Mostra de pinturas e desenhos da carioca Wanda Pimentel está em cartaz

Artista integrante da geração que despontou nos anos 1960 expõe até o dia 26 na Manoel Macedo Galeria de Arte

por Walter Sebastião 13/10/2013 00:13

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Silvia Roesler Edições De Arte/Reproduções
As obras de Wanda Pimentel traduzem o cotidiano com linhas claras e corpos femininos contrastando com a geometria (foto: Silvia Roesler Edições De Arte/Reproduções )
“Seus olhos querem tudo em pratos limpos”, diz texto do poeta francês Francis Ponge (1899-1988). O verso traduz visualidade construída ao longo de quase 50 anos pela carioca Wanda Pimentel, de 69 anos. Nas pinturas, desenhos e objetos da artista, o cotidiano é vasculhado com linha objetiva, clara, lúcida. Que constrói ambientes com frestas onde se vê ou não o que está para além deles. Fragmentos de corpos femininos, escorpiões, formas ameboides contrastam com a severidade geométrica dos cenários. Do confronto de elementos vem sentimento detectado por outros poetas. Seja o claro enigma de Carlos Drummond ou o mistério de coisas que não têm mistério nenhum, detectado por Fernando Pessoa.

Wanda Pimentel expõe até o dia 26 na Manoel Macedo Galeria de Arte. A artista esteve recentemente em Belo Horizonte para lançar livro sobre seu trabalho, de autoria de Frederico Morais e Vera Beatriz Siqueira. “Minha obra é o olhar sobre o mundo no momento em que as coisas estão ocorrendo”, afirma Wanda Pimentel. “Não falo só do meu entorno, mas da mulher em geral”, acrescenta. Estão na exposição pinturas e desenhos de diferentes épocas. Entre os quais duas peças da série Memórias, trabalho recente, surgido depois de a artista enfrentar graves problemas de saúde. Situação que causou sentimento de fragilidade e a levou ao encanto pela vida e a criar peça em homenagem ao neto.

“Como penso mais do que faço, tenho produção pequena”, observa Wanda Pimentel, considerando que as 300 reproduções dos livros mostram praticamente tudo o que realizou. Integrante da geração que se afirmou na metade dos anos 1960, ela viu o surgimento do feminismo, a ditadura militar, o crescimento da sociedade de consumo. Sintetizando o contexto, conta, está série do período em que objetos do cotidiano, como uma máquina de moer carne, se agigantam ameaçadoramente. Há outros ícones que entrelaçam as muitas questões postas pela vida contemporânea: paisagens com ares crepusculares, interiores com ares de labirinto, ambientes assépticos invadidos por moscas, baratas, serpentes etc.

Wanda Pimentel
Mostra de pinturas e desenhos. Manoel Macedo Galeria de Arte, Rua Lima Duarte, Carlos Prates, (31) 3411-1012. Aberta de segunda a sexta, das 10h às 19h; sábado, das 10h às 14h. Até dia 26. Entrada franca.

Três perguntas para...

Wanda Pimentel
artista plástica

Você teve influência da pop art?
O pop esteve presente na formação de nossa geração. Fizemos o pop no momento em que ele ocorria nos Estados Unidos e na Inglaterra. Então, tinha algo brasileiro, tirado da gente, não era uma influência. Por isso, vem sendo tão reconhecido internacionalmente. Sabíamos o que estava ocorrendo, mas tudo era muito distante. Saíamos pouco do Brasil, não era possível dar um pulinho em Nova York, em Londres. Na época, os artistas queriam encontrar a sua linguagem e não ser influenciados por um movimento. Apesar de vivermos em época complicada, todos éramos muito dedicados ao que fazíamos.
 
Como é sua dedicação à pintura?
Sempre me dediquei à pintura e ao desenho. Não vejo diferença entre as duas coisas. Para mim é a mesma coisa, inclusive em termos de valor financeiro. Pintar exige técnica, paciência, tempo, e que o artista fique em cima para conseguir alguma coisa. No meu caso, nem é prazer, mas trabalho braçal, bravo. Não tenho assistente. Dá vontade de ter, mas, como gosto de fazer eu mesma, acabo não procurando. Fui aluna de Ivan Serpa. Aprendi com ele o pensamento rigoroso de que a obra não deve ter nada a mais nem a menos, arte não é artesanato. Fazer arte, ele ensinava, não era brincadeira de fim de semana. Para Serpa, quando se está começando a fazer arte, é preciso trabalhar todo dia.

Como era o ambiente artístico quando você começou?

Sou de uma época em que quem mandava na arte era Portinari, Guignard, Antônio Bandeira, Di Cavalcanti. Excluindo os salões, não havia apoio aos jovens artistas. Comecei em 1965, estudando com Ivan Serpa, no Museu de Arte Moderna do Rio, e mostrando obras nos salões de arte moderna. Ligados politicamente ao que estava ocorrendo, não íamos a museu à toa, mas para conversar. Trabalhávamos fugindo da polícia, foi um período terrível. Havia o medo de entrar para as coleções oficiais. Se você vendia um trabalho, logo ouvia: ‘Entrou para o esquema’. Abrimos espaço para a arte contemporânea e é por isso que os jovens gostam tanto da arte dos anos 1960. Gosto do que vejo atualmente. Há muitos artistas interessantes surgindo.



Saiba mais

Autores ilustres

Wanda Pimentel (foto da década de 1980) vive e trabalha no Rio de Janeiro. Integra geração de autores ilustres como Cildo Meireles, Waltércio Caldas e Barrio, entre outros, que, nos anos 1960, dando substância crítica (social, política ou poética) a várias estéticas (pop art, surrealismo, abstração geométrica etc.), criou os fundamentos da singular arte contemporânea brasileira, hoje celebrada internacionalmente. “O principal em tudo o que faço é a construção”, observa Wanda. Se há nas peças explícita clareza ótica, ela também valoriza a emoção – “sem ela arte não é nada”. Não é de devaneios metafísicos: “Não sou religiosa. Até queria ter mais fé, é alento. Mas sou cética”, observa.

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