Débora Falabella e Yara de Novaes mantêm sólida parceria criativa no teatro e na TV

As atrizes contracenam na premiada 'Contrações', que chega a Belo Horizonte em abril

por Ailton Magioli 08/01/2014 06:00

INFORMAÇÕES PESSOAIS:

RECOMENDAR PARA:

INFORMAÇÕES PESSOAIS:

CORREÇÃO:

Preencha todos os campos.
João Caldas/Divulgação
(foto: João Caldas/Divulgação)
De gerações distintas do teatro mineiro, uma em seguida da outra, Yara de Novaes e Débora Falabella desenvolveram relação tão intensa no palco que, além de elogios, costumam dividir premiações. Depois do Prêmio Aplauso Brasil de Teatro 2013 (www.aplausobrasil.com.br), pela atuação conjunta em Contrações, de Mike Barlett, via voto popular, elas foram distinguidas também com o prêmio de melhor atriz da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), pelo mesmo espetáculo, chamando a atenção de público e crítica pela afinação no palco.

“A relação de complementaridade é tão evidente que levamos os prêmios”, justifica Yara, lembrando que no caso do espetáculo a que Belo Horizonte assistirá apenas em abril, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), são duas personagens sustentando uma peça. Integrantes do Grupo 3 de Teatro, que criaram em 2005, em São Paulo, Yara de Novaes e Débora Falabella se conhecem desde o início de carreira, ainda nos anos 1990.

“Na verdade, tanto eu quanto meu irmão Edmundo Novaes Gomes tínhamos relação com o pai dela, Rogério Falabella, que na época era um reconhecido diretor de comerciais”, recorda Yara, salientando o fato de as famílias Novaes e Falabella estarem sempre próximas. O primeiro encontro profissional das duas atrizes foi em 'A família Addams', sob a direção de Carlos Gradim. “Acho que eu estava com 16 anos na época”, acrescenta Débora, que tem a amiga como uma espécie de referência nos palcos.

“O que mais me impressionava em Yara era a forma intuitiva de representação”, afirma Débora Falabella, que também chamou a atenção de Yara de Novaes, de imediato, pela concentração, disciplina e rigor no trabalho. “A Debinha está modulando sempre com a personagem em cena”, diz, carinhosamente, Yara. Convidada por Rafael Conde para fazer a direção de atores no curta-metragem Françoise, ela acabou dirigindo a amiga pela primeira vez. Como atriz, elas contracenaram na novela 'Chiquititas', do SBT/Alterosa.

A seguir, Yara dirigiu Débora em 'Noites brancas', adaptação da novela de Fiódor Dostoiévski, que acabou desaguando na criação pelas duas, em São Paulo, do Grupo 3 de Teatro, ao lado do produtor Gabriel Fontes Paiva, belo-horizontino como as atrizes. No grupo, Yara dirigiu Débora em 'A serpente', de Nelson Rodrigues, e 'O amor e outros estranhos rumores', baseado em contos de Murilo Rubião. Juntas, elas fizeram 'O continente negro', de Marco Antonio de la Parra, com direção de Aderbal Freire-Filho.

A mais recente incursão das atrizes no palco é 'Contrações', na qual Yara e Débora atuam sob a batuta de Grace Passô. Recentemente, elas fizeram em São Paulo a mostra de repertório da jovem companhia que, em apenas oito anos de trajetória, já acumula prêmios e boas críticas. Escrita pelo inglês Mike Barlett, a peça traz à cena os conflitos de duas amigas, em meio ao cenário corporativo.

“Yara foi a minha grande mestra”, reconhece Débora Falabella, que, ao fazer a novela 'Avenida Brasil', da TV Globo, estabeleceu parceria com a diretora, que a ensaiava na pele das personagens Nina/Rita. “Na TV, a Debinha tem preocupação em ter abordagem distinta e pessoal, de abrir mais a personagem”, diz Yara, lembrando que tanto na TV quanto no cinema a amiga pode contrariar um pouco mais o status quo.

“Na TV sempre estive ao lado da Débora, seja via Skype ou telefone. Neste caso, a minha função é como se eu a ajudasse a compreender a personagem um pouco além. Como se abríssemos portas para a personagem. No caso de 'Avenida Brasil', cheguei a indicar um psicanalista, com o qual ela fez uma análise, uma prospecção do que poderia ser sua personagem, o que acabou dando à Débora uma base para criar junto com o autor”, conta Yara.

