Ivo Lopes Araújo é um dos diretores de fotografia mais requisitados do país

O diretor de fotografia Ivo Lopes Araújo mostra que a quantidade e a experimentação podem andar juntas no cinema. No ano passado, ele participou de sete longas e curtas

por Carolina Braga 22/02/2014 10:07

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Paulo Filho/Divulgação
Ivo Lopes Araújo não tem medo de ousar e quer encontrar formas de chegar ao público (foto: Paulo Filho/Divulgação)
Mesmo que seja em tom de brincadeira, o cearense Ivo Lopes Araújo sabe que, se quisesse, poderia fazer uma mostra só com seus trabalhos realizados no ano passado. Aparentemente, com ele não tem essa de cinema ser arte de tempos mais dilatados entre um projeto e outro. Só em 2013, o diretor de fotografia de 36 anos, pai da Iara, de 13, assinou seis longas-metragens e um curta. A lista de 2014 também é comprida. Tem o novo longa da mineira Marília Rocha até projeto de série gravada em Minas, Ceará e Pernambuco.

As empreitadas do ano passado não foram projetos pequenos. Filmes deram o que falar, como Tatuagem (de Hilton Lacerda), e outros que ainda vão dar, como O uivo da gaita (de Bruno Safadi). Tem ainda exercícios como Quando eu era vivo (de Marco Dutra) e O homem das multidões (de Cao Guimarães e Marcelo Gomes). “Acho saudável estar em uma relação menos acomodada com o cinema, menos conformada. Sempre fui um pouco inquieto”, diz.

Graças à inquietude, até muito pouco tempo atrás Ivo recusava o crédito de diretor de fotografia. O interesse pelo cinema é maior do que um ou outro posto. Assim pensa o cineasta, roteirista, montador, desenhista e pintor. A geração dele funciona assim. “Não sou de muitas certezas na vida. É natural me dividir entre todas as coisas que me foram postas.” Ivo parte de referências que vão do desenho à pintura para fazer diferença no atual cinema brasileiro.

Até o nascimento da filha, a fotografia não chamava a atenção dele. A partir do anúncio da gravidez, Ivo não parou de clicar e assim surgiram as primeiras experimentações envolvendo imagens. Como não havia curso de cinema em Fortaleza, ele foi estudar no Rio de Janeiro, em 2000. Na sala de aula, conheceu os irmãos Luiz e Ricardo Pretti, com quem, anos depois, fundou o coletivo Alumbramento, ainda em atividade em várias partes do Brasil, inclusive em BH.

Rec/Divulgação
Cena de O homem das multidões, filme que trouxe Ivo Araújo a Belo Horizonte (foto: Rec/Divulgação)
Durante o período da faculdade, Ivo usava as fotos de Iara para experimentar. Passava horas dentro do laboratório descobrindo as possibilidades do preto e branco. “No digital, treinava movimento e câmera”, conta ele, fã de coisas antigas como discos de vinil. Para Ivo, não dá para pensar o processo de realização de um filme sem experimentação.

“São muitas combinações: o diretor vem com uma ideia, um roteiro, e o ator chega com outra. Cada pessoa que está ali traz uma contribuição. Gosto bastante desses processos estranhos, menos hierárquicos, diferentes do usual”, afirma. “Cada projeto foi uma loucura diferente”, reconhece.

Quando eu era vivo, de Marco Dutra, é um exercício de fazer filme de horror no Brasil. O trabalho prévio demandou planejamento detalhado, com decupagem cena por cena. Já Tatuagem, de Hilton Lacerda, tal como ele deixou “impresso” na tela, foi uma entrega cheia de energia e improviso. “Hilton tinha concepção de imagem e de fluxo muito bem definida. Tentei entender aquilo e trazer algo importante para todo mundo: uma certa liberdade”, explica.

