História e repercussão das obras da Teia são tema de livro

6ª Cine BH promove cine-concerto, lança livro e exibe filmes em homenagem ao centro de estudos e criação

por Gracie Santos 02/10/2012 09:04

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Túlio Santos/EM/D.A Press
Leonardo Barcelos, Sérgio Borges, Marília Rocha, Clarissa Campolina, Luana Melgaco e Pablo Lobato (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
 
Eles não gostam de ser vistos como coletivo, o que daria a falsa ideia de gente unida em torno de um objetivo/obra comum. Também não querem discutir fronteiras entre documentário e ficção, porque a simples discussão já reduz e delimita espaços. E não pretendem celebrar os 10 anos de existência apenas olhando para o próprio umbigo e se vangloriando dos 50 prêmios conquistados ou das 37 obras realizadas. Querem, sim, comemorar, mas buscando reflexões, provocando questionamentos. Por isso, o livro que os integrantes da Teia lançam no dia 18 para festejar uma década é também uma provocação.

Além dos textos de convidados sobre as obras de cada integrante (Pablo Lobato, Leonardo Barcelos, Clarissa Campolina, Luana Melgaço, Marília Rocha e Sérgio Borges – e de Helvécio Marins Jr., que deixou o grupo), há reflexões (geniais) como “O êxito do fracasso: notas sobre o cinema brasileiro contemporâneo”, de Ilana Feldman; “O mar de Minas”, de José Carlos Avellar, sobre o documentário mineiro; e “O que é um coletivo”, que trata de goteiras e infiltrações do coletivo, de Cezar Migliorin. A edição caprichada – 400 páginas, bilíngue (português/inglês) – é documento importante, que reverbera a força do grupo, que se diferencia em sua proposta de fazer cinema sem se render à produção comercial, como analisa André Brasil, organizador e editor da obra: “O crescimento da Teia coincide com a lenta e parcial recuperação da rede de incentivos públicos regionais e nacionais. Ainda que precariamente, isso permite ao grupo manter-se fazendo cinema, sem ter que se transformar totalmente em estúdio ou produtora, destino de muitos coletivos que passam a dividir o trabalho autoral com a produção comercial (muitas vezes, com prejuízo para o primeiro).”

Só livro bastaria para celebração da data, mas a CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte presta (bela) homenagem à Teia. No dia 18, data de abertura da sexta edição, às 20h30, no Grande Teatro do Sesc Palladium, haverá um cine-concerto, criado a partir de imagens dos filmes realizados pelo grupo, com trilha sonora executada ao vivo pelo O Grivo, que assina a maioria das trilhas das obras da Teia. Ao longo do evento haverá a Mostra Homenagem, com apresentação de cinco longas: O céu sobre os ombros, de Sérgio Borges; Balança mas não cai, de Leonardo Barcelos; Girimunho, de Helvécio Marins Jr. e Clarissa Campolina; A falta que me faz, de Marília Rocha; e Acidente, de Pablo Lobato e Cao Guimarães. E ainda sessões com os curtas mais significativos dos realizadores da produtora, entre muitas outras coisas.
 
Integrantes da Teia celebram 10 anos de trabalho colaborativo com o lançamento de livro, de DVD de O céu sobre os ombros e novo site homenagens da 6ª CineBH 
 
ivo lopes araujo/divulgação
Vencedor do festival de Brasília de 2010, O céu sobre os ombros, de Sérgio Borges ganha lançamento em DVD (foto: ivo lopes araujo/divulgação)
 
Liberdade para criar 
 
Desde o início, Pablo Lobato, Leonardo Barcelos, Clarissa Campolina, Luana Melgaço, Marília Rocha e Sérgio Borges planejaram transformar o livro Teia 2002 – .2012 em espaço de reflexão. “Queremos pensar o cinema de forma mais ousada”, avisam os seis, capitaneados por Pablo Lobato. Decidiram, então, convidar pesquisadores e especialistas que pudessem não apenas discorrer sobre suas obras como também abordassem temas pertinentes ao meio. O resultado é muito interessante. Apesar de certo tom acadêmico, os textos se tornarão atraentes inclusive para não iniciados. Destaque para a edição criteriosa de André Brasil, que faz boa introdução do trabalho. A obra passeia do poético ao provocativo, com embasamento teórico e frescor da atualidade graças às questões postas e discutidas.

Quem conhece as obras de cada um dos autores certamente há de concordar, que eles não têm nada de verborrágicos, pelo contrário. Por isso mesmo, vai se deliciar com análise de Cláudia Mesquita em “Os nossos silêncios: sobre alguns filmes da Teia”. Para ela, “o silêncio traduz a dificuldade de diálogo com o outro e a opção pelo laconismo como resposta aos dilemas da significação”. Momento precioso é o proporcionado pelo crítico José Carlos Avellar, que analisa o cinema mineiro como algo que “caminha com passo miúdo e imagem sussurrada.” É ele quem provoca: “Afinal, o documentário está no que se olha, na descoberta das pessoas e paisagens vistas pelo realizador ou está na descoberta do olhar do realizador por meio dessas paisagens e pessoas?”

