Artista plástico mineiro Maurino de Araújo afirma que está vivendo um de seus melhores momentos

Perto de completar 70 anos, artista faz planos de uma exposição

por Walter Sebastião 29/04/2013 07:46

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Beto Novaes/EM/D.A Press-20/12/09
"Foi a vida que me forçou a descobrir que a dança é uma maravilhosa terapia" (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press-20/12/09)
“A saúde não está 100%, mas a cabeça, a vida e o trabalho vão bem.” Assim o artista plástico Maurino de Araújo explica seu momento atual, ele que completa 70 anos em 28 de maio. “Estou vendo novo tempo de alegria. Sentir-se velho é querer encostar as ferramentas antes da hora”, ironiza. “Não tenho inveja de quem tem 20, 40 anos. Estou achando bom fazer 70 anos. A concentração no trabalho ficou mais agradável. Estou vivendo frenesi de desenhar e esculpir. E continuo rastejando atrás da pintura.”

Mineiro de Rio Casca, Maurino vive em Belo Horizonte desde 1965. É um dos mais importantes escultores brasileiros, com trabalho reconhecido internacionalmente. Dedicar a vida inteira à arte exige sacrifício, admite. “O trabalho faz com que a gente renuncie a algumas coisas. Em troca você ganha um pedacinho do céu”, garante. A arte, exemplifica, deu distinção a ele e recursos para ir levando a vida. “Mas não vou levar ouro no caixão”, conclui com bom humor.

Dançando Maurino avisa que ficar rico com a atividade nunca foi seu projeto. Motivo de satisfação é o respeito que desfruta como artista. Ele se incomoda, inclusive, com a imagem de figura excêntrica que dança pelas ruas. “Tenho natureza de recolhimento. Sou mais monge do que dançarino. Foi a vida que me forçou a descobrir que a dança é uma maravilhosa terapia. Os africanos têm nela uma sustentação. Todos deviam dançar”, defende.

Ano dramático, recorda Maurino, foi 1984. “Um tratamento de dentes acabou destruindo minha boca”, conta. Isso o obrigou a um longo período de recuperação física e da depressão, que ainda hoje combate. “Eu era um homem feliz, com saúde. E de repente estava mal. Reagi dançando”, lembra, acrescentando que se assusta com a cidade grande. “Preferia a Belo Horizonte pequena, onde se podia andar pelas ruas alegre e tranquilo, a este gigante que estamos vendo surgir”, avalia.

Momento feliz, afirma, é mesmo o atual. Maurino está se sentindo bem e curtindo os netos Letícia e Adrian. Uma coloca balas na boca dele; outro “nasceu artista”, avisa. “O céu deve ser mais ou menos assim como a alegria que as crianças passam”, especula o cidadão, que nem é de comemorar aniversário. Apesar disso, está com vontade de celebrar os 70 anos. “Quero trabalhar muito para descontar o tempo que fiquei parado. E talvez fazer uma exposição”, avisa o artista, torcendo para que se concretize o projeto de uma mostra com obras de colecionadores, no Museu de Artes e Ofícios.


Palavra de especialista
Emanoel Araújo, diretor do Museu Afro-Brasil (SP).

Raízes africanas
Maurino de Araújo criou uma obra muito original. A escultura dele está fundamentada no barroco mineiro e tem ligação ancestral, introduzida inconscientemente, com a África. São peças impactantes, com expressionismo que aproxima a produção de Maurino à de Aleijadinho. É arte que, no modo como são construídas as obras e sintetizadas as figuras, tem profundas ligações com os dogmas da arte africana, com caminhos não eurocêntricos. É artista incompreendido, que recebe a pecha de primitivo, mas está longe disso. Trata-se de grande e requintado escultor. Sempre tive paixão pelo que ele faz e apresentei em várias exposições. É um artista inspirador. Temos, no nosso acervo, várias obras dele.

Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press-22/3/13
Detalhe da peça 'Querubim', que Maurino de Araújo esculpiu em 1983 (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press-22/3/13)
Alma e sentimento


Maurino de Araújo já mostrou suas esculturas em importantes mostras dedicadas à arte brasileira realizadas no Brasil e no exterior. Esteve em duas edições da Bienal de São Paulo e chegou a expor no Museu Guggenheim (EUA). O interesse pela arte veio aos 5 anos, vendo mãe e pai (Maurílio Leôncio de Araújo e Conceição Gonçalves Pereira) trabalhando em olaria, em Espraiado, “uma rocinha perto de Rio Casca”, diz.

A primeira escultura de Maurino, feita em madeira, é do final dos anos 1960. A dedicação à arte sacra vem da formação em um seminário franciscano em São João del-Rei, onde conheceu as obras do Aleijadinho. Em 1965, depois de morar no Paraná, se transferiu de vez para Belo Horizonte, mas continuou na mesma linha de trabalho.

A arte sacra, cristã, diz Maurino, é influência importante da estética do Ocidente. “Permite criar ícones com conteúdo espiritual, expressão dos sentimentos e da alma e ligado aos dramas que a vida apresenta”, observa. Recorrentes são os anjos negros, madonas, cristos e santos. O artista não divide em fases o muito que realizou ao longo do tempo. “É um conjunto. Sou fiel a mim mesmo. E para ser fiel, as mudanças são leves, com naturalidade que as torna quase imperceptíveis”, ensina.

Um mestre? “O padre holandês Hank Kamps. Jovem, recém-chegado ao Bairro 1º de Maio, sem amigos, morando em lugar pobre, sem água, sem luz, foi com surpresa que vi ele me procurar por causa de um desenho que tinha visto. E me disse que eu era artista nato, que a beleza da arte está na criação, não na cópia. Foi o maior e mais importante ensinamento que recebi”, recorda. Maurino de Araújo vive e trabalha no Bairro 1º de Maio, na Região Nordeste de Belo Horizonte.

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