Morre aos 86 anos o escritor norte-americano Gore Vidal

Autor de romances em que analisa a formação histórica de seu país, escritot foi crítico mordaz

por Carlos Herculano Lopes 02/08/2012 10:35

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reuters - 9/5/01
(foto: reuters - 9/5/01)
Vítima de complicações decorrentes de uma pneumonia, segundo informações de um sobrinho, Burr Steers, o escritor Gore Vidal, um dos mais mordazes críticos do modelo de vida norte-americano, morreu ontem, aos 86 anos, na sua casa em Hollywood Hills. Além de ficcionista consagrado, com livros traduzidos em todo o mundo, foi também dramaturgo, roteirista, ensaísta e ativista político, tendo se envolvido em incontáveis polêmicas. Artista precoce, seu gosto pela literatura foi despertando ainda na adolescência, e seu primeiro romance, Williwaw, foi escrito dentro de um navio, durante a Segunda Guerra Mundial, quando Vidal estava com 19 anos e servia nas Forças Armadas do seu país. Baseado em suas próprias experiências como soldado em um destacamento no Alasca, o romance, bem recebido pela crítica e pelo público, foi o primeiro passo do jovem Vidal rumo à glória literária. 
Eugene Luther Vidal nasceu em West Point, em 3 de outubro de 1925. Era filho único do casal Eugene Luther Vidal e Nina Gore. Seus primeiros estudos foram na Escola de Saint Albans, em Washington, indo em seguida para a França, onde se graduou na Academia Philips Exeter. De volta aos EUA, em 1943, se alistou no Exército. Na década de 1950, viriam romances como A procura de um rei, Verde escuro, vermelho brilhante, O julgamento de Páris e Messias. Nesse período, de acordo com o espírito americano de ganhar dinheiro a qualquer custo, chegou a escrever roteiros para a televisão e filmes de Hollywood. Passaria a sofrer perseguições de políticos conservadores, liderados pelo senador MacCarthy, sobretudo em decorrência da sua postura crítica frente à política belicista dos EUA. 
Dono de criatividade inata, que o levou, inclusive, a escrever livros de ocasião, tidos como ficção barata, e outros de suspense, valendo-se para isso de três pseudônimos, sua primeira vocação, no entanto, não foi a literária, mas política. Chegou a declarar, durante entrevista, que a única coisa que sempre quis ser na vida foi presidente do seu país. Não passou de vontade. O sonho se esvaiu com o tempo e com derrotas eleitorais. Mas carregava no sangue a herança política. De linhagem nobre, seu avô materno, Thomas Gore, com o qual foi criado depois da separação dos seus pais, quando Vidal tinha 10 anos, chegou a ser senador pelo estado de Oklahoma. Depois que ficou cego, o garoto passou a ser seu leitor e guia. A filosofia política do avô teria contribuído para a visão mordaz que o escritor tinha em relação a seu país. 
Já o seu pai, Eugene Luther Vidal, chegou a ser diretor do comércio aéreo, durante o mandato do presidente Franklin Delano Roosevelt, e era primo do presidente Jimmy Carter e do vice-presidente Al Gore. Mesmo não tendo alcançado grandes voos na política, já que com o tempo a literatura passou a ser prioridade, Gore Vidal chegou a ser candidato derrotado pelo Partido Democrata junto à Câmara de Representantes de Nova York, em 1960, e trabalhou ainda para o presidente John F. Kennedy, entre 1961 e 1963, como assessor de artes para a presidência. Em 1982, dando novamente asas à vocação política, voltaria a postular novo cargo, desta vez candidatando-se ao Senado, pela Califórnia. Novamente não foi eleito, mas chegou a ter mais de 500 mil votos.
SEXO E CRÍTICA Homossexual assumido, um dos seus livros mais polêmicos, tido como autobiográfico, foi A cidade e o pilar, de 1948, no qual tratava do tema. Depois de sua publicação, o jornal The New York Times, durante um bom tempo, passou a não resenhar seus novos trabalhos, que também foi boicotado pelos críticos literários de outras publicações. Com seu companheiro, Howard Austen, Gore Vidal viveria muitos anos em Ravello, na Itália, só retornando a Los Angeles depois do falecimento de Howard, em 2003. 
Em 1995, com a publicação do livro de memórias Palimpsesto, falou de sua amizade com escritores como Norman Mailer, Truman Capote e Tennessee Williams, e com nomes da cultura americana, entre eles Orson Welles, Frank Sinatra, Marlon Brando, Paul Newman e Joanne Woodward. No livro, Gore Vidal confessaria também, para espanto da conservadora sociedade americana, que, aos 25 anos, já havia se relacionado sexualmente com mais de mil homens e mulheres. Da maioria, sequer lembrava o nome. Entre seus livros mais conhecidos, que representam ficcionalmente sua visão das história dos EUA, destaca-se a trilogia Washington D.C, de 1967, Burr, de 1973, e 1876, de 1976.
 Sempre polêmico, declarou que os Estados Unidos, como todos os impérios, precisavam de inimigos para se expandir. Em 2004, durante a campanha presidencial em seu país, disse que Bush iria roubar as eleições e, depois, ao fazer um balanço do governo, afirmou que “foi o mais desastroso de nossa história”. Sobre o presidente venezuelano Hugo Chávez, afirmou que honrava a revolução iniciada por Fidel Castro e que, de Lula, não estava a par. Como intelectual, além das críticas que fazia à política americana, será também lembrado como defensor dos direitos das minorias, além de escritor capaz, como poucos, de retratar as mazelas sociais dos EUA. 
 
