'Expoprojeção 73' visita primórdios da arte em trabalhos audiovisuais no Brasil

Com abertura nesta terça-feira, 22, exposição recupera panorama do trabalho de artistas visionários

por Walter Sebastião 21/04/2014 14:02

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Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press
Para levar adiante suas pesquisas sobre multimídia e videoarte, o curador Roberto Moreira decidu remontar exposição realizada há mais de 40 anos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Hoje é comum a presença de vídeos e fotos nas exposições, e essas linguagens são quase sinônimo de arte contemporânea. Mas até o início dos anos 1970, a situação era outra. O vídeo sequer existia ou era de difícil acesso, e persistia a questão: fotografia é arte?. Os primórdios da mudança desse contexto, vistos por meio de criações com recursos audiovisuais, estão na mostra Expoprojeção 73, com curadoria de Roberto Moreira Cruz e Aracy Amaral, que vai ser aberta amanhã, no Centro de Fotografia e Arte Contemporânea, em Belo Horizonte. É a remontagem da primeira exposição brasileira dedicada à questão. Apresenta artistas que trabalham com papel, tela ou tridimensional, experimentando novas mídias.

“O objetivo da mostra é recuperar um trabalho visionário de Aracy Amaral”, afirma Roberto Moreira, idealizador do projeto. A reverência vem de um mineiro radicado em São Paulo, talvez o mais importante curador brasileiro de videoarte, com mais de duas décadas de pesquisa, já tendo organizado mostras essenciais sobre a prática (como Black&White, em parceria com Daniela Azzi, apresentada em Belo Horizonte). Aracy Amaral é historiadora e curadora cujas realizações são contínua reflexão sobre as relações entre arte, cultura e sociedade. É ainda autora de três livros – sobre Marcos, Benjamim, Fernando Lucchesi e José Bento, editados pela C/Arte – que oferecem reflexão acurada sobre a arte feita em Minas Gerais.

Os trabalhos que vão ser mostrados, explica Moreira, têm perfis diferentes. Há os que têm o frescor da contracultura e do desbunde dos anos 1970, quase só deleite de ter uma filmadora, como registra Aracy Amaral no catálogo. Há registros de performances e trabalhos conceituais interpelando as convenções da arte. E também expressões sociopolíticas, algumas, inclusive, censuradas – o início dos 1970 é momento fortemente repressivo da ditadura civil-militar –, que são mais ação anárquica do que propriamente arte engajada. O que se vê, argumenta o curador, são artistas procurando realizar arte própria para o meio que usam, trabalhando com as tecnologias às quais tinham acesso.
Centro de Arte e Fotografia/Divulgação
'Construção e jogo', audiovisual de Anna Maria Maiolino (foto: Centro de Arte e Fotografia/Divulgação )


História A exposição, conta Roberto Moreira, surgiu durante pesquisa de doutorado sobre o vídeo e a arte que trabalha com imagens em movimento, que o levou a deter-se na questão do audiovisual. Nesse percurso, chegou à Expoprojeção, de 1973, mostra praticamente desconhecida, que havia reunido uma centena de trabalhos. Veio então a ideia de remontar a exposição. Ao procurar Aracy Amaral para apresentar o projeto, Roberto não só foi bem recebido pela curadora como teve uma boa surpresa: ela tinha um arquivo completo sobre a exposição, inclusive cerca de 80 cartas trocadas com os artistas ao organizar a mostra.

Localizar as trabalhos foi um desafio. “Eram obras de artistas iniciantes, arte conceitual em época que havia contexto para mostrar essas produções, vistas por amigos dos artistas ou em salões de arte”, conta Roberto. Muito foi perdido, e há recorrentes notícias de roubos. A pesquisa conseguiu recuperar 65% do material da mostra de 1973.
Nas telas estão a experimentação formal que, pela espontaneidade e liberdade de realização, soa como “primeira idade” de uma arte que ainda não tem um passado. “A arte contemporânea deve muito ao que foi feito naquele momento”, garante o curador. Na exposição, em São Paulo, o projeto ganhou um segundo setor a mais, uma espécie de “antologia resumida” do que foi realizado posteriormente na mesma linha, de 1974 aos dias atuais.
 
