Miguel Nicolelis lança o livro 'Made in Macaíba'

Obra relata a criação de um centro de referência científica mundial em Alagoas

por Walter Sebastião 25/02/2016 08:00
Paulo Whitaker/Reuters 2013 21/5/14
(foto: Paulo Whitaker/Reuters 2013 21/5/14 )

Quem chega a Belo Horizonte para lançar o livro Made in Macaíba – A história da criação de uma utopia científico-social no ex-império dos Tapuia (Editora Crítica) é o paulista Miguel Nicolelis. O lançamento faz parte do programa Sempre um Papo e ocorre hoje, às 19h30, no auditório da Cemig. Médico com trânsito internacional, trabalhando com neurobiologia, engenharia biomédica e psicologia, ele se tornou respeitado cientista pelas pesquisas com interfaces cérebro-máquina. São sistemas híbridos que, por meio de sensores externos, permitem usar a atividade elétrica do cérebro para controlar movimentos de braços ou pernas robóticos, exoesqueletos etc. Foi usando essa tecnologia que um paraplégico brasileiro, Juliano Pinto, executou um chute na abertura da Copa do Mundo de Futebol de 2014.


O novo livro de Nicolelis traz narrativa apaixonada do trabalho voluntário ao qual o cientista vem se dedicando há 13 anos: a implantação do Câmpus do Cérebro em Macaíba, subúrbio de Natal (RGN). O empreendimento reúne, numa mesma área, o Instituto Internacional de Neurociência Edmond e Lily Safra (com todo o suporte para pesquisa), duas escolas para jovens (uma terceira já está em fase de construção) e um hospital. A infraestrutura é voltada para apoio e desenvolvimento de pesquisas, mas também articulam ideais do educador Paulo Freire e do inventor Santos Dumont. Assim, cria, em áreas carentes, contexto que incentiva o cultivo da educação com fundamento científico, a formação de cientistas e a afirmação da importância da cultura de pesquisa.

No Câmpus do Cérebro, o momento atual é de ampliação das atividades. A instituição prevê a abertura de 30 laboratórios e a criação do programa de graduação (que já tem mestrado e, agora, se volta para implantação de doutorado) em área de estudo que não existe no Brasil: a neuroengenharia, fusão da neurociência com a engenharia mecânica. O sonho, explica o professor, é que o local atraia talentos e se torne referência, “um legado como projeto educacional e científico”, para o Brasil e o mundo. “E, com relação à pesquisa na área de interfaces cérebro-máquina, eu me daria por satisfeito se ela se transformasse em terapias para moléstias neurológicas. É meta ambiciosa. Há moléstias como mal de Parkinson, paralisias e epilepsia que não têm tratamento”, recorda.


“Meu livro é mensagem de esperança sobre o potencial humano do Brasil. Conseguimos transformar o que parecia uma utopia em realidade. Estamos mostrando que é possível o empreendedorismo científico no Brasil”, afirma Nicolelis. O livro comemora os feitos realizados, mas também traz os relatos das agruras ao enfrentar  burocracias, descrença, tentativas de manipulação, luta por recursos. “Mas, apesar dos problemas, estabelecemos a ideia de que a ciência pode ser agente de transformação social e a educação como alavanca para a melhoria da qualidade de vida e desenvolvimento da região”, conta. O que só foi possível, frisa, pelo engajamento de cientistas de todo o mundo, educadores, população local, agentes públicos e privados na empreitada.

Em 2004, a revista americana Scientific American elegeu Miguel Nicolelis um dos 25 cientistas mais importantes do mundo. Em 2015, a revista Foreign Policy o apontou como um dos seus 100 pensadores globais. Reverências que não impressionam o paulista. “São juízos subjetivos e de certos grupos. O que me importa são as coisas concretas. Por isso sou cientista”, afirma. O Brasil, explica, tem uma história na área científica, que teria como fundadores o aeronauta e inventor Santos Dumont (1873-1932) e os médicos Oswaldo Cruz (1872-1917) e Carlos Chagas (1879-1934). “Há espaço e talento para o país crescer na área, mas precisa de apoio de forma a ampliar nossa posição ”, avisa.


“Recursos são essenciais para o desenvolvimento científico no Brasil, mas o fundamental é que tenhamos, como nação, uma política permanente para o setor”, acrescenta Nicolelis. “Países que não dominam a pesquisa científica vão perder a soberania”, avisa. “A ciência está no nosso cotidiano”, explica, observando que a modernidade só fez acirrar tal presença. “Ela é essencial para a melhoria da qualidade de vida. Pode nos ajudar na cura de doenças, a produzir mais alimentos, a enfrentar os problemas trazidos pelas mudanças climáticas. Ou seja: a ciência pode contribuir para todos os processos essenciais para a sobrevivência da vida no planeta”, argumenta. “Até para enfrentar o zika vírus e o da dengue precisamos de uma base científica”, observa.

 

NO TOPO
Miguel Nicolelis nasceu em São Paulo, fez medicina e doutorado na Universidade de São Paulo, e pós-doutorado na Hahnemann University da Filadélfia (EUA). Desde 1994, trabalha na Duke University, onde é professor nos departamentos de neurobiologia, engenharia biomédica e psicologia. Em 2001, fundou o Centro de Neuroengenharia da Duke, o qual dirige até hoje. Membro das academias Francesa, do Vaticano e Brasileira de Ciências, Nicolelis recebeu mais de 30 prêmios internacionais. Com John Chapin, foi o idealizador da interface cérebro-máquina. O primeiro livro dele, Muito além do nosso eu, foi traduzido em 10 línguas. Há, ainda, quem considere o cientista o brasileiro mais próximo do Prêmio Nobel. O cientista adora futebol e é, declaradamente, devoto do Palmeiras.

 

SEMPRE UM PAPO
Lançamento do livro Made in Macaíba – a história da criação de uma utopia científico-social no ex-império dos Tapuia, de Miguel Nicolelis. Hoje, às 19h30, Auditório da Cemig, Avenida Barbacena, 1.200, Santo Agostinho, (31) 3261-1501. Entrada franca.

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