Júlia Rebouças fala sobre a cada vez mais próxima relação entre o cinema e as artes visuais, enquanto Ilana Feldman escreve: "É como se o documentário brasileiro tivesse seguido o conselho de Samuel Becket: ‘Fracasse, fracasse de novo, fracasse melhor’”. A Herbert Schwarze coube analisar o trabalho do ex-integrante do grupo em “Habitantes do limiar: os filmes de Helvécio Marins Jr.”, destacando que “o espaço cinematográfico de Marins expressa a condição psicológica do protagonista”.

Em “Paisagem com mar ao fundo”, Carla Maia faz poesia sobre a poética obra de Clarissa Campolina: "Diante do mundo cabe não investigar mistérios, mas guardar segredos". “Ver e mostrar” é texto do professor Eduardo de Jesus sobre a herança da videoarte no trabalho de Leonardo Barcelos. Já Frederico Benevides Parente optou por entrevistar a produtora Luana Melgaço, momento em que destaca: "O modo de produção de uma obra e sua potência estão intrinsecamente ligados”.

João Dumans analisa a obra de Marília Rocha e diz que os filmes dela são “afeitos à descoberta de espaços íntimos, familiares ou isolados, organizados por vezes como pequenos microcosmos, situados, sem dúvida, no curso da história, mas resguardados de suas preocupações mais urgentes, de suas leituras mais genéricas, de suas ambições mais imediatas”. Para Júlio Martins, “a poética de Pablo Lobato encontra na delicadeza e no silêncio traços fundamentais na busca de revelar a potência que se resguarda naquilo que nos é mais comum”. E Cléber Eduardo, ao abordar o trabalho de Sérgio Borges, destaca que, em O céu sobre os ombros, "a câmera pincel se aproxima e se ausenta, sem perder a composição. É um filme frágil, quase vaporoso”.

Porto seguro Ao longo de 10 anos, a relação entre os integrantes da Teia passou por variados momentos. Houve entradas e saídas – a produtora teve entre seus integrantes Helvécio Marins, Cristiano Simões e Bruno Pacheco. Atualmente, os seis produtores e realizadores trabalham de forma colaborativa, combinando produções e pesquisas individuais com trabalhos que envolvem todo o grupo e convidados de fora.

Hoje, eles se sentem muito mais afinados. Dividem o espaço, as contas da empresa, têm ideias afins, mas cada um segue sua trajetória, apesar de muitas vezes se envolverem uns nas criações dos outros. Parece difícil? E é. A própria Marília Rocha admite que eles não são pessoas fáceis. Mas fato é que tudo vem dando muito certo. A explicação? Simplesmente não há. Eles convivem numa espécie de caos organizado. Estão conseguindo criar, pagar contas, cuidar dos filhos e famílias e vivem em harmonia. E quem está de fora pode perceber o carinho que nutrem pelos trabalhos uns dos outros.

Todos concordam que a grande responsável pela organização reinante no lugar é a produtora Luana Melgaço, espécie de porto seguro. Mesmo assim, ela também tem total liberdade para trafegar por outros lugares, produzindo para outros realziadores. Essa liberdade de criar fora da Teia (e ainda arrastar convidados para dividir o espaço) é vista por todos como fundamental para que o “coletivo individual” tenha sucesso. No momento em que celebram as dúvidas, os seis são unânimes em dizer que têm pelo menos uma certeza: escolheram o nome certo para o grupo.
 
DVD e site

Durante a 6ª Mostra CineBH, idealizada e realizada pela Universo Produção, será promovido o Brasil CineMundi, encontro internacional de coprodução com apresentação de estudo de caso do filme Girimunho, coprodução Brasil-Espanha-Alemanha, oportunidade em que estarão presentes os produtores Sara Silveira e Luana Melgaço (Brasil), Luis Miñarro (Espanha), e Paulo de Carvalho (Alemanha) e Gudula Meinzolt (Alemanha), discutindo como se desenhou essa coprodução de sucesso. Haverá ainda mesa de debate para refletir a trajetória da Teia, com a participação de seus realizadores, acompanhada do lançamento do DVD de O céu sobre os ombros; do novo site (www.teia.art.br) da produtora, que disponibilizará todos os curtas para visualização on-line, e tarde de autógrafos do livro Teia – 2002-2012. Acompanhe na web: www.cinebh.com.br; no Twitter: @universoprod; no Facebook: www.facebook.com/UniversoProdução. 
 
TRECHO DE TEIA 2002 –2012

“Quando diversos grupos de cinema e audiovisual passam a se denominar coletivos, quando a Coca- Cola lança uma campanha na internet estimulando os consumidores a fazerem parte do Coletivo Coca-Cola, quando os funcionários do Ministério da Cultura avisam que irão incentivar os coletivos ou quando, em debates públicos, cineastas e artistas dizem que não aguentam mais falar em coletivos, é hora de desacelerarmos um pouco para tentar tracejar minimamente o que seja um coletivo”.
Cezar Migliorin 


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