Cronologia
1925 – Nasce em 3 de outubro na Academia Militar de West Point, no Estado de Nova York, filho de um pioneiro da aviação americana
1945 – É convocado a lutar na Segunda Guerra Mundial. Durante o conflito, termina de escrever Williwaw, seu primeiro romance
1947 – Publica seu segundo livro, Em um bosque amarelo, em que registra as memórias de um ex-combatente
1948 – Viaja pela Itália ao lado de seu amigo, o escritor Tennessee Williams. Publica A idade e o pilar, considerado o primeiro romance americano a discutir abertamente a homossexualidade
1952 – Publica O julgamento de Páris, uma atualização do mito da Guerra de Troia
1954 – Em Messias, critica as seitas religiosas pré-fabricadas que vivem da manipulação do dinheiro e da fé
1960 – Escreve o drama político The best man, peça de grande sucesso na Broadway. Tenta se candidatar ao Senado pelo Partido Democrata
1964 – Morando em Roma com seu companheiro Howard Austen, publica Juliano, romance em que mostra a luta do Império Romano contra o cristianismo
1966 – Com o satírico Washington D.C., inaugura o estilo que batizou de "as narrativas do Império”
1972 – Publica Burr, romance em que presta contas com os fundadores da democracia norte-americana
1982 – Tenta se candidatar novamente ao Senado pela Califórnia, mas perde as primárias dos Democratas
1993 – Ganha o National Book Award pela coletânea de ensaios United States: Essays 1952-1992
2000 – Em Era dourada: narrativas do Império, encerra sua análise 
sobre a formação política e cultural americana
2005 – Volta aos EUA depois da morte de seu companheiro, em 2003, com quem viveu na Itália por boa parte da vida
2009 – É homenageado com a medalha da National Book Foundation por sua contribuição para a literatura
2012 – Morre aos 86 anos, em sua casa, em Los Angeles. 
 
Algumas obras de Gore Vidal 
 
Myron
Ficção ambientada em Hollywood, conta a história de um transexual que tenta equilibrar a própria dualidade entre homem e mulher. 
Palimpsesto
 Autobiografia dos 40 anos de vida do escritor. Trata da infância em Washington, o período em que serviu no Exército e a efervescência cultural de Nova York e Paris nos anos 1940 e 1950.
Fundação 
Smithsonian
O jovem T., pouco antes da Segunda Guerra, se envolve num projeto secreto de bomba atômica, organizado pelos personagens históricos de museus. Eles ganham vida quando o público vai embora.
Burr
Biografia ficcional de Aaron Burr (1756-1836), terceiro vice-presidente dos EUA (no mandato de Thomas Jefferson). 
Criação
Reconstrução de uma das épocas mais turbulentas e fascinantes da história da humanidade, o século 5 a.C., período em que se conceberam ideias filosóficas, sociais e políticas que mudaram o curso do mundo antigo. 
De fato e ficção
Painel irônico das instituições políticas e literárias e da moral sexual. O escritor comenta a obra de Tennessee Williams, Scott Fitzgerald e Edmund Wilson. 


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