Lançamento de Jotabê Medeiros revela o mundo da música sob um ângulo inusitado

Em edição de 'O bisbilhoteiro das galáxias', o repórter tira do foco os lugares-comuns, que geralmente preenchem as linhas das reportagens ditas culturais

por Mariana Peixoto 26/02/2014 07:00

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Jotabê Medeiros/Reprodução
Iggy Pop no aeroporto, de meias e chinelos, esperando a chamada do voo (foto: Jotabê Medeiros/Reprodução)
Como fotógrafo, Jotabê Medeiros é um grande repórter. Suas imagens raramente têm foco, os cortes são estranhos, a luz sempre deixa a desejar. Mas foi a partir desses instantâneos descuidados que ele escreveu o livro 'O bisbilhoteiro das galáxias' (Editora Lazuli, 216 páginas, R$ 29,90), que compila 25 anos de jornalismo musical. Repórter e crítico de O Estado de S. Paulo, autor de uma análise que vai muito além do que é publicado na imprensa especializada, Jotabê escreveu 50 textos em tom de crônica que têm como protagonistas artistas que fazem parte de “um universo carente, delirante, messiânico”.

Nada do que está no livro foi publicado anteriormente na imprensa. O que Jotabê fez foi apresentar um novo olhar do que presenciou em suas matérias jornalísticas. As fotografias, que ele faz para consumo próprio, surgiram como ponto de partida dos relatos, sempre muito pessoais e informais. Deixa claro, por exemplo, sua predileção por Bob Dylan – que encontrou na rua, no Rio de Janeiro, em 2012, e resultou num texto impecável que, na época, foi compartilhado milhares de vezes nas redes sociais. Ou seu fraco interesse por figuras como o ator Jude Law e a banda MGMT.

Mas o que importa aqui é o olhar afiado, nada cínico, sobre um ambiente em que o cinismo impera. Jotabê tira do foco os lugares-comuns, que geralmente preenchem as linhas das reportagens ditas culturais, para ir além do que se vê. A partir de um encontro muitas vezes imprevisto – Iggy Pop de meias e chinelo de borracha esperando um voo –, reexamina o protagonista em uma crônica atual, nada datada, que poderá ser lida daqui a 10, 15 anos.

Muitos dos cenários em que o autor encontrou seus personagens foram festivais, shows e coletivas de imprensa. Há os encontros fortuitos – Patti Smith numa cantina em Nova York; Perry Farrell no Muro das Lamentações, em Jerusalém – e aqueles que ocorreram num solo totalmente diverso da chamada cultura pop. No texto dedicado a Zé Ramalho, um dos poucos brasileiros retratados no livro, ele está em Piritiba, interior da Bahia, em uma festa de São João em que o cantor e compositor não pretende dar as caras. O faro de repórter de Jotabê faz aquele (quase) caso de polícia se tornar uma crônica apaixonada, sem purpurina ou bajulação.

• Trechos

>> Bob Dylan – “’Hey, Dylan!’ Nada, nenhuma reação do homem. ‘Hey, Dylan!’ ‘O que eu lhe diria?’, eu pensava, a cabeça formigando como pastel de feira no tacho fervente. Ele já ia sumindo na rua quando se voltou e respondeu com um grunhido: ‘You are a f... paparazzi!’ ‘Não, não, não’, eu jurava, querendo acreditar em minhas próprias palavras. ‘Para que a foto?’, ele perguntou. ‘Para o Facebook, para a gente mesmo’, menti. Eu me peguei mentindo para Bob Dylan, minha alma estava ficando atormentada, ele era o primeiro ídolo e será o último.”

>> Guns n’Roses –“Eu ainda me lembrava das cartinhas que centenas de fãs me enviaram acerca da minha última crítica a um show do Guns n’Roses, no dia 16 de janeiro de 2001.... ‘Parece que o jornalista estava sofrendo com uma dor de barriga durante os shows. Ou com uma insistente enxaqueca. Só assim para explicar seu mau humor e as críticas negativas que fez a absolutamente TODOS os shows, com comentários poucos convincentes ou pretensamente irônicos, como chamar o vocalista Axl Rose de ‘padre Marcelo de ocasião’, diz uma delas. Escrever crítica de rock, de um show visto por 130 mil pessoas, é como escalar o selecionado nacional – sempre haverá umas 30 mil que vão divergir violentamente de sua escolha. As outras serão muito mais objetivas: simplesmente vão querer matar você.”

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