"Meu ofício não é publicar, mas escrever", declarou Gabriel García Márquez ao desmentir, em 2009, rumores de que teria abandonado a literatura. Em entrevista concedida ao jornal colombiano El Tiempo, o autor foi sucinto e enfático: "a única coisa certa é que não faço outra coisa senão escrever". Nascido na cidade de Aracataca, coração da região caribenha na Colômbia, o jornalista e escritor premiado com o Nobel dedicou mais de seis décadas dos seus 87 anos ao ofício. Morto nesta quinta-feira, 17, vítima de infecção respiratória, Gabo coroou a carreira em vida com a publicação em vida de 'Memórias de minhas putas tristes' (2004).
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Gabriel José García Márquez foi criado na casa dos avós maternos. O coronel Nicolas Márquez e Tranquilina Iguarán introduziram o menino no universo das fábulas e lendas – graças a eles, o futuro escritor despontaria como um dos talentos do realismo mágico. A família não o convenceu a concluir o curso de direito na Universidade Nacional de Bogotá. Gabo gostava, mesmo, era de escrever.
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Sua reportagem "Relato de um náufrago" mostrou um homem corajoso, de esquerda, que exerceu influência na vida cultural de seu país. Essa matéria desagradou o ditador Roja Pinillas, general que comandou a Colômbia de 1953 a 1957, depois de um golpe de Estado.
Márquez foi para a Europa, mas logo voltaria à América Latina: trabalhou na Venezuela e Cuba. E também em Nova York, a meca capitalista. Dirigiu a agência de notícias cubana Prensa Latina, que surgira sob influência da revolução comandada por Fidel Castro.
Em 1960, García Márquez se estabeleceu no México, onde começou a escrever roteiros para cinema. A literatura, porém, era um compromisso: o romance Ninguém escreve ao coronel foi lançado em 1961; O veneno da madrugada, um ano depois. O insight para sua obra-prima, 'Cem anos de solidão', veio em 1966. Na verdade, há anos ele alimentava ideias que culminaram nesse livro. O "chamado" fez com que o jornalista consagrado deixasse o emprego e se isolasse por 18 meses, enquanto a mulher, Mercedes Barcha, sustentava os dois filhos, Rodrigo e Gonzalo.
A saga da família Buendía e sua pequena Macondo se confunde com a história da América Latina, com seu monumental subdesenvolvimento entre revoluções, utopias e ditaduras. O best seller, comparado ao clássico Dom Quixote, vendeu mais de 50 milhões de cópias e fez de Gabo uma celebridade global. Lançado em 1967, Cem anos de solidão influenciou gerações de escritores e leitores.
Nos anos 1970, Márquez morou na Espanha, na Colômbia, no México e em Cuba. Acusado pelo governo de seu país de colaborar com a guerrilha, exilou-se no México. Em 1982, o Prêmio Nobel veio reconhecer uma trajetória dedicada às letras e à militância humanista.
O jornalismo, porém, estava no sangue do romancista: no fim da década de 1990, ele passou a dirigir a revista Cambio. Depois de 'Cem anos de solidão', Gabo lançou os elogiados 'Crônica de uma morte anunciada' e 'O amor nos tempos do cólera', além de 'O general em seu labirinto', 'Notícias de um sequestro' e 'Memórias de minhas putas tristes'.
Cinema
Brasileiros participaram ativamente de projetos cinematográficos ligados a Márquez. O longa 'Erendira' (1983) foi estrelado por Cláudia Ohana e dirigido pelo cineasta moçambicano Ruy Guerra, radicado no Brasil. Diva dos palcos verde-amarelos, Fernanda Montenegro se destacou na adaptação de 'O amor nos tempos do cólera' (2007), dirigido pelo inglês Mike Newell.