Sesc Palladium exibe programação especial de Orson Welles

Onze filmes do ator e diretor estarão em cartaz, incluindo alguns pouco exibidos na capital mineira

por Mariana Peixoto 02/02/2016 08:00
anônimo/afp
(foto: anônimo/afp)
"Todos nós estamos acostumados a ouvir e ver uma história a partir de seu princípio. A maneira como Welles conta sua história pode ter seu lugar na literatura ou no palco, mas estou convencido de que, em cinema, encontra-se totalmente deslocada.”

 

Era junho de 1941, um mês após a première de Cidadão Kane em Nova York. Escrevendo para a publicação antifascista Decision: a review of free culture, editada também em Nova York, o austríaco Erich von Stroheim (1885-1957) – ator, diretor e roteirista como Orson Welles (1915-1985) – considerou a produção “soberba” e a direção “genial”. Mas, na opinião dele, a forma de contar a história do magnata Charles Foster Kane era “radical” demais.


Cidadão Kane foi o céu e o inferno de Orson Welles. E é seu primeiro longa-metragem que abre a programação da mostra Verdades e mentiras: o cinema de Orson Welles, no Cine Sesc Palladium. De hoje ao dia 28, serão exibidos 11 filmes do cineasta – o formato é DVD, longe do ideal, mas o material apresentado (veja ao lado) vale a ida ao cinema.
O radicalismo na forma que tanto incomodou Von Stroheim é a base do chamado cinema moderno, inaugurado com a narrativa sobre um magnata da imprensa americana. “A maneira como o cinema dele é narrado, por meio de fragmentos, deixa mais lacunas do que certezas”, comenta o coordenador de Cinema da UNA, Rafael Ciccarini.


Criando uma narrativa inspirada na vida de William Randolph Hearst, então magnata das comunicações, Welles não teve paz até o fim da vida. Hearst fez uma campanha fortíssima de boicote ao filme. Hollywood também condenou sua carreira – todos os filmes realizados a partir de Kane sofreram ingerência de estúdios, sucessivos cortes, muitos à revelia do diretor. Ainda sofreu com a falta de patrocínio.


“Ele dizia que Cidadão Kane era o único filme em que teve liberdade criativa, nunca mais teve total controle da produção, tanto que renegou boa parte de sua obra”, recorda o pesquisador e professor de cinema Ataídes Braga. “E como ele foi alijado da imprensa americana, sua fama foi decantada pelo tempo. Foi a crítica francesa que recuperou Welles nos anos 1950”, acrescenta Ciccarini.


O Sesc montou a mostra com quatro recortes, como destaca a seleção ao lado. “É um cineasta acima do bem e do mal, precursor de uma tendência mais reflexiva e de transformação do cinema”, finaliza Braga.

 

MOSTRA VERDADES E MENTIRAS: o cinema de Orson Welles

Até 28 deste mês, no Cine Sesc Palladium – Avenida Augusto
de Lima, 420, Centro. Entrada franca (os ingressos devem ser retirados
30 minutos antes de cada sessão). Informações: (31) 3270-8100.

 

O CINEMA DE ORSON WELLES  na tela do cine sesc palladium

 

» WELLES NOIR

. O estranho (EUA, 1946)
O detetive Wilson (Edward G. Robinson) tem a missão de prender o oficial nazista Charles Rankin (Welles), que se mantém escondido numa cidadezinha. Filmado um ano após o fim da Segunda Guerra, só foi lançado em 1947.
. Dias 4 e 20, às 19h

. A marca da maldade (EUA, 1958)
Um dos filmes mais conhecidos do diretor, que conta a história que envolve sequestro, assassinato e corrupção policial na fronteira dos EUA com o México. O noir tardio traz no elenco Charlton Heston, Janet Leigh e o próprio Welles, como um policial maquiavélico.
. Dias 11 e 23, às 19h


