Marco Paulo Rolla investiga como a burocracia invade o homem contemporâneo

Artista evidencia a fragilidade de personagens que se confundem com o espaço onde estão

por Walter Sebastião 20/02/2016 08:00
Inácio Ribeiro/divulgação
Uma canção na vitrola é parte da série Homens de preto, que o artista realiza desde janeiro, no Memorial Minas Gerais Vale (foto: Inácio Ribeiro/divulgação)

O mineiro Marco Paulo Rolla, de 49 anos, já tem quase três décadas de atividades. Ao longo deste tempo, apresentou, nas muitas exposições que realizou, fluência entre vários meios. Nos últimos anos, tem enfatizado a performance, depois de temporadas dedicadas ao desenho, à pintura e à gravura. Hoje, às 15h, ele apresenta, no Memorial Minas Gerais Vale, a performance Uma canção na vitrola. O trabalho é parte uma de série de proposições que vem apresentando desde janeiro. O projeto se encerra, no próximo fim de semana, com apresentação, às 18h, de Volumetrias.

Uma canção na vitrola é parte da série Homens de preto, que Marco Paulo desenvolve desde 2010 e é voltada para a interpelação do burocrático. Esse universo é expresso através de seres “entre a máquina de escrever e o vigia”, mas também outros tipos que habitam “os órgãos públicos”. A peça registra o momento em que a criatura (de preto e com máscara) perde o controle de um toca-discos. Distorções sonoras abrem espaço para “sentimentos melancólicos, de falência do sistema”. A trilha é produzida pelo próprio artista, que atua como DJ, a partir de gravações de uma cantora popular (dos anos 1950 e 1960).

A performance, para Marco Paulo, evidencia a fragilidade de personagens que se confundem com o espaço onde estão. É a primeira vez que o artista trabalha com um personagem. A partir da interação com o espaço no entorno, ele cria situações que podem ser completamente improvisadas, mas, no geral, têm um roteiro. A despreocupação com planejamento, observa o artista, vem do fato de ele ser familiarizado com o procedimento. “Já fiz performances com estruturas muito desenhadas, mas gosto do modo como a improvisação dá sentido ao momento vivido”, justifica.
Marcus David/divulgação
Volumetrias, que será apresentada no próximo sábado, encerra o ciclo (foto: Marcus David/divulgação)

“O corpo humano em movimento ou, talvez, como meio para a vivência do presente, oferecido como imagem para o outro refletir, está em tudo que fiz”, observa, evitando dar centralidade à performance. “Vou de um meio a outro sem ficar categorizando o que faço. Não fico arregimentando formas de fazer arte, nem metodizando”, afirma. “Toco acordeom desde os 13 anos e ele é tão instrumento para a minha arte como a pintura”, afirma. Trata-se de ação em contexto intermídia, colocando em diálogo meios diferentes, ‘‘observando como a forma organiza a criação artística”, conta.

Esse perfil multimídia vem da formação muito ligada às artes cênicas e à música. A última, recorda, desde criança. Trabalhou inclusive em parceria com o compositor Eduardo Álvares (1959-2013), com quem realizou performances antológicas, ainda nos anos 1990. “Ele me ensinou a riqueza de se jogar na experiência sem ficar preocupado em definir o trabalho”, recorda.

Independentemente dos meios utilizados, tem sido recorrente a discussão sobre a existência, valores humanos e análise de imagens que são produto de visões “muito pré-moldadas” da sociedade. “Meu pensamento artístico não é um partido, vem de sentimento sobre a vida hoje”, avisa Marco Paulo Rolla. Mais trabalhos da série Homens de negro estão sendo apresentados em vídeos projetados no cibercafé do Memorial Minas Gerais Vale.

O artista mineiro integrou o grupo de 20 criadores, selecionados pela sérvia Marina Abramovich, uma das mais importantes performers do mundo, para seminário realizado por ela, em São Paulo, durante retrospectiva dela no Brasil. “Foi experiência que acrescentou muito ao trabalhar modos de você se colocar por inteiro e de modo verdadeiro numa situação”, recorda, referindo-se a exercícios físicos e psíquicos propostos pela artista. Marina Abramovich cobrou dos participantes imersão total na atividade – de jejuar a ficar sem falar por cinco dias, comunicando-se por mímica. “Ela é artista com carreira longa, que continua desenvolvendo sua arte de forma muito inteligente”, elogia.

PERFIL ECLÉTICO

Marco Paulo Rolla tem 49 anos, vive e trabalha em Belo Horizonte. É formado pela Escola de Belas Artes da UFMG. Tem realizado exposições individuais e participado de mostras coletivas em galerias e museus tanto do Brasil como no exterior: Museu de Arte Moderna da Bahia, Instituto Tomie Othake (SP), Palácio das Artes (MG), Museu de Arte Contemporânea de Goiânia, Museu Lasar Segall (SP) e Museu de Arte Moderna de São Paulo, entre outros. Participou da Bienal Internacional de Curitiba (PR), da 8ª Bienal do Mercosul (RS), do 32º Panorama da Arte Brasileira, da 29º Bienal de São Paulo, da 9ª Mostra do Filme Livre (CCBB/RJ) e da Bienal de Liverpool.

Uma canção na vitrola
Performance de Marco Paulo Rolla, parte da programação da exposição Cama, mesa e escada. Hoje, às 15h. Memorial Minas Gerais Vale, Praça da Liberdade, 640, Funcionários. Exposição: terças, quartas, sextas e sábados, das 10h às 17h30; quintas, das 10h às 21h30; domingos, das 10h às 15h30. Entrada franca. No próximo dia 25, às 18h, será apresentada a performance Volumetrias.

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