Engana-se quem pensa que o trabalho do diretor de fotografia se resume a pegar a câmera e registrar as imagens no dia da filmagem. No caso de Ivo Lopes Araújo – particularmente em Tatuagem –, a labuta começou semanas antes. “Via os ensaios, conheci todos os atores antes de começar a rodar.” O resultado, segundo ele, foi a sintonia na hora de captar os improvisos.

Já O homem das multidões, rodado em Belo Horizonte, teve muito de inesperado, além da convivência com Cao Guimarães, de reconhecida ousadia na área. “Foi estimulante. O Cao tem uma relação com a imagem que admiro muito”, elogia. A decisão de manter o quadro em 4x4 foi uma das escolhas do cineasta comemorada pelo fotógrafo. “Cada filme tem um processo, uma relação e uma aposta”, resume.

Além dos festivais

Para filmar O homem das multidões, Ivo Araújo passou alguns meses em Belo Horizonte, o que trouxe ao cearense certo sotaque mineiro. “Sei empregar o uai como vocês”, brinca. Sabe mesmo. De julho a setembro, ele estará por aqui para filmar um longa de ficção da diretora Marília Rocha, cujo nome está indefinido.

Ivo Lopes Araújo se dedica ao documentário sobre a gravação do novo disco da banda Cidadão Instigado; à montagem do longa O medo do escuro, que ele mesmo dirigiu; além do curta com o amigo e diretor Pedro Diógenes. A dupla prepara, para o segundo semestre, projeto de série com 12 episódios. A linguagem terá a mesma carga de experimentação que os dois usam na telona. Não está definido se o produto vai para a televisão ou a internet. Para Ivo, o que importa é os trabalhos serem vistos.

“Acredito muito na capacidade de exibição da internet. Vou fazer uma camiseta pedindo cinema público, gratuito e de qualidade”, defende. Para o cearense, independentemente do valor, é lamentável que o governo invista na produção de cinema no Brasil e muitas obras fiquem restritas a determinados circuitos. Com os colegas da Alumbramento, ele disponibiliza trabalhos na rede para serem assistidos gratuitamente.

Está em cartaz no site da produtora O sol nos meus olhos, de Flora Dias e Juruna Mallon. “Em uma semana, foram mil views”, comemora Ivo. Para ter ideia do quanto isso é significativo, o lançamento de Trabalhar cansa, de Marco Dutra e Juliana Rojas, não ultrapassou 5 mil espectadores, mesmo com investimento em distribuição e divulgação. E olha que este longa estreou no Festival de Cannes. Com o documentário O céu sobre os ombros, do mineiro Sérgio Borges, foi a mesma coisa. “Ele rodou o mundo inteiro e aqui fez 4 mil, 5 mil espectadores”, diz Ivo.

Seja no cinema ou nas alternativas que defende para que as obras sejam vistas, Ivo Lopes Araújo não parece querer muito. “A ideia é entender o mundo de uma forma mais ampla”, conclui.

Filmografia

2013
Quando eu era vivo, de Marco Dutra
Tatuagem, de Hilton Lacerda
O homem das multidões, de Cao Guimarães e Marcelo Gomes
Depois da chuva, de Marília Hughes Guerreiro e Cláudio Marques
O Rio nos pertence!, de Ricardo Pretti
O uivo da gaita, de Bruno Safadi
Apocalipse de verão, curta de Carolina Durão


2012
Eles voltam, de Marcelo Lordello
Odete, curta dele, Clarissa Campolina e Luiz Pretti


2011
Girimunho, de Clarissa Campolina e Helvécio Marins Jr.
O céu sobre os ombros, de Sérgio Borges
Os monstros, de Pedro Diógenes, Guto Parente, Luiz Pretti, Ricardo Pretti


2010
Avenida Brasília Formosa, de Gabriel Mascaro
As corujas, curta de Fred Benevides


2009
A amiga americana, curta com Ricardo Pretti
A falta que me faz, de Marília Rocha

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