadores, radicados no Recife, exploram no trabalho o universo da música brega. Com 16 minutos, o vídeo foi também finalizado para cinema. Sua estreia no meio cinematográfico foi na competitiva de curtas-metragens do Festival de Berlim.

“Não é um trabalho somente sobre a estética da música, mas um olhar sobre essa nova economia a partir de jovens da periferia do Recife. É algo como o que acontece com o funk no Rio de Janeiro e o arrocha na Bahia”, comenta Bárbara, que queria mostrar como “economia e cultura estão estreitamente relacionadas”.

O título Estás vendo coisas foi tirado de uma música da banda de brega Vício Louco. Mesmo documentando personagens reais, a estrutura narrativa é quase ficcional, fazendo do vídeo um híbrido. Em cena, 10 artistas do brega são filmados na boate Planeta Show. Há dois protagonistas: o MC Porck e a cantora Dayana Paixão. De dia, ele é cabeleireiro e ela, bombeira.

“Com eles mostramos também a inversão de papéis, discutimos a questão de gênero. Como atuam em dois ‘mundos’, mostram como trabalhar com cultura é uma condição precária.” O vídeo busca ainda mostrar um outro lado do brega, nada colorido, feliz e musical como sugerem os vídeos no YouTube. “É um trabalho com um tom melancólico, inclusive com muitos silêncios”, completa Bárbara.

32ª BIENAL DE ARTE DE SÃO PAULO: INCERTEZA VIVA


Galerias do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. De terça-feira a sábado, das 9h30 às 21h; domingo, das 16h às 21h. Entrada franca. Até 23 de abril.

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