Cidade

“Levei um susto quando vi meu trabalho ao lado de artistas como Cildo Meireles. Quando fiz os audiovisuais era muito nova, e quando a gente é jovem não olha para quem está expondo ao seu lado”, brinca a fotógrafa mineira Beatriz Dantas. Está na exposição seu primeiro audiovisual, Terra (1971), premiado no Salão de Arte da Prefeitura de Belo Horizonte. “É a minha primeira aventura fotográfica”, conta. A obra foi concebida como narrativa com slides que, por sugestão do crítico Márcio Sampaio, ganhou som e foi inscrita no salão (um ano antes, Frederico Morais tinha sido premiado com trabalho no mesmo formato). A sequência inicial, explica Beatriz Dantas, traz um trabalho conceitual do artista Luiz Eduardo Fonseca.

Centro de Arte e Fotografia/Divulgação
'Circumambulatio', audivovisual de Anna Bella Geiger (foto: Centro de Arte e Fotografia/Divulgação )

“A Expoprojeção foi importante. Mostrou o audiovisual como nova linguagem das artes visuais. Foi a partir dos audiovisuais que a fotografia começou a ser premiada nos salões de arte”, recorda Beatriz Dantas. O audiovisual, para ela, revela interesse dos artistas pela estética multimídia, que soma fotografia, música e cinema. Linguagens que, segundo observa, fazem parte do ambiente cultural de Belo Horizonte, onde têm forte expressão.

“O fascinante é ser sequência de imagens estáticas, que permitem que, entre uma e outra, o espectador vá criando suas interpretações”, avalia Beatriz. Ela estima ter feito cerca de 10 audiovisuais entre 1971 e 1984. A maior parte está com ela. Matadouro, trabalho de 1972, levou a mineira à Bienal dos Jovens, em Paris, em 1973, uma das mostras mais importantes da época.
Centro de Arte e Fotografia/Divulgação
'Lama', audiovisual de Maurício Andrés Ribeiro (foto: Centro de Arte e Fotografia/Divulgação )

Expoprojeção 73 HOJE

. Abertura na terça-feira, 22 de abril, no Centro de Arte Contemporânea e Fotografia, Avenida Afonso Pena, 737, Centro, (31) 3236-7400. Terça a sábado, das 9h30 às 21h, domingo e feriado das 16h às 21h. Entrada franca. Até 1º de julho.
. Quarta-feira, às 19h30, na Sala Juvenal Dias do Palácio das Artes, está programado um encontro com Roberto Moreira e Aracy Amaral, curadores da exposição. Entrada gratuita.


A EXPOSIÇÃO

Expoprojeção 1973 recupera a primeira mostra no Brasil dedicada a trabalhos audiovisuais. Foi realizada em 1973, na sede do Grupo de Realizadores Independentes de Filmes Experimentais (Grife), em São Paulo, e apresentou mais de uma centena obras. Reúne trabalhos de 30 artistas que participaram da mostra, criados a partir de projeções de slides, super-8, filme 16mm e, dois deles, apenas com som. Jovens artistas de Belo Horizonte que participaram da mostra original, como Beatriz Dantas e Maurício Andrés Ribeiro, fizeram sucesso na exposição. O audiovisual era prática muito pesquisada em Belo Horizonte, por incentivo dos críticos Márcio Sampaio e Frederico Morais. A obra do mineiro George Helt está sendo apresentada com momentos em que a tela fica escura porque só foi encontrada a parte sonora e alguns slides. Estão na mostra filmes inéditos em super-8 de Raymundo Colares (1944-1986), artista mineiro com obra muito respeitada. Na abertura haverá reconstituição de happening do artista Luiz Alberto Pelegrini, intitulado 1973, com o artista projetando filmes em super-8 sobre slide, como fez por ocasião da inauguração da Expoprojeção original, há mais de 40 anos.

Centro de Arte e Fotografia/Divulgação
'Natureza', audiovisual de Luiz Alphonsus (foto: Centro de Arte e Fotografia/Divulgação )

OS ARTISTAS

Abrão Berman, Anna Bella Geiger, Anna Maria Maiolino, Antônio Dias, Antônio Manuel, Beatriz Dantas, Paulo Lemos, Carlos Vergara, Cildo Meireles, Cláudio Tozzi, Donato Ferrari, Frederico Morais, Gabriel Borba Filho, George Helt, Henrique Faulhaber, Iole de Freitas, Jorge Izar, Luiz Alberto Pelegrino, Luiz Alphonsus, Lygia Pape, Marcelo Nitsche, Mário Cravo Neto, Maurício Andrés Ribeiro, Maurício Fridman, Olívio Tavares de Araújo, Paulo Fogaça, Raymundo Colares, Rubens Gerschman, Saverio Castellano e Victor Knoll.

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