Marília Pêra já perdeu a conta de quantas mulheres interpretou no teatro, no cinema e na TV

Aos 70 anos, a atriz planeja dirigir e traduzir peças, além de revelar segredos em pleno palco

por Helvécio Carlos 17/07/2013 06:00

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Caio Gallucci/divulgação
Marília Pêra diz que a gentileza de Dolly faz muita falta ao mundo contemporâneo (foto: Caio Gallucci/divulgação)
A quantos personagens Marília Pêra já deu vida? Responder essa pergunta com exatidão é tarefa quase impossível para a atriz. “Já passam de 500”, arrisca ela, que estreou nos palcos ainda criança, há 66 anos. Mas essa carioca não tem dúvida em apontar Dolly Levi, a casamenteira do musical 'Alô, Dolly!', como um dos maiores desafios de sua carreira.


“É preciso um preparo físico imenso para atuar por 135 minutos. É quase opereta!”, compara. O esforço exigido por Dolly é proporcional à admiração de Marília pela personagem. “Ela socializa o amor e o dinheiro: vai obrigar o avarento Horácio Vandergelder a ser mais amoroso e gentil. Essa função é muito bonita”, afirma a artista. Bem-humorada, Marília comenta a falta que as Dollies fazem para o mundo contemporâneo. “Principalmente por estimular a gentileza. Ser gentil com o outro é um bom começo de caminhada. Neste momento bélico que vivemos, as pequenas gentilezas contam muito”, defende.


'Alô, Dolly!' faz temporada de amanhã a domingo no Sesc Palladium. É a segunda apresentação do musical em BH. A primeira, nos anos 1960, foi estrelada por ninguém menos que Bibi Ferreira e Paulo Autran – pouco depois da estreia na Broadway. A direção da remontagem ficou a cargo de Miguel Falabella, responsável pela versão do texto de Michael Stewart e intérprete de Horácio Vandergelder.


O cenário é a Nova York dos anos 1890, onde Dolly Levi, viúva casamenteira, é contratada por Horácio para lhe arranjar uma esposa. Entre muita confusão, as coisas não saem exatamente como o planejado, para diversão do público.


Jovenzinha nos anos 1960, Marília fez teste para o elenco comandado por Bibi e Autran. Mas não passou. “Nunca mais pensei em Dolly até o Miguel me chamar. Não teria como rejeitar o convite dele”, explica a atriz. “Lembro-me de que Miguel e Maria Padilha foram lá em casa me chamar para dirigir 'A menina e o vento', de Maria Clara Machado. Era quase uma imposição e aquele foi o meu primeiro trabalho como diretora. Mais tarde, em 2006, fui convidada para atuar em 'Polaroides urbanas', o primeiro longa dirigido por Miguel. Temos grande afinidade, embora sejamos atores de estilos diferentes. De alguma forma, essa mistura é harmoniosa”, acredita ela.


Marília se diverte com o amigo, “um maluco” no palco. E entrega: “Ele é desesperado pela gargalhada do público. Às vezes, espero essa gargalhada para retomar a cena”. A cumplicidade não para por aí. “Dependo dele quando eventualmente me perco, e Miguel sabe que estou atenta, caso ele eventualmente se perca. Há uma comunhão entre a gente. Às vezes, olho para ele como se fosse meu filho”, revela. A amizade já fez 35 anos, mas foram poucas as parcerias profissionais. “Não passam de sete, oito produções”, contabiliza Marília, revelando que um não frequenta a casa do outro. “Somos parceiros artísticos”, resume a atriz.

 

Paula Kossatz/divulgação
Os amigos Miguel Falabella e Marília Pêra contracenam no musical 'Alô, Dolly!' (foto: Paula Kossatz/divulgação )
A volta de Joana

Marília Pêra já deu vida a Rafaela (em 'Brega & Chique', novela de 1987), Milu ('Cobras e lagartos', em 2006, outro sucesso da TV), Coco Chanel (na peça 'Mademoiselle Chanel', em 2004) e à impactante Sueli (no filme 'Pixote – A lei do mais fraco', em 1980). “Todas foram maravilhosas”, comenta ela.


Entretanto, a mais especial neste momento é Joana, protagonista de 'A vida escrachada de Joana Martini e Baby Stompanato' (1970). A peça, de Bráulio Pedroso, voltará aos palcos dirigida por Marília. Trata-se da única remontagem entre as dezenas de espetáculos estrelados por ela. “Não dá tempo de ficar refazendo o que já fiz. Falta pouco, o tempo urge. Mas adoraria, se tivesse menos 20 ou 30 anos, remontar 'A estrela Dalva', Callas ou Chanel, momentos deslumbrantes da minha vida”, conta.
O apartamento da atriz guarda a história dos últimos 60 anos do teatro brasileiro. Ela conserva o próprio acervo e o dos pais, os atores Manoel Pêra e Dinorah Marzullo. Se tudo correr como planejado, em breve o público poderá ver tudo isso em grande exposição, cujo projeto está a cargo dos produtores Montenegro e Raman.


Marília tem 70 anos – e não esconde a idade. “Penso no presente e no que virá. Quero ficar em harmonia com meu corpo e meu espírito, em não deixar de aprender sobre a vida e sobre o mundo”, diz. E confessa: a falta de tempo é um problema. “Nem tenho ido ao cinema. Vou contar uma coisa horrível: só vou a enterros e missas de sétimo dia, obrigações sociais”.

 

Haja trabalho: ela fez 'Pé na cova para a TV', e 'Alô, Dolly! no palco'. Quando terminar a temporada do musical, planeja voltar com a peça 'A atriz', de Peter Quilter – desta vez, estreando como tradutora. Mais adiante, pretende montar num stand up. “Faltam tempo e coragem para escrever alguns segredos”, diz. Nem por decreto Marília revela algum deles. “Sentada no sofá, como se fosse a Hebe, eu os contaria para a plateia. Depois poderia virar um livro”, explica, encerrando a entrevista com uma sonora gargalhada.

 

Três perguntas para...

Miguel Falabella, ator e diretor

 

 

Por que remontar agora 'Alô, Dolly!', antigo sucesso na Broadway encenado no Brasil na década de 1960?
Há algum tempo, tinha a vontade de encená-lo. Ele tem uma grande importância na minha vida. Aos 8 anos, ao assistir a 'Hello Dolly!' no Teatro João Caetano, percebi o que gostaria de fazer pelo resto da minha vida. Hoje, sinto-me realizado a cada noite.

Como você direcionou a montagem? Por referências à peça estrelada por Barbra Streisand? Ou você optou por algo mais brasileiro?
Sem dúvida, o sotaque brasileiro. Proponho em minha tradução a mistura de nossas referências com musicais estrangeiros, isso ajuda o público a se aproximar da realidade do musical. O meu personagem, por exemplo, poderia perfeitamente ser do interior de Minas Gerais. E Marília apresenta Dolly com humor, inteligência e charme que facilmente encantam o público.

Montar espetáculos simples dá muita dor de cabeça. Volta e meia, você apresenta grandes montagens. De onde vem a coragem para encarar projetos caros e trabalhosos?
Tenho a sorte de estar ao lado de atores e amigos muito talentosos. Em 'Alô, Dolly!', não é diferente. Sem dúvida, trata-se de belíssima superprodução. Somos 29 pessoas no elenco, 16 músicos na orquestra. Ao todo, somos 83. Existe uma entrega, uma paixão, e isso chega naturalmente ao público. Tenho o desejo de trazer musicais para cá. Assim, os jovens podem se apaixonar pelo gênero.

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