Coletivo

Para Débora Falabella, é diferente ver Yara de Novaes como diretora e como atriz. “Como diretora, ela é muito generosa. Cada hora explora algo diferente no meu trabalho”, elogia. “E o mais interessante é que, mesmo como diretora, quando está em cena como atriz, o bate-bola da Yara é de igual para igual”, acrescenta Débora. Ela avalia que o ano de 2013 foi importantíssimo para o Grupo 3. “Ganhamos respeito e entendimento de que somos uma companhia”, diz, ciente de que os dois prêmios de melhor atriz para a dupla nada mais são que reflexo de tudo isso. “A gente se comunica até sem se falar”, garante Débora.

Atriz e diretora com ampla experiência em teatro de grupo (Encena e Odeon, em Belo Horizonte, antes do Grupo 3, em São Paulo), Yara admite que o coletivo permite uma elaboração maior do trabalho, tanto técnica quanto intelectualmente. “Para fazer teatro tem de ter gangue, tem de ter turma. É como assaltar banco”, compara, exageradamente, a atriz e diretora.

Para Yara, mesmo fundado em São Paulo, o Grupo 3 de Teatro tem a marca de Belo Horizonte. Além dela, Débora e Gabriel Fontes Paiva, há um grupo fixo de criadores que acompanha o trio. Trata-se de André Cortez (cenografia), Dr. Morris (trilha sonora), Silvia Gomez (dramaturga, responsável por traduções e adaptações do grupo) e Rodolfo Vaz (ator do Grupo Galpão, que fez 'O continente negro' com as duas), entre outros colaboradores.


De Yara para Débora


“O importante é sua voz, seu corpo”

Os atores, normalmente, realizam seu trabalho em decorrência de uma personagem criada por outro artista. Além disso, quase sempre, estão sujeitos a escolhas de um determinado diretor. Como, então, você se torna autora daquilo que realiza em cena?

O principal é que é a gente. Por mais que um autor tenha escrito e um diretor vá guiá-la, o importante é você, sua voz, seu corpo, que vão se dando. A gente, na verdade, se torna personagem junto com o autor e o diretor que nos guiou. Todo o resto eu emprestei. A gente é dono em conjunto. Com a estreia do espetáculo, o personagem vai-se tornando cada vez mais colado e próximo de mim.

Em setembro, dentro da mostra de repertório do Grupo 3, você ficou em cartaz de terça a domingo, com três espetáculos, reativando uma época em que o teatro se esparramava pela semana, como qualquer outra profissão. Qual a importância dessa experiência para você?

Hoje, a gente fala disto como uma ousadia. Mas era assim. As pessoas viviam disto. Acho difícil viver do teatro só às sextas, sábados e domingos, mas a mostra do Grupo 3 foi uma experiência intensa. Tive de me preparar. Enxerguei o teatro de maneira mais ligada ao trabalho. Todo dia trabalhando, cuidando da voz. É uma experiência pela qual você passa a ver o teatro como ofício, como trabalho, que passa a ser muito gratificante.


De Débora para Yara

“A presença do diretor é espectral”

Como você tem dirigido muitos espetáculos, fico imaginando como será estar no palco como atriz e dirigir ao mesmo tempo. Afinal, são duas funções que dão aquele famoso frio na barriga. Gostaria de saber das diferenças entre as duas funções e qual o peso de cada uma delas para você.

Acho que a principal diferença é que o ator precisa estar presente, relacionando-se com todas as circunstâncias da cena, como um jogador na hora da partida, com seu corpo inteiramente ativo e disposto. A presença do diretor é espectral, que pulsa nas escolhas corpóreas ou incorpóreas da cena. Acho que, para mim, ser atriz é o começo de tudo, algo primário, mais natural e elemental. Dirigir me exige mais conhecimento e estudo, um relacionamento posicionado com as pessoas, coisas, pensamentos e intuições. No entanto, as duas precisam produzir verdade e convencer as pessoas dessa verdade. E isso dá muito trabalho!

Agora, uma curiosidade que tenho em relação a seu trabalho. Quando você dirige um espetáculo deixa clara uma visão muito plástica dele. De onde vem esta característica?

Quando eu tinha 20 anos fiz um espetáculo com o Kalluh Araújo, Ciranda de pedra, e lá descobri que a beleza no teatro poderia ir além das intenções obtidas pela palavra realista. Que as coisas poderiam, em composição, gerar muitos outros significados, diferentes daqueles que até então eu havia realizado como atriz. Fiquei, pessoalmente, muito maravilhada com aquela descoberta e nunca mais abandonei, seja como atriz ou diretora, esse caminho vivenciado naquela época. Além disso, tive a sorte de encontrar parceiros que me ensinaram mais e mais sobre a beleza, como André Cortez, Mônica Ribeiro, Dr. Morris, Telma Fernandes, Rafael Conde, você, Márcio Medina, Rodolfo Vaz e Sílvia Gomez, entre tantos outros. Artistas que dialogam com o mundo das coisas e do espírito.

MAIS SOBRE E-MAIS