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Estado de Minas

Livro reúne cartas trocadas por Carlos Drummond de Andrade e Pedro Nava

Descendo a Rua da Bahia (Bazar do Tempo) reúne a correspondência dos dois que se tornaram amigos na BH da década de 1920. Lançamento marca os 30 anos da morte do poeta itabirano


17/08/2017 09:11 - atualizado 17/08/2017 09:19

Carlos Drummond de Andrade morreu em 17 de agosto de 1987, 12 dias depois de perder a filha, Maria Julieta(foto: Acervo CDA/ Fundação Casa de Rui Barbosa)
Carlos Drummond de Andrade morreu em 17 de agosto de 1987, 12 dias depois de perder a filha, Maria Julieta (foto: Acervo CDA/ Fundação Casa de Rui Barbosa)
Neste 17 de agosto, quando se completam 30 anos da morte de Carlos Drummond de Andrade, um evento em BH celebra a vida, a amizade e o amor do poeta pela literatura. Tudo isso está presente no livro Descendo a Rua da Bahia (Bazar do Tempo), que reúne a correspondência de Drummond (1902-1987) com o memorialista e médico Pedro Nava (1903-1984), companheiros no Grupo do Estrela. Esse núcleo modernista era formado por jovens literatos que se reuniam no famoso Café Estrela na BH dos anos 1920.

Com direito a sarau, o lançamento do livro, no Museu Inimá de Paula, vai reunir as organizadoras da publicação, Eliane Vasconcellos e Matildes Demetrio dos Santos, o escritor Humberto Werneck, que prepara biografia de Drummond para 2018, Joaquim Nava e Angelo Oswaldo, secretário de Estado da Cultura.

“O ineditismo e a riqueza da iconografia e das notas são o grande quê do nosso livro. Além de dados sobre os dois, ele traz informações sobre o momento histórico em que eles viveram”, comenta Eliane Vasconcellos.

Humberto Werneck, que assina o posfácio, ressalta o papel da correspondência de intelectuais para a cultura brasileira. “A troca de cartas sempre foi, entre escritores, uma prática muito enriquecedora. Basta ver a correspondência de Mário de Andrade com Carlos Drummond de Andrade e tantos outros surgidos depois da Semana de 22. Para não falar no monumento da cultura brasileira que é a correspondência trocada por Mário e Manuel Bandeira”, observa o jornalista e escritor.

Para ele, as redes sociais não substituíram essa rica relação. “O que tenho visto ali, na maioria dos casos, são intervenções menos pensadas e aprofundadas. Em geral se bate meio de primeira. Há exceções, insisto, mas o panorama me parece ser esse”, observa Werneck.
Professor de teoria da literatura da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Roberto Said estudou a relação entre Pedro Nava e Drummond, “dois jovens incendiários na BH dos anos 1920”. Ele observa que a amizade uniu colegas tanto de leitura quanto de farra.

“As memórias do Pedro contam as aventuras dos dois na parte nobre da cidade, nos cafés, nos meios intelectuais, mas também nas partes baixas, na zona boêmia, nos cabarés, nas casas de prostituição. Foram jovens bastante rebeldes, irônicos. Colocavam fogo nos bondes, subiam no arco do viaduto (Santa Tereza), iam a comícios políticos vaiar os líderes do Partido Republicano”, lembra o professor. “Eram jovens da pá virada, botavam a cidade de pernas pro ar.”

Quando Nava se matou, em maio de 1984, Drummond dedicou-lhe o belo poema A um ausente: “(...) Tenho razão para sentir saudade de ti,/ de nossa convivência em falas camaradas,/ simples apertar de mãos, nem isso, voz/ modulando sílabas conhecidas e banais/ que eram sempre certeza e segurança./// Sim, tenho saudades./ Sim, acuso-te porque fizeste/ o não previsto nas leis da amizade e da natureza/ nem nos deixaste sequer o direito de indagar/ porque o fizeste, porque te foste.”

Três anos após a morte do amigo, o coração do poeta parou de bater. Motivo: desgosto. Um infarto do miocárdio levou Drummond 12 dias depois de ele perder a filha única, Maria Julieta, vítima de câncer. Deixou como herança para os brasileiros 34 livros de poesia, 19 de prosa e quatro infantis.
INFLUÊNCIA Para Humberto Werneck, o legado do poeta itabirano é imensurável. “Com o perdão da obviedade, o seu lugar na literatura brasileira é altíssimo. Passo ao largo da preocupação meio ociosa dos pódios literários, da disputa para emplacar o campeão e o vice. Apenas constato que muito do que Drummond criou segue sendo influência poderosa para quem escreve e farol para qualquer pessoa inteligente e sensível. Não socorre apenas os poetas em formação. Para muita gente, e estou nesse vasto time, a poesia de Drummond é luz e consolo para além da literatura”, afirma.

Werneck saúda autores contemporâneos que, como Drummond, dedicam-se à poesia. “Não me parece haver contrastes notáveis, no sentido de rupturas, como aquela que o Modernismo significou. Vejo frescor no que produzem Ana Martins Marques e Carlito Azevedo, para mencionar dois grandes, e os vejo também inseridos na tradição da melhor poesia brasileira. Abençoados estes tempos em que é tão fácil publicar. Jovens autores já não têm como único caminho a longa e penosa espera nas editoras. Hoje, basta postar. Para o bem e para o mal... O que conta é o que se produz, não é mesmo? Uma coisa não mudou: os verdadeiramente bons, por exemplo, Ana Martins Marques, são minoria ínfima. Como no poema de Drummond: ‘Passam gênios talvez entre as acácias’”, diz o jornalista.


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