O adjetivo “didático” tem conotação pejorativa quando aplicado a filmes de ficção ou documentais. Quem afirma que um filme é didático em geral quer dizer que é esquemático, explicativo demais, quando não maniqueísta e deformador de uma realidade muito mais complexa do que aquela que ele supostamente retrata. Não era esse o pensamento de Roberto Rossellini.
Depois de haver se consagrado como pai do neorrealismo italiano, tornando-se diretor de sucesso internacional, além de ter se casado com Ingrid Bergman, Rossellini, no auge da fama, portanto, voltou sua carreira para a direção de filmes assumidamente didáticos. Obras que se propunham explicar algum tema ou traçar o perfil de alguma personalidade política ou do mundo do pensamento. 'Viva a Itália', que a Versátil agora está lançando, é um deles. Forma com outros dois, já lançados - 'O Absolutismo' e 'O Renascimento' - uma trilogia, 'A História no Cinema', agrupada em caixa pela Versátil.
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Mas, atenção: a didática de Rossellini não se desenvolve como uma aula fria e analítica a respeito de acontecimentos remotos e decisivos para seu país e para a conformação de toda a Europa. Com mão de ficcionista, empresta aos fatos cor e calor, paixão e sangue. Vida. Ainda mais porque o protagonista desses episódios é ninguém menos que a notável pessoa de Giuseppe Garibaldi, conhecido também entre nós por ter lutado na Revolução Farroupilha e se casado com uma brasileira, Anita.
Os fatos descritos por Rossellini mostram um Garibaldi já veterano de revoluções, depois de haver lutado na América, e agora empenhado na missão de unificar um país visto como um todo linguístico e cultural, embora nuançado por dialetos e costumes diferentes em suas várias regiões. Na época em que trava sua luta, a Itália dividia-se em oito Estados, sob domínio estrangeiro. O Vêneto, por exemplo, pertencia à Áustria, enquanto o Reino das Duas Sicílias era dominado pela dinastia Bourbon.
O espírito de unificação desperta em várias frentes e com inspirações diversas. Os personagens do enredo são Vittorio Emanuelle, rei sardo, que domina o Piemonte; seu ministro Cavour e os republicanos Mazzini e Garibaldi, ambos com prenome Giuseppe. Rossellini escolhe um episódio emblemático no processo de unificação - a descida do revolucionário, com um exército popular de mil homens, de Gênova a Palermo, para libertar a Sicília. Ficaram conhecidos como “os mil de Garibaldi” e eram, na verdade, 1070.
É, na opinião de historiadores, um desses episódios decisivos, que mudam o curso da História. Provavelmente, a descida do exército regular piemontês rumo a Palermo teria despertado fortes reações contrárias na Europa. Os mil de Garibaldi não chamaram tanto a atenção, pois se achava que seriam facilmente liquidados pelo exército dos Bourbons, maior e mais bem armado. O Reino das Duas Sicílias compreendia quase metade da península.