A história trata de amor, poder e ódio entre famílias rivais. O diretor gostaria de ter na plateia inclusive “o pessoal que fica no Face, Twitter e WhatsApp”. Por isso, a montagem busca declaradamente uma visão contemporânea para o gênero. Primeiro, destacando o que existe de atemporal no enredo. Na opinião do diretor, é a história de jovens que herdam o ódio de suas famílias, o que termina por destruir suas vidas. Depois, com figurinos que evocam diversas épocas, criando um “baile macabro” no diálogo com um cenário em ruínas.
A direção procurou valorizar deslocamentos da ambientação, a sensualidade, entrelinhas do texto e uma interpretação mais visceral, porque, segundo defende Heller, há muita beleza na imperfeição, no atrito, na aresta. Ele se inspira nas montagens operísticas alemãs, que incorporam elementos vanguardistas. “É teatro de conceito mais do que simplesmente contar uma história”, observa. “Buscando algo menos convencional, cheguei à história apaixonante que coloca questões eternas. O que está por trás do enredo é a história de uma geração perdida, que poderia ser a dos jovens dos anos 1960. A história dos que lutaram contra as ditaduras na América Latina. Pessoas que tinham sonhos, que acreditavam num mundo novo e foram trituradas por uma sociedade apodrecida.”
O diretor frisa que a ópera de Domizetti é feita para grandes vozes e impõe grandes desafios aos intérpretes. Esse é o quarto trabalho do diretor em Belo Horizonte. Ele assinou a direção de Andrea Chénier (2010), Nabucco (2011) e Rigoletto (2014).
REINVENÇÃO “A ópera está sendo reinventada no Brasil”, afirma Heller, acrescentando que o movimento renovador do gênero atinge hoje toda a América Latina. Na avaliação do diretor, “uma geração de cantores incríveis” favorece o trabalho dos encenadores. A existência desses intérpretes, diz, “colabora para que o público deixe de lado a ideia boboca de que só o artista ou a produção estrangeiros são bons. Pagam-se cachês altíssimos a cantores europeus de segunda por considerar isso chique”, critica.
Para Heller, “em comparação com as montagens norte-americanos e europeias, somos mais viscerais e menos tradicionalistas e estamos começando a entender que o Brasil e a América Latina têm algo a dizer com a ópera”. O que falta, de acordo com ele, é “oferecer mais oportunidade aos compositores”, já que encomendas de óperas ainda são raras. André Heller é carioca, tem 44 anos, é professor do Departamento de Canto da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É formado em teatro e canto, com mestrado em história – sobre cantores brasileiros entre 1844 e 1852 – e doutorado sobre o nascimento da ópera no país. “Pensei que ia ser cantor, mas, em determinado momento, me vi ensinando interpretação. E descobri que era mais útil nessa atividade. Opera é paixão, você tem de viver para ela com humildade maior do que ego, compreendendo de que maneira pode servir melhor.”
Lucia Di Lammermoor
Ópera de Gaetano Donizetti. Direção cênica de André Heller e regência musical de Sílvio Viegas. Com Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, Coral Lírico de Minas e Jaquelina Livieri, Eric Herrero, Leonardo Neiva, Murilo Neves, Santiago Ballerini, Aline Lobão, Mateus Pompeu Normanno. Nesta terça-feira e dias 16, 18 e 20, às 20h; dia 22, às 19h, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3263-7400). ngressos: R$ 50 e R$ 25.