. A dama de Shangai (EUA, 1947)
Salva de ladrões pelo jovem Michael O’Hara (Welles), Elsa ‘Rosalie ’Bannister (Rita Hayworth), mulher de um milionário, o convida para trabalhar no iate de seu marido. Só que ele se apaixona por ela e tenta fugir com a mulher. O cineasta fez com que Rita cortasse os cabelos e os pintasse de louro, o que muitos consideraram o motivo do fracasso do filme.
. Dias 16 e 18, às 19h


» VERDADES E MENTIRAS

. Cidadão Kane (EUA, 1941)
A obra-prima de Welles, que lhe deu seu único Oscar (melhor roteiro), conta a história do magnata Charles Foster Kane, figura inspirada no chefão das comunicações da época William Randolph Hearst. Depois do filme, os dois se tornaram inimigos de morte. Welles levaria somente um Oscar – o honorário, concedido pela Academia de Hollywood 30 anos mais tarde.
Hoje e dia 18, às 19h

. F for fake – Verdades e mentiras (EUA, 1974)
O ponto de partida deste documentário foi a história do pintor e falsificador húngaro Elmyr de Hory (1906 – 1976), e de seu biógrafo, Clifford Irving. O cineasta investiga outras narrativas controversas, como a histeria provocada pelo programa de rádio Guerra dos mundos, criado por ele, que noticiou uma invasão alienígena.
Dia 13, às 19h, e dia 26, às 17h

. Mr. Arkadin (ou Grilhões do passado) (Espanha/França/Suíça/EUA, 1955)
Sofrendo de amnésia, o milionário Gregory Arkadin (interpretado por Welles) contrata o detetive Guy von Straten para investigar seu passado. Seu paralelo mais próximo é com o próprio Cidadão Kane.
Dia 17, às 19h, e dia 28, às 17h

» WELLES LITERÁRIO

. Soberba (EUA, 1942)
Indicado a quatro Oscar, é o primeiro filme depois de Cidade Kane. Conta a história dos Amberson, uma família burguesa de Indianópolis que já viveu dias melhores. Welles tinha todo o dinheiro disponível para realizar o longa. Sofreu na pós-produção: temendo fracasso, o estúdio cortou, à revelia do cineasta, mais de um terço do longa.
Amanhã e dia 19, às 19h

. O processo (EUA, 1962)
Anthony Perkins, em alta depois do Norman Bates de Psicose (1960), interpreta Joseph K. nesta adaptação de Franz Kafka. Um dos poucos filmes em que Welles não sofreu interferência do estúdio em seu corte final – é um dos longas preferidos do cineasta.
Dias 12 e 24, às 19h

. Don Quixote (Espanha/EUA/Itália, 1992)
Welles era obcecado pelo romance de Miguel de Cervantes. O projeto de filmar o épico consumiu quase 20 anos e ficou inacabado. Sete anos após a morte do diretor, foi lançado com o título de Don Quixote de Orson Welles. A finalização coube ao diretor espanhol Jesús Franco. Muitos consideraram o filme uma traição a Welles.
Dias 14 e 27, às 19h

» SHAKESPeARE

. Macbeth (EUA, 1948)
O desejo inicial de Welles era filmar Otelo (que ele realizou quatro anos mais tarde). Mas convenceu seus investidores a apostar em Shakespeare somente quando decidiu filmar Macbeth, que o cineasta definiu como “uma mistura perfeita de O morro dos ventos
uivantes e A noiva de Frankenstein”.
Dias 5 e 21, às 19h

. Falstaff – O toque da meia-noite (EUA, 1965)
Welles interpreta o velho e gordo amigo de Henrique IV, herdeiro do trono da Inglaterra. O cineasta teria atrasado em duas semanas o início das filmagens por medo de atuar. Um dos filmes preferidos do cineasta, foi também realizado com orçamento
bem abaixo do esperado.
. Dia 13, às 16h30, e dia 26, às 19h

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